abril 17, 2015

Ditadura da "afetividade"??? Parece que estamos cheagndo lá.....



Caros leitores, mais uma vez o STJ enfrenta caso de profunda complexidade. A notícia foi amplamente divulgada pela mídia especializada nos últimos dias. Trata-se de adoção de maior pelo padrasto, tendo o pai biológico sido frontalmente contrário, ao longo do processo, pela desvinculação do seu nome no registro do filho.

Segundo o relatório da decisão, o pai passou o período de 12 anos afastado do garoto, enquanto este era menor de idade, por falta de condições econômicas.

No STJ, foi adotada a socioafetividade de maneira completamente excludente para a filiação biológica. Para muitos especialistas, essa é uma decisão "paradigmática", posto que revela o completo avanço da filiação afetiva sobre a sanguínea.  A despeito das respeitáveis opiniões em contrário, não pensamos que a situação seja tão simples assim.

Existe uma tendência no Direito de Família brasileiro de superar, em definitivo, a filiação biológica pela afetiva, sempre que esta última se manifestar de forma clara, como no presente caso.

Essa linha de raciocínio não vem sendo suficientemente discutida pela doutrina pátria, infelizmente. E, muitas das vezes, uma decisão desse tipo influencia muitos operadores Brasil afora, que não tem conhecimento mais aprofundado na matéria. Uma pena.

O fato é que a filiação biológica não pode ser sumariamente extirpada do sistema, em casos semelhantes a este, sem que uma grande sensação de injustiça recaia sobre o pai biológico. Ainda mais se for verdade que, embora tivesse interesse na preservação do vínculo afetivo com seu filho, não tinha condições financeiras para as visitas.

Em casos tais, por vezes, é a própria genitora que dificulta o contato entre pai e filho, e impõe que o seu novo namorado/marido/companheiro "funcione" como PAI na vida do menor. Não digo que isso aconteceu no caso em debate, pois somente a instrução processual poderia ter solucionado a questão. Mas o fato é bem frequente em situações idênticas, sobretudo nos corredores das Varas de Família.

Ainda, é preciso que o Brasil retome, definitivamente, a discussão sobre a profundidade e viabilidade jurídica do que passou a ser chamado de "princípio da Afetividade", sob pena de chegarmos, como já denunciei outras vezes, na era da "ditadura da afetividade". A vulgaridade doutrinária que se abate sobre o tema é tão grande, que nos acostumamos a ouvir a "ladainha" de que a decisão foi baseada no princípio "tal", e não se discute mais a questão. No caso da afetividade, ainda mais sintomático, não existe consenso sobre a existência desse princípio, muito menos sobre sua utilização definitiva como fundamentação decisória.

Segue abaixo a publicação da notícia pelo IBDFAM.

Boa leitura a todos.

Dimitre Soares


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 STJ autoriza adoção de adulto por padrasto sem o consentimento do pai biológico

Uma vez estabelecido o vínculo afetivo, a adoção de pessoa maior não pode ser recusada sem justa causa pelo pai biológico, em especial quando existe manifestação livre de vontade de quem pretende adotar e de quem pode ser adotado. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a adoção de jovem maior de idade pelo padrasto, mesmo sem o consentimento do pai biológico.

No caso, um homem ajuizou ação de adoção de maior de idade combinada com destituição do vínculo paterno. Ele convive com a mãe do jovem desde 1993 e o cria desde os dois anos. O juiz de primeiro grau permitiu a adoção.

A apelação do pai biológico foi negada em segunda instância, o que motivou o recurso ao STJ. Ele alegou violação do artigo 1.621 do Código Civil e do artigo 45 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), pois seria indispensável para a adoção o consentimento de ambos os pais biológicos, mesmo quando um deles exerce sozinho o poder familiar.

De acordo com o processo, o próprio pai biológico reconheceu que não tinha condições financeiras nem psicológicas para exercer seu direito de visitas, e que preferiu permanecer afastado. O último contato pessoal ocorreu quando o filho tinha cerca de sete anos. Quando a ação de adoção foi proposta, ele estava com 19 anos.

O ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso, afirmou que o ECA deve ser interpretado sob o prisma do melhor interesse do adotando. “A despeito de o pai não ser um desconhecido completo, a realidade dos autos explicita que este nunca desempenhou a função paternal, estando afastado do filho por mais de 12 anos, tempo suficiente para estremecer qualquer relação permitindo o estreitamento de laços com o pai socioafetivo”, observou.

Para a advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão Nacional de Adoção do IBDFAM, a decisão é um avanço no reconhecimento de que a socioafetividade suplanta os laços de sangue.

“Estamos, neste exato momento, travando uma enorme luta contra o Estatuto da Família, que restringe família aos pais e descendentes, valorizando laços sanguíneos despidos de afeto. Esta decisão é mais uma resposta ao preconceito e ao reconhecimento de que o cuidado e o amor criam verdadeiros laços de parentalidade e filiação”, disse.

O advogado Rolf Madaleno, diretor nacional do IBDFAM, ressalta que a adoção de pessoa maior e capaz não depende da anuência dos pais consanguíneos, pois é um direito disponível. “No caso vertente, a ausência do pai reforçou a segurança e a certeza da decisão que deu vazão à autodeterminação da pessoa maior e capaz”.

Para ele, a decisão confirma que os laços biológicos nunca foram prioridade. “Quando no Brasil ainda não se falava em sociaofetividade, já era viável adotar pessoa maior e capaz, rompendo os vínculos biológicos, pois o estado de filiação e de ascendência parental é um fato, um sentimento, uma interação, e não um fato biológico”, destaca.

Um comentário:

  1. Excelente texto, Dr. Dimitre. Parabéns, pela lucidez do enfrentamento da matéria. Concordo com o seu pensamento. Entendo, que 'O afeto é fundamental' - Dalai Lama. Os dias atuais apontam para uma necessidade maior de afeto e menos violência. É preciso repensar de novo o amor, resgatar a afetividade, mas, desprezar o biológico é um tanto demais para mim, é mesmo ditar a afetividade, como vc bem o colocou. Um abraço. Eliana Albuquerque

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