setembro 29, 2010

O principio da cooperação e a aplicação do art. 267, § 3º, do CPC, em face da nova perspectiva da garantia do contraditório

Caros amigos, segue artigo publicado no portal Âmbito Jurídico.
Boa leitura a todos.
link para o texto: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8257

Tercio de Sousa Mota, Dimitre Soares Braga de Carvalho, Emanuela Severo da Silva,

Resumo: As questões de ordem pública, no âmbito do Processo Civil, podem ser diretamente relacionadas aos requisitos necessários à existência e formação válida do processo (pressupostos processuais), bem como às condições necessárias ao exercício do direito de ação (condições da ação), abragendo ainda algumas matérias relacionadas ao próprio direito material (prescrição e decadência). Constituem-se em temas nos quais o interesse público, pelo menos numa primeira analise, suplanta o interesse individual das partes em litígio, de modo que ao magistrado é atribuído o poder-dever de conhecê-lo independentemente de qualquer manifestação das partes. Dessa forma, a pretensão desse estudo científico é demonstrar os benefícios trazidos por essa inovação processual no procedimento civil, ponderando suas críticas e sopesando suas vantagens, explanando suas fundamentações, ratificando e defendendo a implantação imediata do Princípio da Cooperação como forma de celeridade e eficácia à prestação jurisdicional no Processo Civil. O Princípio da Cooperação ou da Colaboração, geralmente utilizado na ocasião de entendimentos jurisprudenciais, entretanto, distante de realidade processual entre partes e juiz, sempre foi objeto de discussões doutrinárias, nessa modalidade de princípio colaborador, devem as partes e o juiz processante, estarem interligadas. Presentemente, nesse cenário de aversão social ao processo, urge a necessidade de reconstruir os dogmas processuais desde sua base axiológica, passando pelo nascimento de seus conceitos, com a finalidade de adaptar o processo à realidade dos novos tempos. Ou seja, devemos reformular as considerações que agem em todo o sistema processual, sejam normas estritas, sejam princípios, sejam meras nomenclaturas. Assim sendo, fica revelada a magnitude de um princípio no sistema jurídico, demonstrando sua importância e função, de maneira que, sem subterfúgios, pode-se estabelecer que, ao se ferir uma norma, diretamente estar-se-á ferindo um princípio daquele sistema, que na sua essência estava embutido. Adentrando na tarefa de identificar e arrolar princípios, com o escopo de estabelecer um universo numerus clausus deles, os operadores se deparam como uma difícil solução, senão impossível, razão pela qual, apresenta-se mais relevante e produtivo trabalhar na formulação de uma metodologia que sirva para avaliar se uma determinada norma, de interesse do operador jurídico, é ou não um princípio processual.

Palavras-Chaves: Princípio da Cooperação; Questões de Ordem Pública; Garantia do Contraditório.

Sumário: 1. Introdução. 2. Discussão. 2.1. Novo conceito de processo: a crise do conceito de relação jurídica processual. 2.2. Protocolo de cooperação e assistência jurisdicional: o principio da cooperação. 2.3. Cooperação e assistência jurisdicional. 2.4. Igualdade no tratamento processual. 2.5. A participação através do processo. O dever do estado de viabilizar a participação mediante o processo judicial 2.6 ordem pública e o art. 267, § 3º do CPC. Credibilidade da justiça 2.7 em defesa da adequação do principio da cooperação, sua aplicação no art. 267, parágrafo 3º, do CPC, em face da nova perspectiva da garantia do contraditório e ampla defesa. 3. Considerações finais. Referências.

1 INTRODUÇÃO

As questões de ordem pública, no âmbito do Processo Civil, podem ser diretamente relacionadas aos requisitos necessários à existência e formação válida do processo (pressupostos processuais), bem como às condições necessárias ao exercício do direito de ação (condições da ação), abrangendo ainda algumas matérias relacionadas ao próprio direito material (prescrição e decadência).

Constituem-se em temas nos quais o interesse público, pelo menos numa primeira analise, suplanta o interesse individual das partes em litígio, de modo que ao magistrado é atribuído o poder-dever de conhecê-lo independentemente de qualquer manifestação das partes.

Dessa forma, a pretensão desse estudo científico é demonstrar os benefícios trazidos por essa inovação processual no procedimento civil, ponderando suas críticas e sopesando suas vantagens, explanando suas fundamentações, ratificando e defendendo a implantação imediata do Princípio da Cooperação como forma de celeridade e eficácia à prestação jurisdicional no Processo Civil.

A desígnio do tema da presente pesquisa tem como motivação o interesse quanto à mister controvérsia levantada em torno da aplicação do Principio da Colaboração no sistema Judicial brasileiro, tomando como base as chamadas questões de Ordem Pública.

É necessário, preliminarmente, antes de discorrer sobre o endereço prático da incidência do princípio da colaboração no processo civil brasileiro, chamar a atenção com relação à importância dos princípios como fontes de interpretação do direito.

Os dois primeiros elementos do principio da cooperação (esclarecimento e prevenção) consistem, em síntese, na necessidade de o magistrado esclarecer-se perante os litigantes quanto às possíveis dúvidas que ele possua a respeito das alegações e/ou dos pedidos formulados, bem como, sobre o segundo aspecto, na necessidade de o magistrado alertar as partes sobre as situações em que o êxito da ação a favor de qualquer das partes possa ser frustrado pelo uso inadequado do processo.

Ocorre que um dos objetivos do processo é justamente a pacificação da lide, por meio da apresentação de uma solução justa do conflito submetido ao Poder Judiciário, de modo que esta não é obtida por meio de uma extinção anômala do processo, por meio de uma sentença que não efetue a apreciação do mérito da causa. Trata-se da observância do Princípio da Cooperação, em seu dever de consultar, como forma de legitimar o exercício da função jurisdicional e proporcionar a democratização do debate no curso do processo.

Ademais, a interação entre as partes e o magistrado, por meio do necessário diálogo sobre todos os atos e fatos componentes do processo, acaba por ampliar o quadro de analise, reduzindo demasiadamente o risco de opiniões preconcebidas e, por conseguinte, beneficiando a construção de um juízo mais aberto e ponderado. Logo, em decorrência da idéia central de efetividade, como caminho e objetivo da processualística moderna, surge a necessidade de uma nova análise da garantia do contraditório, a qual deve ser ampliada para albergar o direito das partes de participar de forma concreta na formação do provimento jurisdicional.

Primeiramente será trazido ao trabalho um conceito geral do Princípio da Cooperação no Processo Civil, indispensável ao início da abordagem temática. Serão apresentadas e discutidas as garantias constitucionais das partes no processo, como também elencadas e comentadas as formalidades legais do artigo 267, § 3º, do Código Processual Civil.

É justamente no mérito acadêmico de examinar a abrangência dessa interpretação que vamos dirigir o trabalho, na expectativa de trazer novas interpretações e contribuir para que o estudo desse novo princípio possa trazer ao Direito amparo as partes do processo.

Nesta perspectiva, é importante destacar a relevância do tema, uma vez que o embate nas referidas Questões de Ordem Pública são, atualmente, no Processo Civil Brasileiro decretadas de Oficio pelo o magistrado. Assim, o tema proposto tem acentuada relevância, pois há necessidade de uma avaliação ética sobre o papel das partes e do Juiz no processo e, em tal perspectiva, vem a tona a importância do denominado princípio da colaboração.

2. DISCUSSÃO

2.1 NOVO CONCEITO DE PROCESSO: A CRISE DO CONCEITO DE RELAÇÃO JURÍDICA PROCESSUAL.

Para entendermos o que é relação jurídica processual, é de suma importância que destaquemos a teoria de Bullow, que desenvolve uma relação processual, que não escapou do conceitualismo neutro. Essa relação jurídica processual é demonstrada quando o litigante tem uma pretensão e busca o poder Juiz em daquele que resiste a esta pretensão, ignorando as necessidades das partes, e de quem exerce o poder do Estado, como também as situações de direito material, observando os casos concretos.

Nas ilustres palavras de Marinoni[1], o conceito de relação jurídica processual é contrário ao de legitimidade, sendo legitimidade peça fundamental de participação no procedimento, ou legitimidade da decisão. A neutralidade discutida na relação processual, segundo o autor, imuniza o processo em relação à legitimidade do exercício do poder. O processo é mister não somente por conter, em uma relação, o juiz e as partes. Aliás, no que interessa a um processo a pura existência da relação jurídica não quer dizer a efetiva resolução do processo.

A legitimidade consiste na decorrente participação e efetividade das partes na formação da decisão, tendo como base não somente proclamar o direito de participação, sem outorgar às partes as condições necessárias, tendo em vista que essa aplicação implica em negar a própria legitimidade que se pretende transmitir com a idéia do modelo de participação. Diante disso, o processo requer a legitimidade do exercício da jurisdição e a efetiva participação das partes, exigindo-se que com os partícipes da relação processual civil, seja compreendida a necessária participação para legitimar a tarefa jurisdicional.

Não obstante a este entendimento, a percepção da autonomia do direito processual civil é regulamento por seus fundamentos em si mesmo, a definição de processo que não considera o procedimento reduz um essencial objeto a ser elucidado. O processo e o procedimento são aplicados e construídos no caso concreto e, demonstra do direito processual o evidente compromisso com os fins da jurisdição e com os direitos dos cidadãos.

Então, conforme depreendido a jurisdição no Estado Constitucional, caracteriza-se nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni:

“Como é evidente, a idéia de proteção dos direitos não tem a ver com a antiga e remota concepção de tutela dos direitos privados, própria à época anterior à afirmação da autonomia do direito processual. O Estado constitucional tem o dever de proteger os direitos fundamentais, seja através de normas, atividades fáticas administrativas ou da jurisdição. Além disso, a jurisdição, no Estado contemporâneo, tem o dever de proteger todas as espécies de direitos, com isso se querendo evidenciar que o juiz, muito mais do que simplesmente aplicar a lei, tem o dever de compreendê-la a partir dos direitos fundamentais, no caso concreto”.[2]

No mesmo liame, ainda ressalta o autor supracitado:

“O processo, além de outorgar à jurisdição a possibilidade de proteger os direitos, deve ser legitimo, espelhando os valores que fazem do Estado uma democracia ou que conferem ao exercício do poder natureza democrática. Portanto, o processo deixou de ser um instrumento voltado à atuação da lei para passar a ser um instrumento preocupado com a proteção dos direitos, na medida em que o juiz, no Estado constitucional, além de atribuir significado ao caso concreto, compreende a lei na dimensão dos direitos fundamentais”.

