abril 02, 2014
Artigo - Investigação de paternidade: novas evoluções.Por: Rodrigo da Cunha Pereira
Rodrigo da Cunha Pereira
A
paternidade ou maternidade socioafetiva, embora seja criação recente do
Direito brasileiro, já abraçada pela jurisprudência, inclusive do STJ,
não é nova.
A organização jurídica das famílias estrutura-se em torno da
sexualidade e da economia. Sexo, casamento e reprodução foi por muitos
séculos o esteio do Direito de Família. É certo que o casamento, já não é
mais o legitimador das relações sexuais, e nem é mais necessário sexo
para haver reprodução. Mas o casamento (e a união estável) continua
sendo um contrato para regulamentar patrimônio e tudo gira em torno do
princípio da monogamia, que está cada vez mais sendo relativizado ao ser
ponderado com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa
humana, da responsabilidade e da pluralidade das formas de famílias.
Um dos aspectos deste ramo do Direito que mais envolve a
sexualidade é o das investigações de paternidade. A história legislativa
nos comprova o quanto a moral sexual vigente interfere aí. Foi somente
em 1949, com a lei 883, que foi possível fazer investigações de
paternidade quando o suposto pai fosse casado. E mesmo assim apenas para
se buscar pensão alimentícia. Em nome desta moral condenavam-se os
filhos à invisibilidade e à pecha de ilegítimos, bastardos, espúrios
etc. Tudo isto para garantir a aparência da família patriarcal, até que a
Constituição da República de 1988 veio acabar com estas repugnantes
designações discriminatórias.
Investigar a paternidade revela segredos e traz à tona intimidades
que a maioria das pessoas prefere esconder. Até meados da década de
oitenta as ações de busca de paternidade eram verdadeiras investigações
da vida moral da mãe. Se se levava ao processo que ela teve relação com
mais de um homem, ou seja, se havia a alegação do exceptio plurium
concubentium, era o suficiente para "descartar" aquele suposto pai. E os
filhos ficavam sem pai. Os filhos de prostitutas então, não tinham
nenhuma chance. Com os exames em DNA, deslocou-se a discussão moral para
um eixo mais científico. Esta foi a primeira revolução nas
investigações de paternidade. E quem se recusa a submeter-se a ele, a
lei considera que tem “culpa no cartório”. Ou seja, o juiz declara a
paternidade com base na presunção. Acabou-se o tempo de procrastinação
de processos de investigação de paternidade.
A segunda revolução, e que muitos ainda não se deram conta, é que
mesmo descobrindo-se o genitor, através de exame em DNA, ele pode não
ser o pai. É que paternidade e maternidade são funções exercidas. Os
laços de sangue, e uma certidão de nascimento, embora importantes, não
são suficientes para garantir uma paternidade/maternidade. E assim há
hoje uma outra categoria jurídica de paternidade, que está
revolucionando os processos de busca de um pai: paternidade
socioafetiva, já ampliada para parentalidade socioafetiva. Com isto um
filho pode ter um pai biológico, outro registral, e o seu verdadeiro pai
ser aquele que o criou, ou seja, o pai socioafetivo.
A paternidade ou maternidade socioafetiva, embora seja criação
recente do Direito brasileiro, já abraçada pela jurisprudência,
inclusive do Superior Tribunal de Justiça, não é nova. Ela vincula-se ao
milenar instituto da adoção. Em outras palavras, se não se adotar o
filho, mesmo biológico, ninguém se torna pai. Prova isto a conhecida
família de Nazaré: José não era pai biológico de Jesus e nem por isto
deixou de ser seu verdadeiro pai aqui na terra. Eis aí o primeiro caso
incontestável de paternidade socioafetiva.
* Rodrigo da Cunha Pereira é presidente do IBDFAM - Instituto
Brasileiro de Direito de Família e sócio do escritório Advocacia e
Consultoria Rodrigo da Cunha Pereira.
AUTHOR:
Dimitre Soares
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