maio 13, 2013
Leia na íntegra a Resolução nº 2013/2013 do CFM que mudou as regras para Reprodução Assistida, com fortes repercussões no Direito de Família
RESOLUÇÃO CFM Nº 2.013/13
Adota
as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida, anexas
à presente resolução, como dispositivo deontológico a ser seguido pelos médicos
e revoga a Resolução CFM nº 1.957/10. O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso
das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957,
alterada pela Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, regulamentada pelo
Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, e Decreto n° 6.821, de 14 de abril
de 2009, e CONSIDERANDO a importância da infertilidade humana como um problema
de saúde, com implicações médicas e psicológicas, e a legitimidade do anseio de
superá-la; CONSIDERANDO que o avanço do conhecimento científico já permite
solucionar vários casos de problemas de reprodução humana; CONSIDERANDO que o
pleno do Supremo Tribunal Federal, na sessão de julgamento de 5.5.2011,
reconheceu e qualificou como entidade familiar a união estável homoafetiva (ADI
4.277 e ADPF 132); CONSIDERANDO a necessidade de harmonizar o uso destas
técnicas com os princípios da ética médica; CONSIDERANDO, finalmente, o
decidido na sessão plenária do Conselho Federal de Medicina realizada em 16 de
abril de 2013, RESOLVE:
Art.
1º Adotar as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida,
anexas à presente resolução, como dispositivo deontológico a ser seguido pelos
médicos.
Art.
2º Revoga-se a Resolução CFM nº 1.957/10, publicada no D.O.U. de 6 de janeiro
de 2011, Seção I, p. 79, e demais disposições em contrário.
Art.
3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.Brasília, 16 de
abril de 2013
ROBERTO LUIZ D’AVILA HENRIQUE
BATISTA E SILVA
Presidente Secretário-geral
NORMAS
ÉTICAS PARA A UTILIZAÇÃO DAS TÉCNICAS DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA
I - PRINCÍPIOS GERAIS
1
- As técnicas de reprodução assistida (RA) têm o papel de auxiliar a resolução dos problemas de reprodução humana,
facilitando o processo de procriação.
2
- As técnicas de RA podem ser utilizadas desde que exista probabilidade efetiva
de sucesso e não se incorra em risco grave de saúde para a paciente ou o possível
descendente, e a idade máxima das candidatas à gestação de RA é de 50 anos.
3
- O consentimento informado será obrigatório para todos os pacientes submetidos
às técnicas de reprodução assistida. Os aspectos médicos envolvendo a
totalidade das circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA serão detalhadamente
expostos, bem como os resultados obtidos naquela unidade de tratamento com a
técnica proposta. As informações devem também atingir dados de caráter
biológico, jurídico, ético e econômico. O documento de consentimento informado
será elaborado em formulário especial e estará completo com a concordância, por
escrito, das pessoas a serem submetidas às técnicas de reprodução assistida.
4
- As técnicas de RA não podem ser aplicadas com a intenção de selecionar o sexo
(presença ou ausência de cromossomo Y) ou qualquer outra característica biológica
do futuro filho, exceto quando se trate de evitar doenças ligadas ao sexo do
filho que venha a nascer.
5
- É proibida a fecundação de oócitos humanos, com qualquer outra finalidade que
não a procriação humana.
6
- O número máximo de oócitos e embriões a serem transferidos para a receptora não
pode ser superior a quatro. Quanto ao número de embriões a serem transferidos
faz-se as seguintes recomendações: a) mulheres com até 35 anos: até 2 embriões;
b) mulheres entre 36 e 39 anos: até 3 embriões; c) mulheres entre 40 e 50 anos:
até 4 embriões; d) nas situações de doação de óvulos e embriões, considera-se a
idade da doadora no momento da coleta dos óvulos.
7
- Em caso de gravidez múltipla, decorrente do uso de técnicas de RA, é proibida
a utilização de procedimentos que visem a redução embrionária.
II - PACIENTES DAS TÉCNICAS DE RA
1
- Todas as pessoas capazes, que tenham solicitado o procedimento e cuja indicação
não se afaste dos limites desta resolução, podem ser receptoras das técnicas de
RA desde que os participantes estejam de inteiro acordo e devidamente
esclarecidos sobre a mesma, de acordo com a legislação vigente.
2
- É permitido o uso das técnicas de RA para relacionamentos homoafetivos e pessoas
solteiras, respeitado o direito da objeção de consciência do médico.