Também, conforme colhido em texto produzido pelo o ilustre Marinoni, quando se diz que o processo não se presta à atuação da lei, é estabelecendo a transformação que incide, ou deve incidir de forma que o processo tenha concepções de instrumento eficaz da jurisdição. Diante disso, o princípio da supremacia da lei, tornou-se necessário resgatar o “conteúdo” da lei, a fim de que se permita encontrar os instrumentos capazes de permitir a conformidade do processo e a sua exata legitimação.

Nesse diapasão, ocorre que com as seguidas reformas no Código de Processo Civil, multiplicaram-se os casos de sincretismo processual[3], onde uma sentença de mérito não somente define o processo, ou seja, não mais significa a extinção do processo. Por esta razão, se fez necessária a alteração do Art. 162, § 1º do Código de Processo Civil, passando a dispor da seguinte forma:

“Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.

§ 1o Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei.”

Então, diante de todo o exposto, certamente o novo conceito de processo se demonstra mais coerente com as recentes mudanças do sistema processual brasileiro. Alinha-se que, agora, a sentença é caracterizada pelo o pronunciamento do juiz e não mais por sua aptidão de pôr fim ao processo.

Destarte, no sistema jurisdicional, o exercício do poder – juiz deve prestar aos litigantes, isto é, aos que são interessados e atingidos pela coisa julgada material e por todas as decisões proferidas pelo o magistrado. Embora, essa base esteja interligada no princípio da participação, entende-se que este é o mecanismo eficaz para expressar o direito de participação no processo, é a qualidade da garantia do contraditório. Este contraditório exerce função prioritária e garante a participação das partes, ainda que por meio de alegações, provas, entre outras.

Assim, constata-se que a legitimação da jurisdição por meio do princípio do contraditório é mais complexa, não bastando ao juiz simplesmente, em face da lei, decidir sem garantir as partes o direito de intervir no processo, assim sendo, o processo requer um procedimento à participação, não dispensando a publicidade de seus atos e explicitando seus argumentos através da fundamentação na legislação, esse fator é fundamental para a participação e legitimação do processo.

Ainda sobre o novo conceito de processo, e sua atuação na efetividade processual, destaquemos o que enuncia Wambier[4]:

“Argumenta que mesmo nos casos do Art. 269 do CPC, onde foi mantida a expressão “extinção do processo”, poderá haver prosseguimento do processo a fim de que se execute, na fase de cumprimento, as verbas de sucumbência.”

O nobre mestre Carreira Alvim ainda traça o seguinte comentário:

“O sincretismo processual traduz uma tendência do direito processual, de combinar fórmulas e procedimentos, de modo a possibilitar a obtenção de mais de uma tutela jurisdicional, simpliciter et de plano (de forma simples e de imediato), no bojo de um mesmo processo, com o que, além de evitar a proliferação de processos, simplifica (e humaniza) a prestação jurisdicional.”

Por fim, observa-se o objetivo social aspirado pelo o legislador tem fundamento na ascensão extemporânea da tutela jurisdicional. Provocou-se assim uma necessidade premente de redução no lapso temporal de trâmite do processo, coadunada ao objetivo de atingir resultados mais justos na aplicação do direito.

Estando o processo nesta definição abrangente em que se encontra, implica-se dizer que o mesmo tornou-se uma busca por direitos efetivos e não apenas aparentes, tanto é assim, que as garantias constitucionais formais têm-se acrescentado no campo dos direitos humanos fundamentais, para assim garantir a aplicação de um direito simples e justo, observando as obrigatoriedades do processo.

2.2 PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO E ASSISTÊNCIA JURISDICIONAL: O PRINCIPIO DA COOPERAÇÃO

A desígnio do tema da presente pesquisa tem como motivação o interesse quanto à mister controvérsia levantada em torno da aplicação do Principio da Colaboração no sistema Judicial brasileiro, tomando como base as chamadas questões de Ordem Pública.

É necessário, preliminarmente, antes de discorrer sobre o endereço prático da incidência do princípio da colaboração no processo civil brasileiro, chamar a atenção com relação à importância dos princípios como fontes de interpretação do direito.

Cabe destacar, nesta sede, o pensamento de Karl Larenz[5] ao asseverar a importância dos princípios jurídicos para a formação do sistema. Segundo o citado autor, os princípios são manifestações especiais da idéia de direito na perspectiva de sua evolução histórica, chamando os mesmos de "idéias jurídicas materiais" ou "pautas diretivas de normação, jurídica que, em virtude da sua própria força de convicção, podem justificar resoluções jurídicas”.

Os dois primeiros elementos do principio da cooperação (esclarecimento e prevenção) consistem, em síntese, na necessidade de o magistrado esclarecer-se perante os litigantes quanto às possíveis dúvidas que ele possua a respeito das alegações e/ou dos pedidos formulados, bem como, sobre o segundo aspecto, na necessidade de o magistrado alertar as partes sobre as situações em que o êxito da ação a favor de qualquer das partes possa ser frustrado pelo uso inadequado do processo.

Ocorre que um dos objetivos do processo é justamente a pacificação da lide, por meio da apresentação de uma solução justa do conflito submetido ao Poder Judiciário, de modo que esta não é obtida por meio de uma extinção anômala do processo, por meio de uma sentença que não efetue a apreciação do mérito da causa. Trata-se da observância do Princípio da Cooperação, em seu dever de consultar, como forma de legitimar o exercício da função jurisdicional e proporcionar a democratização do debate no curso do processo.

Ademais, a interação entre as partes e o magistrado, por meio do necessário diálogo sobre todos os atos e fatos componentes do processo, acaba por ampliar o quadro de analise, reduzindo demasiadamente o risco de opiniões preconcebidas e, por conseguinte, beneficiando a construção de um juízo mais aberto e ponderado. Logo, em decorrência da idéia central de efetividade, como caminho e objetivo da processualística moderna, surge a necessidade de uma nova análise da garantia do contraditório, a qual deve ser ampliada para albergar o direito das partes de participar de forma concreta na formação do provimento jurisdicional.

Primeiramente será trazido ao trabalho um conceito geral do Princípio da Cooperação no Processo Civil, indispensável ao início da abordagem temática. Serão apresentadas e discutidas as garantias constitucionais das partes no processo, como também elencadas e comentadas as formalidades legais do artigo 267, § 3º, do Código Processual Civil.

É justamente no mérito acadêmico de examinar a abrangência dessa interpretação que vamos dirigir o trabalho, na expectativa de trazer novas interpretações e contribuir para que o estudo desse novo princípio possa trazer ao Direito amparo as partes do processo.

Nesta perspectiva, é importante destacar a relevância do tema, uma vez que o embate nas referidas Questões de Ordem Pública são, atualmente, no Processo Civil Brasileiro decretadas de Oficio pelo o magistrado. Assim, o tema proposto tem acentuada relevância, pois há necessidade de uma avaliação ética sobre o papel das partes e do Juiz no processo e, em tal perspectiva, vem a tona a importância do denominado princípio da colaboração.

O Princípio da Cooperação ou da Colaboração, geralmente utilizado na ocasião de entendimentos jurisprudenciais, entretanto, distante de realidade processual entre partes e juiz, sempre foi objeto de discussões doutrinárias, nessa modalidade de princípio colaborador, devem as partes e o juiz processante, estarem interligadas.

Presentemente, nesse cenário de aversão social ao processo, urge a necessidade de reconstruir os dogmas processuais desde sua base axiológica, passando pelo nascimento de seus conceitos, com a finalidade de adaptar o processo à realidade dos novos tempos. Ou seja, devemos reformular as considerações que agem em todo o sistema processual, sejam normas estritas, sejam princípios, sejam meras nomenclaturas.

Sobre princípios jurídicos, existem duas correntes principais de investigação citadas por Humberto Ávila[6], onde, a primeira, analisa os princípios de modo a exaltar os valores por eles protegidos, qualificando-os como alicerces ou pilares do ordenamento jurídico, sem, contudo, examinar quais são os comportamentos indispensáveis à efetivação desses valores e quais são os mecanismos metodológicos necessários à fundamentação controlável da sua aplicação.

A segunda investiga os princípios de maneira a privilegiar o estudo de sua estrutura, visando a encontrar um procedimento racional de fundamentação que permita tanto especificar as condutas necessárias à realização dos valores por eles prestigiados, quanto justificar e controlar sua aplicação.

Posteriormente, com o escopo de avançar no estudo sobre o assunto em pauta, antes se faz necessário apurar qual a acepção do vocábulo "princípio" dentro do ordenamento jurídico. No entender de Miguel Reale[7], os "princípios são certos enunciados lógicos admitidos como condição ou base de validade das demais asserções que compõem dado campo do saber".

Na lição de De Plácido e Silva[8], estudioso dos vocábulos jurídicos, há o ensinamento de que os "princípios são o conjunto de regras ou preceitos que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando a conduta a ser tida em uma operação jurídica". Conforme visto toda e qualquer ciência está alicerçada em princípios, que são proposições básicas, fundamentais e típicas, as quais condicionam as estruturações e desenvolvimentos subseqüentes dessa ciência.

A título de ilustração, expõe-se o comentário tecido por Celso Antônio Bandeira de Mello[9], acerca dos princípios em geral:

“Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo.”

Assim sendo, fica revelada a magnitude de um princípio no sistema jurídico, demonstrando sua importância e função, de maneira que, sem subterfúgios, pode-se estabelecer que, ao se ferir uma norma, diretamente estar-se-á ferindo um princípio daquele sistema, que na sua essência estava embutido.

Adentrando na tarefa de identificar e arrolar princípios, com o escopo de estabelecer um universo numerus clausus deles, os operadores se deparam como uma difícil solução, senão impossível, razão pela qual, apresenta-se mais relevante e produtivo trabalhar na formulação de uma metodologia que sirva para avaliar se uma determinada norma, de interesse do operador jurídico, é ou não um princípio processual.

