Família por design
Por: Jones Figueiredo Alves
O
fato nascimento, como primeiro evento da vida civil, quer dizer, antes
de mais, que uma nova vida surge e o neonato é a criança recebida com
nome, afeto e inserção na família e nada mais será importante senão
aquele que chega exteriorizando, afinal, a própria família que nele se
acrescenta.
Importará
menos que os pais estejam ainda juntos ou já separados, que tenha sido
ele nascido de uma relação afetiva ou meramente eventual, ou, talvez, de
técnicas de reprodução assistida, onde o pai, sem qualquer identidade,
tivera a única feição de um tubo de ensaio, como doador anônimo do
líquido seminal para a concepção “in vitro”. Pouco importa, hoje, o
berço das origens, vedando a Constituição Federal quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação (art. 227 § 6º).
Mas,
importa, sim, afinal, que o neonato receba toda a afeição necessária à
sua melhor formação de personalidade e que seja ele amado por ambos os
pais, mesmo que os pais não mais se amem entre si (porque já separados)
ou que nunca se tenham amado. Importa, portanto, que amem o filho como
membro de uma família que existirá, sempre, através dele.
É
nesse ponto que o projeto parental do filho desejado, ganha relevo, não
apenas na esfera da afetividade, mas no da co-parentalidade, quando
ambos os pais idealizam o filho, como sujeito jurídico do estado de
filiação que os unifica como pais, independente das relações subjacentes
que os aproximam ou não enquanto parceiros.
No
caso, a questão agora assume proporções inusitadas, quando redes
sociais e sites americanos na Internet estão aproximando pessoas apenas
para a procriação pretendida, pessoas desconhecidas e não propriamente
interessadas em um relacionamento amoroso entre si e que as coloquem,
noutro passo, como pais.
Aqueles
que em determinada faixa etária não tiveram ainda filhos, por razões
várias (exemplo: a da maior prioridade dada à profissão) e que não
desistiram do projeto parental, estão agora na corrida cibernética da
procura do pai ou da mãe do filho, unicamente pelo filho, servindo a Web
de bússola de encontro, nos fins da procriação, sem casamento, sem
união estável ou qualquer outro tipo de envolvimento.
Uma
nova entidade familiar aparece, a da co-parentalidade, formada por um
filho e os có-pais, que identificados, formam a família apenas destinada
ao filho internético, plasmado da rede social e que não conhecerá uma
família convencional, senão apenas um pai e uma mãe, como pais
concebidos por seus interesses individuais próprios, os de terem um
filho com a assistência genética do outro genitor, nada mais havendo
entre eles. É a família por parceria dos pais, tipicamente formada
somente para a co-parentalidade.
O
principal site é o “Family by Design” - www.familybydesign.com -
fundado por Darren Speedale, que promove arranjos familiares com
intentos procriativos, aproximando pessoas para atender os seus
objetivos parentais. A diferença é que não se tratarão de doadores
anônimos, para uma reprodução assistida, mediante inseminações
artificiais ou concepções de laboratório. Bem é certo que poderão
preferir essas técnicas, sem necessariamente o uso do método natural.
Todavia, serão sempre pessoas identificadas, parceiros escolhidos,
inclusive por determinados perfis.
A
gestação programada virtualmente, mediante decisão conjunta de terem um
filho juntos, envolve os pares na Internet, mesmo que desconhecidos, a
partir de questionários respondidos, onde são elencados dados pessoais a
partir de preferencias, gostos, e demais informações, que poderão ser
de interesse comum.
A
funcionalidade da pesquisa, para o fim de escolha do casal, situa-se,
com mais precisão, nas definições acerca da guarda e educação do filho
projetado, quando um e outro já evidenciam como gostariam de cuidar do
filho, como dividir as tarefas inerentes ao exercício do poder familiar
de cada um, e como poderão trabalhar uma cooperação deles pais, entre
si, para proteger os interesses maiores do filho.
Essas
tratativas prévias servem de contratualidade preliminar, valendo
admitir que contratos dessa espécie regularão, sempre, os arranjos
familiares para uma parceria de projeto parental. Bem é dizer, v.g., que
o modelo de guarda será sempre o da guarda compartilhada do filho, nada
justificando uma guarda unilateral, salvo em situações que digam
respeito ao melhor interesse da criança. Pois bem. Convém admitir
circunstâncias fáticas, de há muito observadas, indicando que:
(i) pais solteiros, ou pais separados, não comprometem, em princípio, uma regular e saudável formação da criança;
(ii)
quando em situações outras, um filho pode ser mais um neto, como sucede
na gestação substituta, ou “gestação por outrem” de avó que engravida
em lugar da mãe genética, sua filha; as técnicas de RMA não colocam dita
gravidez como situação-problema;
(iii)
nomeadamente, diante da doação anônima de gametas; tem-se o filho
gerado sem pai ou mãe determinados, deles privado de convivência
parental;
(iv) ou finalmente, diante de inseminações artificiais “post mortem”, tem-se, por igual, a mesma privação do filho quanto à figura do pai, porque já concebido órfão.
Com
efeito, claro se percebe que filhos de encomenda por pais de encomenda,
malgrado algumas criticas bioéticas, constitui uma nova realidade que
não pode ser desconsiderada pelo direito de família. Os fatos da vida
conferem realidades diferentes, no sentido da comunidade familiar, em
seus mais diversos segmentos.
Agora
uma nova família, “família por design”, se improvisa na rede mundial de
computadores. Parceiros “on line” colocam-se, segundo seus perfis, como
potenciais pais para, conforme um projeto parental de ambos,
satisfazerem ao outro e a si mesmos com o filho desejado. Que este filho
não se desconecte na vida. O amor que faltará por certo, entre os pais,
seja multiplicado por eles, em muitos megabites, em prestígio e
proteção ao filho trazido pela internet.
JONES FIGUEIRÊDO ALVES
– O autor do artigo é desembargador decano do Tribunal de Justiça de
Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de
Família (IBDFAM), coordena a Comissão de Magistratura de Família. Autor
de obras jurídicas de direito civil e processo civil. Integra a Academia Pernambucana de Letras Jurídicas (APLJ).
ALVES Jones Figueirêdo .
Família por design. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/881. Acesso em10/05/2013
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