III - REFERENTE ÀS CLÍNICAS,
CENTROS OU SERVIÇOS QUE APLICAM TÉCNICAS DE RA
As
clínicas, centros ou serviços que aplicam técnicas de RA são responsáveis pelo
controle de doenças infectocontagiosas, coleta, manuseio, conservação, distribuição,
transferência e descarte de material biológico humano para a paciente de
técnicas de RA, devendo apresentar como requisitos mínimos:
1
- um diretor técnico responsável por todos os procedimentos médicos e laboratoriais
executados, que será, obrigatoriamente, um médico registrado no Conselho
Regional de Medicina de sua jurisdição;
2
- um registro permanente (obtido por meio de informações observadas ou relatadas
por fonte competente) das gestações, nascimentos e malformações de fetos ou
recém-nascidos, provenientes das diferentes técnicas de RA aplicadas na unidade
em apreço, bem como dos procedimentos laboratoriais na manipulação de gametas e
embriões;
3
- um registro permanente das provas diagnósticas a que é submetido o material biológico
humano que será transferido aos pacientes das técnicas de RA, com a finalidade
precípua de evitar a transmissão de doenças;
4
- Os registros deverão estar disponíveis para fiscalização dos Conselhos Regionais
de Medicina.
IV - DOAÇÃO DE GAMETAS OU
EMBRIÕES
1
- A doação nunca terá caráter lucrativo ou comercial.
2
- Os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa.
3
- A idade limite para a doação de gametas é de 35 anos para a mulher e 50 anos para
o homem.
4
- Obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas
e embriões, bem como dos receptores. Em situações especiais, as informações
sobre doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para
médicos, resguardando-se a identidade civil do doador.
5
- As clínicas, centros ou serviços que empregam a doação devem manter, de forma
permanente, um registro de dados clínicos de caráter geral, características fenotípicas
e uma amostra de material celular dos doadores, de acordo com a legislação
vigente.
6
- Na região de localização da unidade, o registro dos nascimentos evitará que um(a)
doador(a) tenha produzido mais que duas gestações de crianças de sexos diferentes,
numa área de um milhão de habitantes.
7
- A escolha dos doadores é de responsabilidade da unidade. Dentro do possível, deverá
garantir que o doador tenha a maior semelhança fenotípica e imunológica e a
máxima possibilidade de compatibilidade com a receptora.
8
- Não será permitido ao médico responsável pelas clínicas, unidades ou serviços,
nem aos integrantes da equipe multidisciplinar que nelas prestam serviços,
participarem como doadores nos programas de RA.
9
- É permitida a doação voluntária de gametas, bem como a situação identificada como
doação compartilhada de oócitos em RA, onde doadora e receptora, participando
como portadoras de problemas de reprodução, compartilham tanto do material
biológico quanto dos custos financeiros que envolvem o procedimento de RA. A
doadora tem preferência sobre o material biológico que será produzido.
V - CRIOPRESERVAÇÃO DE GAMETAS OU
EMBRIÕES
1
- As clínicas, centros ou serviços podem criopreservar espermatozoides, óvulos e
embriões e tecidos gonádicos.
2
- O número total de embriões produzidos em laboratório será comunicado aos pacientes,
para que decidam quantos embriões serão transferidos a fresco, devendo os
excedentes, viáveis, serem criopreservados.
3
- No momento da criopreservação os pacientes devem expressar sua vontade, por
escrito, quanto ao destino que será dado aos embriões criopreservados, quer em
caso de divórcio, doenças graves ou falecimento de um deles ou de ambos, e quando
desejam doá-los.
4
- Os embriões criopreservados com mais de 5 (cinco) anos poderão ser descartados
se esta for a vontade dos pacientes, e não apenas para pesquisas de células-tronco,
conforme previsto na Lei de Biossegurança.
VI - DIAGNÓSTICO GENÉTICO
PRÉ-IMPLANTAÇÃO DE EMBRIÕES
1
- As técnicas de RA podem ser utilizadas acopladas à seleção de embriões submetidos
a diagnóstico de alterações genéticas causadoras de doenças.
2
- As técnicas de RA também podem ser utilizadas para tipagem do sistema HLA do
embrião, com o intuito de seleção de embriões HLA-compatíveis com algum filho(a)
do casal já afetado por doença, doença esta que tenha como modalidade de
tratamento efetivo o transplante de células-tronco ou de órgãos.
3
- O tempo máximo de desenvolvimento de embriões "in vitro" será de 14
dias.
VII - SOBRE A GESTAÇÃO DE
SUBSTITUIÇÃO (DOAÇÃO TEMPORÁRIA DO ÚTERO)
As
clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de RA
para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista
um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética
ou em caso de união homoafetiva.