Nesse desiderato, como o Direito Processual é uma ciência autônoma, detém tal ramo seus próprios princípios. Juízo esse que faz parte das seguintes razões de Nelson Nery Júnior[10]: “[...] se considera ciência aquele ramo de estudos que é informado por princípios. Estes, portanto, é que dão natureza de ciência a determinada matéria”.

Dentre os princípios processuais, o da Cooperação é digno de maior aplicabilidade nos tempos hodiernos, pela simples necessidade que o jurisdicionado tem de receber, de forma mais primorosa, a prestação jurisdicional. O princípio da cooperação processual está hoje consagrado como princípio angular e exponencial do processo, de forma a propiciar que juízes e mandatários cooperem entre si, de modo a alcançar-se, de uma feição ágil e eficaz, a justiça do caso concreto.

Este princípio vem sendo muito utilizado e já prestigiado em alguns países, justamente pela sua eficácia em prol da busca célere e enérgica de Justiça. Fredie Didier Junior, em dissertação à Revista de Processo, afirma que: Atualmente, prestigia-se no Direito estrangeiro – mais precisamente na Alemanha, Franca e em Portugal – e, já com algumas repercussões na doutrina brasileira o chamado “princípio da cooperação, que orienta o magistrado a tomar uma posição de agente-colaborador do processo, de participante ativo do contraditório e não mais a de um mero fiscal de regras”.

2.3 COOPERAÇÃO E ASSISTÊNCIA JURISDICIONAL

Como é sabido com a atual fase metodológica da ciência processual exige o aperfeiçoamento do instrumento jurisdição, a fim de propiciar a tutela adequada ao direito material, ameaçado ou lesado. Neste contexto, é de valia lembrar que os princípios devem ser utilizados e interpretados como fundamentos axiológicos e a priori às regras legais. Dentre os princípios processuais, o da cooperação é digno de maior aplicabilidade nos tempos hodiernos, pela simples necessidade que o jurisdicionado tem de receber, de forma mais primorosa, a prestação jurisdicional. Tal principio corresponde a moderna perspectiva de conduzir o processo, consubstanciada na postura colaboradora dos sujeitos envolvidos.

Trata-se de leitura basilar de texto de lei, sem interpretação merecida e sem procura do bem maior que é o estabelecimento da Justiça do bom desenrolar do processo como um todo. Preceito implícito no sistema brasileiro, a cooperação tem seu alicerce no devido processo legal e por orientação a interação entre os sujeitos da relação processual. Por este princípio, uma vez detectada questão de ordem pública pelo magistrado, devem as partes serem instadas a se manifestar, a cooperar na sua solução.

Na positivação, o princípio em comento pode ser visto no famoso art. 284, caput, do Código de Processo Civil, referente à possibilidade do autor em emendar a petição inicial, caso o pólo ativo sinta necessidade de complementar aditando ou retificando termos da exordial (fatos, alegações e/ou pedidos).

“Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias.”

Por essas análises podemos complementar que existem quatro princípios que caminham interligados com o princípio da cooperação: O princípio constitucional da proporcionalidade; O princípio constitucional da solidariedade; O princípio da economia processual e o princípio da celeridade processual.

Afirmando o assunto em tela, Ovídio Baptista Silva[11] preconiza que:

“Qualquer procedimento não poderá jamais oferecer uma solução absolutamente ideal e imune a qualquer "inconveniente", ou seja, independentemente do rito utilizado para se dirimir todas as lides existentes, ainda assim o juiz nunca poderá assegurar em todos os casos que está imune de cometer qualquer injustiça”.

Neste exercício de aplicação da tutela jurisdicional viável para a manutenção do processo, e equilíbrio na relação processual, conclui-se que o principio da cooperação impele aos operadores do Direito o desafio de lançar ao ordenamento jurídico o máximo de harmonização processual.

2.4 IGUALDADE NO TRATAMENTO PROCESSUAL.

Observando este cenário de obsolescência do sistema processual brasileiro, apresenta-se necessária uma reconstrução dogmática que examine a questão desde o nascedouro dos conceitos processuais com o escopo de adaptar o processo civil à realidade dos novos tempos. A reformulação conceitual a ser empreendida deverá abarcar a totalidade do sistema processual, implicando criteriosa reavaliação tanto das normas estritas quanto dos princípios vigentes, tudo visando ao aperfeiçoamento do processo civil brasileiro.

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […]

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”

Do mesmo modo, expondo todos esses fundamentos jurídicos de que as partes, inclusive o julgador deve colaborar para entender a lei de forma mais contundente ao caso, não se manifestando sempre contrariamente ao processo. A imparcialidade do juiz é o princípio crucial para a seriedade da prestação jurisdicional. Refere-se ao órgão julgador, que deverá, inobstante a exposição do conflito pelas partes, julgar imparcialmente a lide.

A cooperação e o entendimento entre as partes deve ser algo freqüente e precedente, intensificando-se a participação do Estado na sociedade e, por conseqüência, a atuação do juiz no processo, que não deve apenas preocupar-se com o cumprimento da lei, cabendo-lhe apreciar um processo justo, permitindo a adequada verificação dos fatos e a participação das partes em um contraditório real, a justa aplicação das normas de direito material, e a efetividade da tutela dos direitos, sendo assim, um processo verdadeiramente democrático.

Entende-se na linha da atuação do juiz que notoriamente pode ser vista como uma forma de participação, esta não pode ser confundida com a qualidade que se atribui à participação das partes, que são aquelas que se sujeitam aos efeitos da decisão. Assim, podemos elucidar que o juiz deve participar para garantir a participação igualitária das partes e, assim, para que não haja falha na participação de uma delas e, havendo que seja suprida. Nesta garantia, o juiz participa em nome das partes e, por decorrência, para legitimar a sua própria atuação.

Em perspectiva ampla e aprofundada, sobre a participação do juiz no processo civil, o ilustre Cadiet[12] envolve o principio do contraditório como instrumento para elaboração do juízo, sendo a confrontação dos meios apresentados pelas as partes, que permite ao juiz solucionar o litígio ajustando a sua decisão a verdade dos fatos, equilibrando assim, o sistema processual.

2.5 A PARTICIPAÇÃO ATRAVÉS DO PROCESSO. O DEVER DO ESTADO DE VIABILIZAR A PARTICIPAÇÃO MEDIANTE O PROCESSO JUDICIAL

Observa-se do ponto de vista formal, a ordem pública é o conjunto de valores, princípios e normas que se pretende sejam observados em uma sociedade. Do ponto de vista material, ordem pública é a situação de fato ocorrente em uma sociedade, resultante da disposição harmônica dos elementos que nela interagem, de modo a permitir um funcionamento regular e estável, que garanta a liberdade de todos.

A ordem pública seria, assim, conseqüência da ordem jurídica ou do conjunto de regras formais, que emanam do ordenamento jurídico da nação. Dessa foma, o conceito de ordem pública reflete os valores dominantes e a cultura jurídica vigente em determinada época - a Constituição, a noção de interesse social e dos direitos basilares de uma coletividade.

Nesta ordem podemos destacar os ensinamentos do ilustríssimo De Plácido e Silva[13], extraímos:

“ORDEM PÚBLICA. Entende-se a situação e o estado de legalidade normal, em que as autoridades exercem suas precípuas atribuições e os cidadãos as respeitam e acatam, sem constrangimento ou protesto. Não se confunde com a ordem jurídica, embora seja uma conseqüência desta e tenha sua existência formal justamente dela derivada.” (Grifo Nosso).

Muitos juristas, entretanto, observam que a expressão ordem pública tem definição vaga e ampla, e varia no tempo e no espaço, sendo mais fácil a sua percepção na vida social. Constituir-se-ia assim pelas condições mínimas necessárias a uma conveniente vida social, a saber: segurança pública, salubridade pública e tranquilidade pública. É consenso, pois, que a ordem pública se materializa pelo convívio social pacífico e harmônico, pautado pelo interesse público, pela estabilidade das instituições e pela observância dos direitos individuais e coletivos.

É salutar que observemos o que se refere à objeção, estas que são defesas que o juiz pode conhecer de ofício.Toda objeção é matéria de ordem pública, mas nem toda matéria de ordem pública é Objeção. Neste sentido, podemos classificá-las em Peremptórias ou Dilatórias. Neste sentido, a primeira refere-se a extinção do processo, como por exemplo os casos elencados no art. 301 do Código de Processo Civil, que prevê a coisa julgada, litispendência e perempção.

Nesse passo, dispõe no art. 17 da Lei de Introdução ao Código Civil, referência explícita à ordem pública, nos termos seguintes: “As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes”.

Portanto, elementos mister do processo, porque tidos como características fundamentais, podem ser considerados como de ordem pública. Assim podemos apresentar como exemplo, as nulidades absolutas, a competência absoluta, a coisa julgada e a legitimidade de partes. Nesse diapasão, cumpre observar que as questões de ordem pública não sofrem preclusão. Podem ser revistas a qualquer momento ou grau de jurisdição.

O que percebe-sena relação jurídica, mostra-se útil comentar que os Magistrados de Primeira Instância, de um modo geral e provavelmente estimulados pela quantidade colossal de feitos existentes sobre seus cuidados, vem demonstrando pouca paciência ou tolerância com a execução que no seu entender não se desenvolve, ameaçando as partes, de forma constante, com a possibilidade não mais do arquivamento puro e simples, mas sim com a extinção da própria ação, invocando, para tanto, o disposto no artigo 267, III (extinção da ação), do Código de Processo Civil.

Evidentemente observa-se que esta corrida judicial contra o tempo acaba por piorar a já dramática situação do Poder Judiciário, pois esta corrida do julgador – ressalte-se – por vezes, gera decisões equivocadas e, portanto, injustas. Desta forma, o custoso e inepto aparato judicial estatal acaba reforçando o senso comum do povo no sentido de que algo precisa ser mudado rapidamente no processo civil brasileiro. É condição de existência e de validade da prestação jurisdicional, ao passo que o legislador confere proteção as partes, o constituinte não deixou de prever que as regras de procedimento (o direito processual) deverão proporcionar igualdade de tratamento entre as partes e, sobretudo, imparcialidade e participação no julgamento.

