janeiro 22, 2014
Entrevista do Prof. Zeno Veloso
Na última semana, o Superior
Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, por ser uma universalidade, a
herança pode ser defendida por apenas um dos herdeiros, sem que haja
posicionamento dos demais. No caso, a doação efetuada pelo pai foi
questionada por uma das herdeiras.
Antes de falecer, o proprietário doou 100% de um apartamento, seu
único bem, a sua companheira. Após o falecimento, a filha entrou com uma
ação anulatória de doação. Em seu pedido, solicitou a nulidade da
doação no tocante a 50% do imóvel, uma vez que existiam herdeiros
necessários. O STJ considerou a doação válida e eficaz no tocante a 50%
do imóvel. Confira entrevista sobre o tema com o professor Zeno Veloso,
diretor norte e presidente da Comissão de Direito das Sucessões do
Ibdfam:
Porque o falecido não podia doar 100% do imóvel para a companheira?
No caso presente, o falecido não podia ter doado o único imóvel que
possuía à sua companheira, considerando que ele tem uma filha e, como
tal, herdeira necessária (Código Civil, art. 1.845). Aos herdeiros
necessários pertence, de pleno direito, a metade dos bens da herança,
constituindo a legítima (C.C., art. 1.846). Nula é a doação quanto à
parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia
dispor em testamento (C.C., art. 549). Quem tem herdeiros necessários
só pode dispor até a metade de seus bens, porção disponível, sendo a
outra metade a legítima de tais herdeiros; e será reduzida aos limites
da parte disponível as disposições testamentárias que excederem esta
parte e avançarem na legítima (C.C., arts, 1.846 e 1.967).
Essas regras, que limitam o poder de disposição patrimonial por
negócio jurídico gratuito, praticado por pessoa que tenha herdeiro
necessário, são comuns aos testamentos e às doações.
A doação que estamos estudando chama-se inoficiosa, excedeu os
limites impostos por lei, o doador exagerou, avançou na legítima de sua
filha, é nula a doação na parte que excedeu a metade disponível do
doador, ou seja, no que passou de a 50% do imóvel.
Como o Judiciário recepciona a doação inoficiosa?
O Judiciário tem declarado a nulidade da doação inoficiosa na parte
que exceder à que o doador podia dispor, no momento da liberalidade, se
estivesse outorgando um testamento. Neste aspecto, o Judiciário nada
mais faz do que cumprir a legislação em vigor em nosso País.
A liberdade de doar e a autonomia patrimonial são absolutas?
No ordenamento jurídico brasileiro, não é absoluta a liberdade
testamentária, ou a liberdade de doar bens, pois é preciso respeitar o
direito dos herdeiros necessários à legítima- se há tais herdeiros,
obviamente.
Embora o falecido, que doou em vida o imóvel à companheira, tivesse
dois filhos, um deles apenas, tem legitimidade para questionar em juízo
a doação, requerendo a nulidade parcial da mesma, considerando que a
herança é um bem imóvel, indivisível e universal, que se transmite
automaticamente aos herdeiros (“droit de saisine”), num condomínio “pro
indiviso”. Qualquer herdeiro pode, autonomamente, praticar atos
judiciais e extrajudiciais de defesa da posse e propriedade da herança
(C.C., arts. 80, 1.784, 1.791, 1.825).
Fonte: IBDFAM
AUTHOR:
Dimitre Soares
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