junho 16, 2014
Direito de Família e Direitos Reais - Direito Real de Habitação em União Estável é reconhecido pelo STJ em Ação de Manuntenção de Posse
Nesta
terça-feira, 10, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
decidiu que uma mulher tem direito real de habitação em ação de
manutenção de posse, ajuizada antes mesmo do pedido expresso de
reconhecimento de união estável.
Para o jurista Paulo Luiz Netto Lôbo
(PE), diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família
(IBDFAM), a decisão é mais uma contribuição jurisprudencial ao
reconhecimento do direito real de habitação na união estável, porque o
Código Civil apenas o confere ao cônjuge. “A doutrina tem sustentado que
o art. 7º da lei nº 9.278, de 1996, que o contempla para o companheiro,
não foi revogado pelo código civil, além de que há de observar o
princípio da igualdade jurídica entre as entidades familiares”, afirma.
Após a morte do companheiro, a mulher
moveu ação com fundamento no direito real de habitação, pois havia
recebido notificação para desocupar o imóvel onde morava com o falecido.
O juízo de primeiro grau acolheu o pedido de manutenção de posse.
De acordo com o magistrado, a mulher
comprovou que ela e o companheiro mantiveram relação duradoura, contínua
e com objetivos voltados para a constituição de família, satisfazendo
os requisitos previstos no artigo 1.723 do Código Civil (CC). O Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul manteve a sentença, pois, em seu
entendimento, a posse da companheira é legítima.
O espólio recorreu ao STJ e sustentou
que não houve comprovação da união estável em ação própria e que nem
mesmo foi feito pedido de reconhecimento dessa união. Com isso, não
haveria direito real de habitação ou posse legítima sobre o imóvel.
Ainda afirmou que sempre houve impedimento para que o falecido se
casasse com a autora, por causa de casamento anterior que não foi
dissolvido formalmente.
Além disso, o inventariante do espólio
mencionou que o reconhecimento do direito real de habitação à
companheira compromete a legitimidade dos herdeiros e cria vantagem para
a mesma em relação à esposa, caso exista mais de um imóvel residencial a
inventariar.
O ministro Luis Felipe Salomão,
relator do recurso especial, explicou que, nos termos do artigo 1.784 do
CC, com a abertura da sucessão hereditária, há transmissão automática e
imediata de todas as relações patrimoniais aos herdeiros, inclusive a
posse e a propriedade do patrimônio pertencente ao falecido. Com base no
entendimento do STJ, ele disse que a companheira sobrevivente tem o
direito real de habitação sobre o imóvel de propriedade do falecido, em
que residia o casal, mesmo na vigência do atual Código Civil.
Direito à moradia
Segundo Luis Felipe Salomão, o
entendimento do STJ assegura a máxima efetividade do direito à moradia
do cônjuge ou companheiro sobrevivente e de alguma forma, acaba por
abrandar os poderes dos sucessores sob a propriedade do patrimônio
herdado.
O relator mencionou precedente da
Quarta Turma, segundo o qual a constituição do direito real de habitação
do cônjuge sobrevivente emana exclusivamente da lei, ou seja, o
reconhecimento deste direito de forma alguma repercute na definição de
propriedade dos bens partilhados. O reconhecimento não precisa
necessariamente ocorrer por ocasião da partilha dos bens deixados pelo
falecido.
Salomão ressaltou que a sentença
apenas declarou a união estável com o objetivo de conceder o direito de
habitação a ex-companheira do falecido, que ainda não declarou o
reconhecimento da união estável. No entanto, o relator afirmou que ficam
abertas as discussões relacionadas ao reconhecimento da união estável e
seus efeitos decorrentes.
O ministro considerou que a posse da
ex-companheira deve ser mantida, pois, o direito real de habitação é
conferido exatamente para aquela pessoa que residia no imóvel e
realmente exercia poder de fato sobre a coisa, isto é, a proteção
possessória da companheira foi concedida com base no fato jurídico
posse.
De acordo com o diretor nacional do
IBDFAM, se sustenta que a união estável é um ato-fato jurídico, que
independe, para sua constituição, de ato jurídico, como no casamento. “A
sentença judicial não é constitutiva, mas apenas declarativa da união
estável, com isso a decisão do juiz reconhece que havia elementos
suficientes da existência da união estável e que era possível deferir o
pedido de manutenção de posse, sem necessidade de prévia decisão
judicial sobre a existência daquela”, diz o advogado.
Paulo Lôbo ainda declara que o STJ
fundamentou corretamente sua orientação no direito à moradia e na posse
como poder de fato. “O direito real de habitação da companheira
sobrevivente restringe mas não suprime o direito dos herdeiros”,
analisa.
Saiba mais
A ação de manutenção de posse pode ser
caracterizada como a ação judicial que compete ao individuo possuidor
de qualquer coisa, seja móvel ou imóvel, corpórea ou incorpórea, contra
quem venha perturbar e contestar a sua posse. A ação também é conhecida
pelos nomes de força turbativa, ação de força nova, de preceito
cominativo ou interdito de manutenção. Para fundamentar a ação, o autor
que possui a posse de alguma coisa deve provar a perturbação praticada
contra a dita posse, assinalando a data em que ela se evidenciou, para
que seja criada a expedição liminar do mandado de manutenção. Como essa
perturbação não impede totalmente o exercício da posse, o individuo
entrará com essa ação com o exclusivo objetivo de se manter na posse.
Lei de habitação
O direito real de habitação se
encontra estabelecido no art. 1.831 do Código Civil de 2002 e, como
primeira distinção que se deve fazer em relação à fixação que havia no
Código Civil de 1.916, é o direito de todo e qualquer cônjuge, casado
sob qualquer regime de bens. Antigamente, só o cônjuge casado pelo
regime da comunhão universal de bens é que detinha o direito. Com isto,
mesmo aqueles que casarem e optarem pelo regime da separação de bens ou
separação obrigatória de bens, assim como aqueles que casarem pelo
regime da participação final nos bens adquiridos na vigência do
casamento tem direito real de habitação.
No entanto, é preciso salientar que o
art. 1.829, inciso I, da Lei 10.406/02, exclui o cônjuge sobrevivente,
casado pelo regime da comunhão universal de bens e também aquele casado
pelo regime da separação obrigatória de bens, da concorrência com os
descendentes, com relação a titularidade dos bens deixados pelo
falecimento do autor da herança. Porém, não os exclui do direito real de
habitação. Com isso, o novo ordenamento jurídico civil do Brasil
determina que o cônjuge sobrevivente sempre estará envolvido na
sucessão, no mínimo, com o direito real estabelecido no art. 1.831 do
Código Civil.
AUTHOR:
Dimitre Soares
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