2.6 ORDEM PÚBLICA E O ART. 267, § 3º DO CPC. CREDIBILIDADE DA JUSTIÇA

As questões de ordem pública sempre foram fatores relevantes, em função das graves conseqüências que elas geram, se desobedecidas. Como não há estudo jurídico previamente determinado em lei, buscamos sistematizar as questões de ordem pública, por meio do que existe no ordenamento jurídico, para tentar desvendar a natureza delas, no sentido de apresentá-las com máxima de valor, definindo-as e compreendendo a lógica do tratamento conferido a elas. As respostas que encontramos são as de que a ordem pública é uma instituição, cujo objeto concretiza normas dessa natureza.

Ainda assim, entendemos que a ordem pública gera uma pluralidade necessária de normas imperativas, mas que, nem por isso, são todas irrenunciáveis, havendo perfeito exercício de vontade no campo de atuação que denominamos de ordem pública relativa em contraponto à absoluta. A ordem pública está sujeita a condições relacionadas à matéria, ao espaço e ao tempo: No que concerne a matéria, depende da natureza das situações consideradas (caráter funcional); Ao espaço, depende de referências locais (usos e costumes), o que lhe imprime diversidade; E, ao tempo, sofre influência da evolução constante dos comportamentos (caráter evolutivo).

No mesmo liame, via de regra, as questões de ordem pública são aquelas em que o interesse protegido é do Estado e da sociedade e, referem-se à existência e admissibilidade da ação e do processo. Trata-se de conceito vago, não podendo ser preenchido com uma definição.

Neste sentido, vale ainda trazer as palavras de Tércio Sampaio Ferraz, para quem: “É como se o legislador convocasse o aplicador para configuração do sentido adequado”. (grifo nosso)

O processo, como instrumento através do qual o Estado se desincumbe do seu dever de prestar tutela aos direitos, deve ser focalizado sob diversos ângulos, todos eles imprescindíveis à concretização do processo adequado ao Estado contemporâneo. A legitimação pela participação decorre da efetividade da participação das partes na formação da decisão.

Contudo, a participação das partes no procedimento, embora importante, é insuficiente para garantir a legitimidade da jurisdição. Define-se, que a parte além de ter o direito de participar do processo, possui o direito ao procedimento adequado à tutela do direito material. Ou seja, a legitimidade da jurisdição, inclusive para que lhe seja possível participar, exige a compreensão de que o processo deve mostrar apto a questionamento de direito material.

No tecer de Guilherme Marinoni[14], ressalta que a legitimidade do exercício do poder, no processo, se dá através da abertura à participação, ainda relata:

“Portanto, o processo deixou de ser um instrumento voltado à atuação da lei para passar a ser um instrumento preocupado com a proteção dos direitos, na medida em que o juiz, no Estado constitucional, além de atribuir significado ao caso concreto, compreende a lei na dimensão dos direitos fundamentais.”

No processo jurisdicional, o exercício do poder deve prestar contas aos litigantes, isto é, àqueles que são atingidos pela coisa julgada material e por todas as decisões proferidas pelo o juiz. Embora saibamos que a base esteja no princípio da participação, entende-se que o mecanismo técnico jurídico capaz de expressar o direito de alguém participar ou (colaborar) no processo que o afeta, está prevista no princípio do contraditório, anteriormente explicado, e presente na Constituição Federal na qualidade de norma fundamental.

Note-se que, mesmo o contraditório sendo mecanismo que garante essa possibilidade de participação das partes, mediante as causas de ordem pública, que versem sobre direito material, ainda que mediante alegações, provas, entre outros, não é suficiente para garantir a legitimidade do processo jurisdicional. Assim, para tanto expliquemos que além da publicidade dos atos do juiz, tem vital importância a fundamentação das suas decisões, particularmente em razão de uma circunstância ainda não considerada pela norma processual.

Diante disto, destaque-se a necessidade do contraste sobre essas normas materiais que não são objeto de fundamentação ou participação das partes no processo, por serem consideradas normas de caráter público.

2.7 EM DEFESA DA ADEQUAÇÃO DO PRINCIPIO DA COOPERAÇÃO, SUA APLICAÇÃO NO ART. 267, PARÁGRAFO 3º, DO CPC, EM FACE DA NOVA PERSPECTIVA DA GARANTIA DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA

Para expressar essa linha de pensamento abordado no contexto de nosso trabalho, observemos que o contraditório no processo civil contemporâneo, tem significado completamente diverso daquele que lhe era atribuído à época do direito liberal. O estado nessa época estava proibido de tratar de forma distinta as diferentes posições sociais em que o próprio direito de ação era analisado como direito formal de propor uma demanda, ou seja, o contraditório era visto como mera garantia de conteúdo formal.

Embora saibamos que não se falava em efetividade ou participação em contraditório, podemos destacar que a legitimação do exercício da jurisdição depende da participação, e essa tem importante expressão no princípio do contraditório, a legitimidade do processo estabelece vínculo de participação. Na verdade, o juiz está obrigado a estabelecer as discriminações necessárias para garantir e preservar a participação igualitária das partes no processo, para assim garantir o devido processo legal.

Neste sentido, a problemática do trabalho em questão reside no seguinte questionamento: Como o Principio da Cooperação pode ser colaborador essencial para os Operadores do Direito, aplicado ao Art. 267, § 3º do CPC, sob a égide da Garantia do Contraditório?

Preceito implícito no sistema brasileiro, a cooperação tem seu alicerce no devido processo legal e por orientação a interação entre os sujeitos da relação processual. Por este princípio, uma vez detectada questão de ordem pública pelo magistrado, devem as partes serem instadas a se manifestar, a cooperar na sua solução.

Em continuidade a sua explanação, o professor Fredie Didier Junior[15], prossegue:

“[...] O magistrado deve adotar uma postura de diálogo com as partes e com os demais sujeitos do processo: esclarecendo dúvidas, pedindo esclarecimentos quando estiver com dúvidas e, ainda, dando as orientações necessárias, quando for o caso. Encara-se o processo como produto de atividade cooperativa: cada qual com as suas funções, mas todos com o objetivo comum, que é a prolação de um ato final.”

Assim sendo, significa que o processo não deve ser encarado como um conjunto de despachos e decisões meritórias desconexas e fixadas na lei pelo simples fato de assim o ser desde sempre. A cooperação em discussão materializa-se no sentido de guiar os membros do processo a um caminho regrado pela colaboração mútua e pelo equilíbrio entre o que deve ser demandado e o que pode ser acordado.

A norma estabelecida no Art. 267, § 3º do CPC, destina-se a permitir que o juiz expressamente aplique ex ofício sua decisão, sem que os litigantes, partes essenciais no procedimento jurisdicional do processo sejam intimadas para se manifestar acerca da decisão, pondo fim ao processo sob uma extinção anômala da ação. Sob essa égide é que se encontra a problemática estrutural das matérias conferidas como ordem pública, nos remetendo a tal questionamento processual.

Segundo Cadiet[16], em sábias palavras manifestou-se:

“O contraditório serve ao litígio na medida em que é o instrumento para elaboração do juízo; é a confrontação dos meios apresentados pelas as partes, que permite ao juiz solucionar o litígio ajustando a sua decisão o mais perto possível da verdade dos fatos. Esta função explica o regime do contraditório, que não se impõe apenas Às partes, mas também ao juiz” (Grifo Nosso).

Um processo verdadeiramente democrático deve respeitar em perspectiva ampla e aprofundada os poderes do juiz no processo, estabelecendo uma isonomia, garantindo a participação igualitária e, assim, por decorrência conduzir um resultado justo na relação processual. Nessa dimensão, o processo assume condição de participação, ou colaboração efetiva das partes, e não apenas de tutela jurisdicional.

Diante desse cenário de obsolescência do sistema processual brasileiro, apresenta-se necessária uma reconstrução dogmática que examine a questão desde sua base axiológica, desde o nascedouro dos conceitos processuais com o fito de adaptar o processo civil à realidade dos novos tempos. E a reformulação conceitual a ser empreendida deverá abarcar a totalidade do sistema processual, implicando criteriosa reavaliação tanto das normas estritas quanto dos princípios vigentes, tudo visando ao aperfeiçoamento do processo civil brasileiro.

Diante de tal questão, é que se observa a necessidade de adequação do procedimento às necessidades do direito material aplicadas ao caso concreto, inclusive mediante a argumentação da ilegitimidade do procedimento, em face a necessidade de se dar à parte e ao juiz poder de estruturar o contraditório pela participação no processo.

Ou seja, o procedimento tem observância à efetiva participação em contraditório e amplo defesa, assegurado pelo o novo princípio da cooperação, e adequado ao procedimento material e, ainda assim, produzir uma decisão descompromissada com o conteúdo tão-somente substancial das normas constitucionais, devendo o juiz esclarecer e prevenir as partes da sua decisão, deixando a legítima aplicação jurisdicional.

De outra parte, o procedimento como já visto, é garantia de participação das partes, relaciona-se com o devido processo legal em sentido processual, e somente este princípio obedece aos direitos fundamentais processuais ou Às garantias de justiça processual insculpidas na Constituição, tais como o contraditório, a imparcialidade do juiz, a publicidade e a motivação. A legítima aplicação da jurisdição constitui garantia das partes na cooperação na relação processual.

A ênfase à cooperação no procedimento tem o objetivo de legitimar a decisão e o exercício do poder jurisdicional aplicado ao caso concreto, alertando as partes a um novo conceito de procedimento jurisdicional, estabelecendo formas justas de pacificação da lide, sem ferir normas, ou prerrogativas do poder-dever do juiz em prolatar decisão. Por oportuno, esclarece-se que esta participação dar as partes oportunidade de alegar, ou produzir elementos demonstrando mesmo em questões de ordem pública as razões a contrapor.