1
- As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família de um dos parceiros
num parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau – mãe; segundo
grau – irmã/avó; terceiro grau – tia; quarto grau – prima), em todos os casos
respeitada a idade limite de até 50 anos.
2
- A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.
3
- Nas clínicas de reprodução os seguintes documentos e observações deverão constar
no prontuário do paciente:
-
Termo de Consentimento Informado assinado pelos pacientes (pais genéticos) e pela
doadora temporária do útero, consignado. Obs.: gestação compartilhada entre homoafetivos
onde não existe infertilidade;
-
relatório médico com o perfil psicológico, atestando adequação clínica e emocional
da doadora temporária do útero;
-
descrição pelo médico assistente, pormenorizada e por escrito, dos aspectos médicos
envolvendo todas as circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA, com dados
de caráter biológico, jurídico, ético e econômico, bem como os resultados
obtidos naquela unidade de tratamento com a técnica proposta;
-
contrato entre os pacientes (pais genéticos) e a doadora temporária do útero (que
recebeu o embrião em seu útero e deu à luz), estabelecendo claramente a questão
da filiação da criança;
-
os aspectos biopsicossociais envolvidos no ciclo gravídico-puerperal;
-
os riscos inerentes à maternidade;
-
a impossibilidade de interrupção da gravidez após iniciado o processo gestacional,
salvo em casos previstos em lei ou autorizados judicialmente;
-
a garantia de tratamento e acompanhamento médico, inclusive por equipes multidisciplinares,
se necessário, à mãe que doará temporariamente o útero, até o puerpério;
-
a garantia do registro civil da criança pelos pacientes (pais genéticos),
devendo esta documentação ser providenciada durante a gravidez;
-
se a doadora temporária do útero for casada ou viver em união estável, deverá apresentar,
por escrito, a aprovação do cônjuge ou companheiro.
VIII - REPRODUÇÃO ASSISTIDA
POST-MORTEM
É
possível desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso
do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente.
IX - DISPOSIÇÃO FINAL
Casos
de exceção, não previstos nesta resolução, dependerão da autorização do Conselho
Regional de Medicina.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA RESOLUÇÃO
CFM nº 2.013/13
No
Brasil, até a presente data não há legislação específica a respeito da
reprodução assistida. Transitam no Congresso Nacional, há anos, diversos projetos
a respeito do assunto, mas nenhum deles chegou a termo. Considerando as
dificuldades relativas ao assunto, o Conselho Federal de Medicina produziu uma
resolução – Resolução CFM nº 1.957/10 – orientadora dos médicos quanto às
condutas a serem adotadas diante dos problemas decorrentes da prática da
reprodução assistida, normatizando as condutas éticas a serem obedecidas no
exercício das técnicas de reprodução assistida.
A
Resolução CFM nº 1.957/10 mostrou-se satisfatória e eficaz, balizando o
controle dos processos de fertilização assistida. No entanto, as mudanças
sociais e a constante e rápida evolução científica nessa área tornaram necessária
a sua revisão.
Uma
insistente e reiterada solicitação das clínicas de fertilidade de todo o país
foi a abordagem sobre o descarte de embriões congelados, alguns até com mais de
20 (vinte) anos, em abandono e entulhando os serviços. A comissão revisora
observou que a Lei de Biossegurança (Lei no 11.105/05), em seu artigo 5º,
inciso II, já autorizava o descarte de embriões congelados há 3 (três) anos, contados
a partir da data do congelamento, para uso em pesquisas sobre célulastronco.
A
proposta é ampliar o prazo para 5 (cinco) anos, e não só para pesquisas sobre
células-tronco. Outros fatores motivadores foram a falta de limite de idade
para o uso das técnicas e o excessivo número de mulheres com baixa
probabilidade de gravidez devido à idade, que necessitam a recepção de óvulos
doados.
Esses
aspectos geraram dúvidas crescentes oriundas dos Conselhos Regionais de
Medicina, provocando a necessidade de atualizações.
O
somatório dos fatores acima citados foi estudado pela comissão, em conjunto com
representantes da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, da Federação
Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia e da Sociedade
Brasileira de Reprodução Humana e Sociedade Brasileira de Genética Médica, sob
a coordenação do conselheiro federal José Hiran da Silva Gallo.
Esta
é a visão da comissão formada, que trazemos à consideração do plenário do
Conselho Federal de Medicina.
Brasília-DF, 16 de abril de 2013
JOSÉ HIRAN DA SILVA GALLO
Coordenador da Comissão de
Revisão da Resolução CFM nº 1.358/92 –
Reprodução Assistida
AUTHOR:
Dimitre Soares
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