Destarte, o juiz, para definir o conteúdo substancial de um direito, deve argumentar de modo racional com o objetivo de convencer, através da argumentação, porém, não quer dizer que a participação das partes, ou seja, a cooperação alanceei conteúdo da decisão, é preciso que a decisão se funde em critérios objetivadores e que se ampare em uma argumentação capaz de convencer as partes e garantindo, principalmente, o contraditório.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

À luz de todo o exposto, pudemos compreender a importância de um novo conceito de Relação Jurídica, no que concerne ao Princípio da Cooperação e seu significado para a persecução processual civil, ao passo que representa, tanto pela sua obrigatoriedade quanto pela sua essência, uma maneira de formação do convencimento do juízo, ao ser utilizado como meio de acessibilidade à justiça (posto que aquilo que for declarado durante a realização da sentença, integrará como meio cognitivo-executivo à disposição do juízo para a formação de sua convicção).

Como também significa para as partes o suplante do interesse público em relação ao interesse individual das partes, em decorrência das garantias constitucionais a eles asseguradas – tais como o direito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório – instrumento de grande relevância, permitindo, por intermédio de suas manifestações processuais, que pratique sua autodefesa com escopo da garantia processual adequada.

O Princípio da Cooperação nas Questões de Ordem Pública - ordinariamente empregado na situação em que o processo reflete situação de uso inadequado do processo, ou também na hipótese em que as partes estejam necessitando de explicações do magistrado a respeito de tal fato na relação jurídica -, nos moldes do exposto, é a modalidade de questões de ordem pública ou face o princípio da cooperação que o juiz alerta as partes sobre as situações em que o êxito da ação a favor de qualquer das partes possa ser frustrado com uso inadequado do processo.

Nesse diapasão, inobstante ser uma novidade do direito processual moderno proporcionado pela avaliação ética sobre o papel das partes e do juiz na relação processual, o Princípio da Cooperação ainda é alvo de intensas críticas doutrinárias e jurisprudenciais, entre as quais a mais constante é de que essa nova modalidade de temática abordada fere os deveres garantidos ao Juiz pela Carta Magna, tais como o de manifestação ex-officio no decorrer do processo.

Permissa venia, esse não é nosso entendimento. Tais obstinações não podem prosperar, posto que o Princípio da Cooperação aplicado as Questões de Ordem Pública em nada fere o direito de manifestação ex-oficio do Juiz na relação processual, nem restringe suas prerrogativas, na medida em que sua previsão legal assegura o direito à ampla defesa e ao contraditório, estabelecendo entre as partes e o juiz a efetiva pacificação da lide, como também o acesso a justiça e comunicação essencial entre partes, estimulando uma solução justa do conflito submetido ao Poder Judiciário, de modo que esta não é obtida por meio de uma extinção anômala do processo.

Neste liame é indiscutível que os benefícios dessa modalidade de Princípio Colaborador são inequívocos, não apenas porque evita o risco de uma extinção anômala do processo, mas igualmente diante da desnecessidade desta extinção, o juiz e as partes proporcionam a democratização do debate no curso do processo.

Indubitavelmente, o Princípio da Cooperação, ao atender aos interesses das partes, permitindo sua efetiva participação, aparece como uma modalidade de intervenção bastante útil e eficaz, posto que, além de representar um meio de desburocratização do procedimento jurisdicional, elimina também os obstáculos à sua celeridade.

Ademais, estando assegurados aos sujeitos processuais a realização de todos os atos e funções oferecidas na ocasião de efetiva participação processual, como também ao juiz o direito-dever de se pronunciar sobre as questões essenciais ao conhecimento das partes, não há que se falar em prejuízo nem afronta às garantias processuais do Juiz apenas pela simples alteração na maneira de esclarecimento processual no curso do processo.

Ao longo de toda a fundamentação trazida, pudemos também depreender que é a aplicação do princípio da cooperação, este colaborador que assevera a constitucionalidade da participação das partes no processo, uma vez que os direitos constitucionais da sociedade encontram-se respaldados. Para as partes, o direito à ampla defesa encontra-se garantido através da participação no processo e, para a sociedade, por intermédio dos benefícios trazidos pela efetiva e célere prestação jurisdicional, pela preservação da segurança jurídica.

E vamos mais além. Conforme posicionamento já exposto, entendemos que o legislador poderia ter abrangido a previsão legal da utilização do Princípio da Cooperação, tornando tal modalidade de participação processual das partes e Juiz uma regra geral, tendo em vista que representa uma forma de desburocratização do processo civil, ao passo que, conforme amplamente revelado, proporciona economia processual, garante melhor definição pondo fim ao processo, agilizando, desta maneira, o trâmite processual, ao evitar novas ações, com a mesma causa de pedir e pedido, desnecessárias ao Poder Judiciário.

Finalmente, por tudo o que foi apresentado e explicitado, não vislumbramos na participação efetiva das partes e Juiz no curso do processo nenhum motivo que venha refletir uma afronta aos direitos constitucionais do Juiz, ao contrário, sua regulamentação só veio proporcionar benefícios ao processo e à sociedade, representando um grande avanço no modelo processual civil, ao passo que proporciona eficácia e celeridade ao procedimento, desburocratizando óbices e trazendo segurança à sociedade, sempre respeitando e garantido os direitos fundamentais da Relação Processual Civil.

Referências
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Notas:
[1] MARINONI, Luiz Guilherme. Novas Linhas do Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996.
[2] Novas Linhas do Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 402.
[3] JUNIOR, Nelson Nery. Código de Processo Civil Comentado. 10. ed. São Paulo: RT, 2007.
[4] WAMBIER, Luiz Rodrigues.; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de.; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil V. 1. 9.ª Ed. São Paulo: Ed. RT, 2008.
[5] Derecho Justo - fundamentos de la ética jurídica (do original alemão Richtiges Recht, Munique:
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[6] ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4. ed. 2ª tir. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 64.
[7] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
[8] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1991. p. 447.
[9] Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981. p. 230.
[10] Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 7. ed., São Paulo: RT, 2002, p. 29.
[11] Jurisdição e execução na tradição romano-canônica. 2. ed. rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
[12] Loic Cadiet. Droit judiciaire prive, cit., p. 852.
[13] Vocabulário Jurídico. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1991.
[14] Marinoni, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil, Vol. I: Teoria Geral do Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 405.
[15] JUNIOR, Fredie Didier. Revista de Processo. 2006
[16] CADIET, Lioc. Droit judiciaire prive, cit., p. 852.

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setembro 23, 2010

É possível fiança recíproca entre locatários

Caros amigos, segue interessante decisão do STJ sobre a fiança em matéria de locação. No caso em análise, ficou decidido que, se houver mais de um locatário, um deles pode prestar fiança em nome do outro, sem a necessidade de participação de terceiro estranho ao negócio.

Boa leitura a todos!


É válida a fiança prestada por um dos locatários em favor de outros locatários. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e restabeleceu a possibilidade de penhora do bem de família do fiador locatário.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) havia considerado a fiança impossível, já que essa garantia exigiria três pessoas distintas: credor, devedor afiançado e banco fiador. O locador recorreu, afirmando não existir proibição legal de que alguém seja, de um lado, locatário de imóvel e, de outro, fiador dele próprio.

O contrato foi analisado sob a ótica do Código Civil de 1916, vigente à época do negócio. Para a relatora, ministra Laurita Vaz, o STJ entende que a fiança de si mesmo não é um contrato juridicamente possível, porque este pressupõe a existência de três partes. A lógica da fiança, explicou, é a garantia de um terceiro.

Porém, no negócio analisado, há mais de um locatário. Por isso, a fiança prestada por qualquer deles em favor dos outros é válida. Segundo a relatora, nessa situação ocorre, na verdade, uma fiança recíproca, afastando a invalidade do contrato.

A ministra, no entanto, não autorizou o restabelecimento imediato da penhora sobre o bem de família. A relatora afirmou que, apesar de a informação não ter sido trazida aos autos, em consulta aos sistemas eletrônicos do TJDFT identificaram-se outras penhoras suficientes para saldar a dívida. Por isso, nessa parte, apenas autorizou que o juiz da execução, caso necessário, efetuasse a penhora do imóvel dado em garantia pelo locatário fiador.

Essa medida seria viável para evitar o excesso de penhora – o julgador pode limitar, de ofício, esse excesso – e não se prejudica pela falta de prequestionamento quanto à penhora, já que a questão específica surgiu apenas no julgamento do recurso especial.

Ao reconhecer a validade da fiança recíproca e não restabelecer a penhora, a ministra decidiu privilegiar a instrumentalidade do processo e admitir a incidência de fatos novos no recurso especial.

setembro 22, 2010

Namoro ou união estável?? TJ do Mato grosso entende que mero relacionamento amoroso não caracteriza formação de família

Por unanimidade, a Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou provimento a recurso que pedia reconhecimento de união estável. Em seu voto, o desembargador relator, Juracy Persiani, considerou que a ocorrência de um relacionamento amoroso não comprova a existência de união estável. O voto foi seguido pelos desembargadores Guiomar Teodoro Borges (revisor) e José Ferreira Leite (vogal). (Recurso nº 20871/2010).

Conforme o processo, o apelante manteve um relacionamento amoroso de aproximadamente cinco anos com a filha da apelada, até a morte da mesma. Embora as provas acrescidas aos autos tenham sido suficientes para o reconhecimento do namoro, não houve comprovação de que o casal visava constituir família nos moldes compreendidos no artigo 1.723 do Código Civil, que define a união estável como uma entidade familiar entre homem e mulher, exercida contínua e publicamente, semelhante ao casamento.

Para tentar comprovar a união estável, o apelante demonstrou que a falecida declarou, para fins de atendimento de saúde, que eles viviam juntos e que dividiram a mesma residência por um período. A mãe da falecida, por sua vez, descaracterizou as provas, informando que a filha tomou essa atitude porque o apelante não tinha recursos para arcar com o custo de um tratamento de saúde e que o abrigou por um período porque ele atravessava dificuldades financeiras.

"Até mesmo pelas declarações das testemunhas arroladas pelo autor, não se pode concluir pela coabitação, assistência mútua, enfim, pela convivência como marido e mulher, conseqüentemente, não se configura uma união estável. As testemunhas se limitam a declarar que tinham conhecimento acerca do relacionamento, entretanto, não trouxeram nada de concreto que comprove que o casal vivia em união estável", observou o desembargador relator, ao confirmar sentença de Primeira Instância.

setembro 22, 2010

Supremo julga nesta quarta validade da Lei da Ficha Limpa

O plenário do Supremo Tribunal Federal (TSE) julga nesta quarta-feira (22) a validade da Lei da Ficha Limpa e sua aplicação nas eleições deste ano. Os ministros analisam o recurso do candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC), que teve o registro negado pelo Tribunal Regional Eleitoral do DF (TRE-DF) e pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). É o primeiro julgamento sobre a validade da lei no STF.

Quatro vezes governador do DF, Roriz renunciou ao mandato de senador, em 2007, para escapar de um processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética do Senado. Com base na Lei da Ficha Limpa, ele estaria inelegível durante o restante do mandato e nos oito anos seguintes. Dessa forma, o ex-governador não poderia se candidatar até 2023, quando terá 86 anos.

Apresentada por iniciativa popular, com cerca de 2 milhões de assinaturas, a norma proíbe a candidatura de políticos condenados em decisões colegiadas e que renunciaram a mandato eletivo para escapar de cassação.

No TSE, a maioria dos ministros entendeu que a lei não modifica o processo eleitoral e, portanto, pode ser aplicada às eleições deste ano. Além disso, prevaleceu a tese de que a inelegibilidade não é uma punição, mas um conjunto de condições que devem ser preenchidas pelo candidato no momento do registro.

A defesa de Roriz contesta dispositivos polêmicos da Lei da Ficha Limpa, que geraram interpretações diversas no TSE e nos tribunais regionais. O primeiro deles é a validade da ficha limpa para as eleições deste ano. Segundo os advogados do ex-governador, a norma determina a inclusão ou exclusão de candidatos e interfere no processo eleitoral, por isso, não poderia ser aplicada neste pleito.

Ainda segundo a defesa de Roriz, a lei não poderia retroagir para modificar os efeitos da renúncia do ex-senador, o que na época não era considerado motivo para torná-lo inelegível por oito anos.

Julgamento
Com a aposentadoria de Eros Grau, dez ministros vão compor o plenário nesta quarta e existe a possibilidade de empate no julgamento. Dois dos ministros do STF que também atuam no TSE , Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, defendem a validade da lei. Os ministros Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli, que também participam das duas Cortes, já se manifestaram contra alguns dispositivos da ficha limpa.

Em caso de empate, o Supremo ainda terá de analisar como a questão seria definida. Parte dos ministros entende que, de acordo com a Constituição, é necessário o mínimo de seis votos para decidir sobre matérias constitucionais. Há ainda uma ressalva no regimento interno do STF que daria ao presidente da Corte, ministro Cezar Peluso, o voto de desempate.

A decisão do Supremo sobre a ficha limpa servirá de referência para a Justiça Eleitoral na aplicação da lei. No julgamento, os ministros podem ainda definir que a posição do STF deve servir de referência para todas as instâncias em casos semelhantes.

setembro 15, 2010

A cada 16 dias, uma pessoa troca de sexo no Brasil

15/09/2010 | Fonte: Espaço Vital
"Carla" não nasceu Carla, mas sempre soube que era mulher, apesar do registro indicar "sexo masculino". O último resquício que carrega da identidade que nunca assumiu é o pênis, que garante ser usado, de forma desconfortável, só para urinar. "Hoje está até atrofiado", diz. Ela, há 13 anos, espera que o bisturi torne mais adequada a anatomia que reconhece como errada desde a maternidade.

A cada 16 dias, o procedimento cirúrgico tão aguardado por "Carla" é realizado em um paciente do Sistema Único de Saúde. A chamada cirurgia de mudança de sexo foi um dos últimos atos cirúrgicos reconhecidos pelo governo brasileiro e entrou para a lista de procedimentos gratuitos só em 2008.

De lá para cá, 57 cirurgias foram realizadas, sendo 10 no primeiro ano, 31 em 2009 e 16 até junho de 2010. A estatística é crescente, mas ainda irrisória perto da fila de espera formada por pessoas que, assim como Carla, sentem ter nascido no corpo errado. As informações são do jornal Correio do Povo de Alagoas.

O jornal explica que "eles não são travestis, homossexuais, drag queens ou transformistas; o nome é transexual, condição reconhecida pela Organização Mundial de Saúde como um transtorno de gênero".

A matéria complementa que "não há nenhuma doença psíquica associada e os que fazem parte deste grupo nascem com um órgão sexual que não condiz com a sua personalidade", explica o psiquiatra da PUC de São Paulo Alexandre Saadeh, coordenador do Ambulatório de Transtorno de Identidade, de Gênero e Orientação Sexual.

São "mulheres na alma" (dizem todas), mas que têm pênis. "Homens na cabeça" que nascem com vagina, tentam explicar assim. Desde que o mundo é mundo, eles tentam corrigir o equívoco de nascença com técnicas arriscadas, que envolvem automutilação, silicone industrial, hormônios proibidos e isolamento social.

Nas duas últimas décadas, a Medicina passou a prestar mais atenção aos pacientes com transtornos de gênero e a cirurgia de troca de sexo deixou de ser feita só na clandestinidade. Os estudos também evoluíram.

"Até a metade dos anos 70 e início dos anos 80 só existiam pesquisas sobre a transexualidade que abordavam a influência psicológica e do meio externo", afirma o psiquiatra especializado Alexandre Saadeh.

Hoje, as pesquisas mensuram os fatores químicos existentes no processo. "Já existem evidências de que não só a genética, mas componentes químicos interferem no desenvolvimento do cérebro - enquanto o bebê ainda está na barriga da mãe - e culminam nesta condição. É claro que não existe causa única, mas não é só o meio que interfere" - garante o psiquiatra.

A cirurgia de adequação do sexo masculino para o feminino consiste, em linhas gerais, na retirada do pênis, na construção de uma cavidade parecida com a da vagina com capacidade de substituir o trato urinário, em uma operação que tem cerca 12 horas de duração. Já a "criação do pênis" é mais complicada, ainda tida como experimental e com riscos mais altos de complicação.

Os movimentos de defesa dos transexuais do Brasil estimam que menos de cinco cirurgias do tipo foram feitas no País. Para cada caso, são em média 15 microcirurgias para o procedimento ser completo. Hoje, de forma legalizada, apenas quatro centros universitários estão autorizados a fazer estas cirurgias, sendo um em São Paulo, um em Porto Alegre, um em Goiás e o último no Rio de Janeiro.

Uma norma recente do CFM - datada da semana passada - deu margem para que, a partir de agora, as clínicas particulares também realizem o procedimento. A expectativa é com a nova resolução do CFM mais unidades fiquem aptas a absorver a demanda de pacientes que cresce a cada dia.

Hoje, para a pessoa conquistar vaga em um destes quatro centros cirúrgicos, é preciso ter mais de 21 anos e um laudo médico que comprove a necessidade da cirurgia. Por isso, ao menos dois anos de acompanhamento terapêutico são exigidos. Já com este documento em mãos, a estimativa é que 200 pessoas estejam na fila de espera.

Uma delas é "Carla Amaral". No dia seguinte do anúncio de que a cirurgia chegara aos hospitais públicos, ela já estava na fila para o cadastro. "É uma violência diária viver em um corpo que não é seu", conta.

A possibilidade de ser operada faz com que "Carla Amaral" cruze os dedos todos os dias. "É a última vitória que me falta", diz ao contabilizar suas conquistas recentes. "Via Justiça, pedi para mudar meu nome e o gênero no RG. Minha mãe foi testemunha jurídica a meu favor. Este ano, consegui a mudança oficial no documento e a relação familiar voltou a ser ótima."

O engajamento no movimento trans permitiu que Carla arrumasse emprego e deixasse de ser profissional do sexo. A cirurgia, considera ela, é o toque final para que a gata borralheira, finalmente, vire a tão sonhada cinderela.

setembro 15, 2010

Novas regras para a conversão da separação judicial ou extrajudicial em divórcio

CNJ acata sugestões do IBDFAM e altera Resolução 35/2007
15/09/2010 | Fonte: Ascom com informações da Agência CNJ

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acatou, parcialmente, na tarde de ontem, as sugestões do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e alterou a Resolução 35/2007 que regulamenta a realização de divórcio e separação por via administrativa. As alterações adequam o ato normativo a Emenda Constitucional 66/2010, promulgada no mês julho desse ano, que instituiu o divórcio direto no Brasil.


Por unanimidade os conselheiros deram nova redação ao artigo 52 e suprimiram o artigo 53 da resolução, acabando com a exigência dos prazos para a realização de divórcio e para a conversão de ações de separação em divórcio pelos cartórios.


A partir de agora as pessoas interessadas em se divorciar podem solicitar a conversão da separação judicial ou extrajudicial em divórcio, apresentando apenas a certidão de averbação da separação no assento do casamento.


O relator do processo, Conselheiro Jefferson Kravchychyn, entendeu que as sugestões feitas pelo IBDFAM acabam com as dúvidas na aplicação da nova lei.

setembro 09, 2010

Viriato, um dos últimos processados por vadiagem

Ele já respondeu na Justiça por tráfico de drogas, sequestro e vadiagem. Esta última acusação, de vadio, é a que mais o incomoda em sua trajetória no mundo do crime. “Nunca fui vadio, sempre trabalhei”, defende-se Hélio da Silva Sampaio, 51 anos, mais conhecido como Virinha ou Viriato de Acari.

Foi feirante, exerceu algumas das atividades criminosas citadas acima, mas, garante, sempre pegou no pesado, como faz hoje em seu trabalho no cais do porto, na Zona Portuária do Rio.

"A vida não me ofereceu muitas oportunidades. Fui crescendo e aprendendo com os mais velhos. A oferta maior era a do crime. Muitos dos meus companheiros, que entraram comigo para essa vida, estão mortos. Eu sou um sobrevivente. Participei de vários confrontos com a polícia, levei muitos tiros, mas sobrevivi. Hoje, quero viver bem com a minha mulher, trabalhar honestamente e jogar meu futebol", conta, mostrando as marcas de tiros pelo corpo ao lembrar sua trajetória.

Embora todos no bairro saibam que ele é o Viriato de Acari – batizado desta forma pelos policiais, segundo ele, para relacionar seu nome aos crimes na favela –, atualmente é chamado pela maioria de Hélio ou Seu Hélio. Ele foi um dos últimos processados por vadiagem no Brasil, segundo juristas consultados pelo G1.

A vadiagem é uma contravenção prevista no artigo 59 do decreto-lei 3.688 de 1941. A lei classifica como vadiagem "entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover à própria subsistência mediante ocupação ilícita". A pena pode variar entre 15 dias e três meses .

"Viriato" foi preso e denunciado pelo Ministério Público por vadiagem em 1992. De acordo com a denúncia, ele trabalhava na rua como "lugar-tenente" do tráfico em Acari. A Justiça do Rio abriu processo contra ele. Ele recorreu pedindo o trancamento da ação penal ao Tribunal de Alçada Criminal do estado, que negou. O caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça, que acabou decidindo pelo fim do processo em 1993 porque o réu "provou exercer atividade laborativa lícita". Na ocasião, ele afirmou que trabalhava no cais do porto.

Hoje, Hélio tem o respeito dos amigos. “É o comportamento dele que impôs isso. É uma pessoa alegre, afável, carinhosa com as crianças e os moleques. Merece respeito”, revelou um parceiro do futebol de Irajá, subúrbio do Rio, à reportagem, que acompanhou um jogo no último domingo (5).

Apesar da amizade, ele não escapa da gozação dos colegas de bola. “Quer sofrer, fica aí para assistir o Hélio jogar”, brinca um dos amigos, acompanhado da zoação dos demais, enquanto a dona do bar começa a servir tigelas de mocotó em meio a um esquentado bate-boca e troca de acusações sobre “entradas desleais”.

“Esses caras não sabem o que é entrada desleal. Eu, ainda moleque, trabalhando na feira, fui enquadrado por vadiagem, por falta de carteira assinada e outros documentos. O sargento me deixou horas de castigo no DPO (Destacamento de Policiamento Ostensivo) de Acari. Foi a maior humilhação, e só estimulou minha entrada no crime”, afirma.

Mas, ao se transformar em Virinha – apelido que ganhou por jogar bola de gude com habilidade e fazer uma elipse perfeita “virando” simultaneamente várias bolas do adversário – passou a se destacar na favela. Logo foi convidado para entrar no grupo dos “velhos” traficantes, que viam nele uma espécie de liderança.

“O Cy de Acari (Darcy da Silva Filho), que era o chefão na favela naquela época (década de 1980), dizia que eu era um garoto esperto e mandou eu fazer a contabilidade do tráfico. Não demorou muito e fui escolhido um dos homens fortes dele”, lembrando a formação de grupos armados que atuavam naquela região (Irajá, Acari, Fazenda Botafogo, Coelho Neto, Vigário Geral e Parada de Lucas). Cy foi assassinado em 1999.

Além de Cy, Viriato também conviveu com os criminosos mais procurados pela polícia, na época, Tonicão e Jorge Luís. “Botaram muita coisa na minha conta, também. Diziam que o Jorge Luís respondia a 66 processos. Em meu nome tinha mais de 30, a metade. Pô, quem era o chefe do tráfico era ele, não eu. Foi Deus que me livrou desse mundo do crime”, acredita, garantindo que já cumpriu a pena que lhe cabia na Justiça.

Viriato diz que deixou o crime quando um fornecedor de drogas e armas desistiu de fazer uma entrega no dia combinado, a pedido da mulher evangélica. Mas, mesmo sem a encomenda, o traficante fez o percurso acertado como se estivesse com o material.

“Foi abordado pela polícia, mas não estava com nada. Nós dois escapamos do flagrante. Para mim, isso é um livramento de Deus. Ele disse que foi graças às orações da mulher dele. Esse companheiro deixou o crime, a partir daquele dia, eu também, claro”, conta.

Vadiagem controversa
O juiz Fábio Aguiar Munhoz Soares, da 17ª Vara Criminal de São Paulo diz que os casos de processo por vadiagem eram comuns até a década de 70. Depois da promulgação da Constituição, em 1988, foram poucos os casos – entre eles, o de Viriato.

"A lei que contém a vadiagem é de 1941. É uma contravenção, como se fosse um crime menor. O legislador entendeu que alguns delitos de menor expressão deveriam ser considerados contravenção penal. De lá para cá o Brasil mudou, as coisas mudaram. Em algumas cidades do Brasil, a sua aplicação ainda pode ocorrer. Mas dificilmente será aplicada em cidades grandes, como São Paulo."

Para o magistrado, no entanto, é uma lei que não deve ser aplicada. "É mais fácil que o filho do pobre seja considerado vadio, porque fica ali na rua. O filho do rico, se não trabalhar, vive da renda do pai, faz outras coisas, não será considerado vadio, embora os dois tenham condições iguais para o trabalho. É totalmente inconstitucional."

O defensor público Gabriel Habib, da Defensoria Pública Federal no Rio de Janeiro, disse que a lei está em desuso porque traz conceitos que não são claros nem precisos. "O que é ociosidade? O que é subsistência? Geram dúvidas. Então a lei não caducou, mas está em desuso. Sobretudo em um país de miseráveis com tanto desemprego. Todo mundo sem emprego, renda, poderia ser condenado por ser vadio. Vadiagem não é contravenção. É um problema social. O próprio estado abandona o cidadão, depois quer punir por vadiagem?"

Em consulta ao site da Câmara dos Deputados, o G1 localizou ao menos quatro projetos de lei que revogam o artigo. No ano passado, o Congresso revogou o item que considerava a mendicância uma contravenção penal, mas não mexeu na punição à vadiagem.

Cidades que aplicam
Apesar das críticas dos juristas, o G1 localizou duas cidades brasileiras que dizem aplicar atualmente a lei da vadiagem.

Em Goioerê, uma cidade paranaense de 30 mil habitantes, o delegado local enquadrou oito pessoas por vadiagem neste ano. O escrivão da polícia local Mauro Lima contou ao G1 que a estratégia visa reduzir a criminalidade.

"Se alguém liga e avisa que tem pessoas em uma construção há duas horas consumindo drogas. A gente chega e não encontra nada. Pergunta se trabalha, se está desempregado ou procurando emprego. Autua o cidadão e leva para delegacia. Faz então um termo circunstanciado, mas como a pena não ultrapassa dois anos de prisão, ele é solto. Encaminhamos para a Justiça e já marcamos a primeira a audiência. Aí fica com o Ministério Público", explicou.

Mas o promotor da cidade paranaense, Thadeu Augimeri de Goés Lima, disse ao G1 que esse tipo de acusação não vira processo na cidade. "Eu entendo que essa contravenção não existe depois da Constituição de 1988. Contraria princípios do direito democrático. Ele penaliza, na verdade, um modo de ser e não de fazer." Para o promotor, se alguém estiver na rua trabalhando com tráfico de drogas, por exemplo, tem de ser penalizado no segundo aspecto.

"Eu não denuncio com base na lei da vadiagem. Quando os termos chegam no Juizado Especial Criminal, eu opino pelo arquivamento", destaca o promotor.

Em Assis, no interior de São Paulo, o delegado de polícia Luis Fernando Quinteiros de Souza causou polêmica quando decidiu aplicar a lei no ano passado. Ele explica, no entanto, que ninguém foi preso na cidade por vadiagem. "Essa operação, na realidade, foi para controlar e reduzir a criminalidade na cidade. Há muitas pessoas desocupadas, mas honestas. Mas gente que nunca procurou emprego? Procuramos verificar pessoas que sequer tinham procurado trabalho honesto."

Souza disse que as pessoas eram abordadas e orientadas sobre a necessidade de procurar trabalho honesto para não serem enquadradas na lei da vadiagem. "Foi mais um trabalho de marketing que deu resultado porque diminuiu a criminalidade na cidade. E continuamos com esse trabalho para restabelecer a ordem, que é chamado de 'Tolerância Zero'."

De acordo com o delegado de Assis, os policiais na cidade são orientados para continuar abordando eventuais "desocupados" pela lei da vadiagem.

Fonte: www.g1.com.br

setembro 05, 2010

Infidelidade matrimonial e variação de rendas: o homem que ganha menos que a mulher tende a trair até cinco vezes mais

O sucesso feminino no mercado de trabalho pode colocar em xeque a fidelidade masculina. Pelo menos é o que afirma a socióloga Christin Munsch, da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos. De acordo com uma pesquisa apresentada por ela na Associação de Sociologia Americana, homens que ganham menos do que suas mulheres são cinco vezes mais propensos a cometer adultério.

A lógica é simples: ao ganhar menos, o homem deixa de ser o provedor da família. Assim, sua masculinidade vai para o ralo e ele se sente impotente. A saída, então, seria comprovar sua virilidade. “Na sociedade americana, a masculinidade é também definida naquele homem viril, que tem diversas parceiras sexuais”, explica Christin. Ironicamente, no entanto, quando o homem ganha muito mais do que sua mulher, ele também tende a trair. O motivo? “Esses homens ficam mais tempo no trabalho e têm mais oportunidades, além de ser um gasto que ele pode bancar e esconder”, diz.

Mas existem algumas variáveis importantes. Quando idade, nível de educação, crença religiosa e satisfação no relacionamento são levados em consideração, a relação entre o salário e a infidelidade desapareceram. Alguns homens podem trair ainda apenas porque estão infelizes, e não pelo salário baixo. Já para a mulher, receber menos do que o marido faz parte de seu status quo. “Para ela, não é vantajoso trair. Se ela for pega, sua qualidade de vida estará em risco”, completa a socióloga.

Há alguns anos a psicologia e a sociologia estudam a monogamia e seus diversos aspectos no emaranhado cultural do Ocidente. Alguns defendem que ela não passa de uma convenção cultural, outros, uma posição religiosa pré-estabelecida. De acordo com Rosa Maria Macedo, terapeuta de casal e coordenadora do Núcleo de Família e Comunidade do Programa de Psicologia da PUC – SP, o homem ocidental é educado para a conquista, para se firmar na sociedade pelo seu lado viril e sexual. “Sexo é um dos primeiros assuntos que surgem em uma roda de amigos”, comenta. E isso acaba fazendo do ato sexual uma convenção, e, por que não, um esporte, a ser seguido. “Na grande maioria das vezes, o adultério não passa de uma aventura, que pode surgir da crença de que o macho tem o direito de conquistar a mulher considerada fácil.”

Segundo Rosa, dezenas de pesquisas realizadas nas últimas décadas mostram que o homem faz uma distinção clara entre sexo e amor. Mas a traição pode ainda ser um mero mecanismo de defesa masculina para se valorizar. “A dupla moral permitiu ao homem levar uma vida fora de casa. Para a maioria deles, é quase uma rotina, eles não se sentem culpados.”

E os homens traem ao longo dos séculos por motivos os mais variados. Em seu livro Erotismo, Sexualidade, Casamento e Infidelidade, a psicóloga Ana Maria Fonseca Zampieri enumera uma dezena delas. Eles podem acontecer nos dois primeiros anos do casamento. “Talvez em função do chamado luto da paixão. É mais comum entre os homens”, relata. Ou depois de décadas de união, por conta da rotina, do fim do amor ou do distanciamento afetivo.

setembro 01, 2010

Filha adotiva de militar, mesmo sem comprovar adoção formal, tem direito à pensão

Filha adotiva de ex-militar, mesmo na ausência da escritura pública de adoção, tem direito a receber a pensão no caso do falecimento do pai. Esse foi o entendimento da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar um recurso especial da União contra H.S., que pretendia reverter para si o benefício que era concedido à sua mãe, viúva de um militar da Marinha, que também faleceu sem deixar herdeiros legais.

H.S. entrou na Justiça com uma ação ordinária para receber a pensão instituída por seu falecido pai adotivo. O benefício já estava sendo repassado para a mãe adotiva, F.R.R., que morreu em novembro de 1985. Entretanto, a União não reconheceu o direito da filha de se tornar beneficiária porque não havia escritura pública de adoção comprovando a sua condição de herdeira.

A sentença de primeiro grau foi favorável à filha, julgando procedente o pedido. A União recorreu, mas o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) manteve a orientação, alegando que a condição de adotada, mesmo que não comprovada pela escritura pública, estaria comprovada por outros documentos, como uma carteira de identificação expedida pelo Ministério da Marinha, que a legitimava como filha de F.A.R. e F.R.R. A falecida esposa também recebia, em seu contracheque, salário-família. “Condição de filha adotiva da autora comprovada nos autos, o que lhe assegura o vindicado direito à reversão da pensão militar, em razão do falecimento de sua mãe adotiva, independentemente de sua idade ou estado civil”, concluiu o TRF2.

Inconformada, a União apelou ao STJ com o mesmo argumento de que H.S. não teria conseguido comprovar a condição de filha adotiva, pois não apresentou a escritura pública de adoção. “O vínculo afetivo, por si só, é inábil, ao menos no mundo jurídico, para qualificar a apelada como filha, pois não tem o condão de suprir as formalidades legais exigidas para a adoção”, justificou.

Entretanto, a relatora do processo, ministra Laurita Vaz, não acolheu a tese da União. “Verifica-se que o TRF da 2ª Região, com base na apreciação do conjunto probatório dos autos, concluiu que restaram comprovados os requisitos necessários à percepção da pensão, em especial as condições de filha adotiva e dependente. A pretendida inversão do julgado implicaria, necessariamente, o reexame das provas carreadas ao processo, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ”, disse.

A ministra ressaltou ainda que o entendimento do Tribunal é no sentindo de que a melhor interpretação da lei sobre a pensão de militares (Lei n. 3.765/1960) é aquela que inclui como beneficiária também a pessoa que foi acolhida, criada, mantida e educada pelo militar, como se filho biológico fosse. “Embora H.S. não tivesse com o pai e a mãe vínculo sanguíneo, deve gozar da mesma proteção, ainda mais que, no caso analisado, restou sobejamente demonstrado que ela ostenta condição de filha adotiva do militar falecido”, concluiu.

O voto de Laurita Vaz negou provimento ao recurso especial da União, sendo acompanhado pelos demais ministros da Quinta Turma.

setembro 01, 2010

Tribunal de Justiça do RN reconhece união homoafetiva e decreta dissolução a pedido das partes

O Tribunal de Justiça reconheceu, pela primeira vez no Estado do Rio Grande do Norte, uma união homoafetiva, ocorrida no período compreendido entre o ano de 1990 a 2003, mantida entre duas mulheres, para que seja equiparada ao status de união estável. O acórdão é da 3ª Câmara Cível, que reformulou a sentença de 1º grau e decretou a dissolução da união e determinou a partilha igualitária dos bens adquiridos no período de convivência entre as partes.

A autora da ação na 6ª Vara Cível de Natal (N.R.S.) informou que manteve um relacionamento amoroso homossexual com S.T., no período compreendido entre abril de 1990 a abril de 2003, perfazendo um total de 13 anos, e que, na constância do relacionamento, construíram um patrimônio considerável, uma vez que exploravam a atividade comercial de transporte alternativo na Linha 402 - Ponta Negra/Alecrim. Ao final, requereu o reconhecimento e dissolução da união, com a consequente partilha do patrimônio distribuído em comum.

Ao analisar o caso, o juízo de 1º grau julgou parcialmente procedente o pedido formulado nos autos, para reconhecer a união como sendo uma sociedade de fato existente entre as partes, no período de abril de 1990 a abril de 2003, bem como decretar a sua dissolução. O juízo revogou o instrumento público de mandato em que a autora N.RS. outorga poderes para S.T. administrar seus bens.

A sentença também condenou S.T. a pagar a autora o percentual de 40% sobre o valor correspondente ao veículo SPRINTER, à Motocicleta YAMAHA S. TENER, bem como à Permissão de exploração de transporte opcional contraída em seu nome (Concorrência Pública Nº 002/98), a ser apurada em liquidação de sentença.

A outra parte, S.T., pediu pela improcedência dos pedidos autorais ou, alternativamente, julgá-lo parcialmente procedente, apenas para reconhecer e dissolver uma sociedade de fato havida entre as partes da qual não existem bens a partilhar, ou, ainda, que seja reduzida a porcentagem determinada pelo Juízo de 40% na divisão sobre os bens elencados na sentença.

O relator do recurso, desembargador Amaury Moura, reformou a sentença no tocante não só a equiparação da união homoafetiva a união estável, mas também determinando que os bens adquiridos pelos conviventes devem ser partilhados igualitariamente, a título oneroso, na constância da união estável, evitando-se o enriquecimento de uma parte em detrimento da outra.

setembro 01, 2010

Alienação parental pode custar a guarda do filho

Pais ou mães separados que tentarem prejudicar a relação do filho com o ex-parceiro podem ser multados, perder a guarda da criança ou adolescente e até ter suspensa legalmente a autoridade sobre o próprio filho. A lei (12.318/10) que pune essa prática, denominada alienação parental, foi sancionada no último dia 26 pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

O projeto que deu origem à lei (PL 4053/08) foi apresentado há menos de dois anos pelo deputado Regis de Oliveira (PSC-SP). A nova lei, já em vigor, define alienação parental e exemplifica situações que podem ser enquadradas como típicas desse tipo de comportamento.

São citados como exemplos de alienação parental a realização de campanha de desqualificação da conduta do pai ou mãe; a omissão ao genitor de informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente (escolares, médicas, alterações de endereço); e ainda a mudança para local distante, sem justificativa, para dificultar a convivência com o outro genitor e com a família dele.


Atuação do juiz

Segundo Regis de Oliveira, o maior avanço da lei é deixar mais claro o que caracteriza a alienação parental e também como o Judiciário pode agir para reverter a situação. "O juiz pode afastar o filho do convívio da mãe ou do pai, mudar a guarda e o direito de visita e até impedir a visita. Como última solução, pode ainda destituir ou suspender o exercício do poder parental. O objetivo é proteger a criança e dar instrumentos hábeis para o juiz agir", afirma o parlamentar.

A lei estabelece que, ao ser informado de indício de alienação parental, o magistrado deverá determinar que uma equipe multidisciplinar conclua uma perícia sobre o caso em até 90 dias. O processo terá tramitação prioritária, e o juiz poderá impor medidas provisórias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a reaproximação entre ambos.


Caráter educativo

Para o presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFam), Rodrigo da Cunha Pereira, a sanção da lei consolida e define uma situação que já era discutida e considerada pela Justiça. Pereira lembra que, após o divórcio, a guarda dos filhos é sempre motivo de disputa e a criança é colocada como moeda de troca.

"A lei tem principalmente um caráter pedagógico e educativo, no sentido de conscientizar os pais e dar nome a esta maldade, já que difícil provar casos de alienação parental", avalia o advogado. Ele acredita que, por ser uma lei "simpática" e que, por isso, poucas pessoas se posicionam de forma contrária à aplicação, a norma deve cumprir seu propósito e ser efetivamente adotada.


Vetos


O projeto aprovado pelo Congresso Nacional era mais rigoroso que o sancionado por Lula, uma vez que previa detençãoA detenção é um dos tipos de pena privativa de liberdade. Destina-se a crimes tanto culposos (sem intenção) quanto dolosos (com intenção). Na prática, não existe hoje diferença essencial entre detenção e reclusão. A lei, porém, usa esses termos como índices ou critérios para a determinação dos regimes de cumprimento de pena. Se a condenação for de reclusão, a pena é cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. Na detenção, cumpre-se em regime semi-aberto ou aberto, salvo a hipótese de transferência excepcional para o regime fechado. Há ainda prisão simples, prevista para as contravenções penais e pode ser cumprida nos regimes semi-aberto ou aberto. de até dois anos para quem fizesse denúncia falsa de alienação para prejudicar convivência do filho com o pai ou a mãe. O dispositivo foi vetado sob o argumento de que a aplicação da pena traria prejuízos à própria criança ou adolescente e que a inversão de guarda ou suspensão da autoridade parental já são punições suficientes.

"O projeto original já não previa a pena de detenção, pois o objetivo sempre foi proteger os filhos do casal, e não colocá-los no banco de testemunhas para que um seja preso", argumenta Regis de Oliveira. Para o deputado, o texto como foi sancionado atende aos objetivos da proposta.

O presidente Lula também vetou o artigo que permitia às partes do processo fazerem acordos por meio de mediadores para depois homologarem a decisão na Justiça. O governo justificou que a Constituição Federal considera a convivência familiar um direito indisponível da criança e do adolescente. Por isso, não caberia nenhuma negociação extrajudicial.