setembro 19, 2019

Novamente STJ decide matéria relativa aos cônjuges que também são sócios


O STJ voltou a ser instado a se manifestar sobre a complexa questão da presunção (ou não) do esforço comum no âmbito das relações de casamento sob o regime da separação convencional de bens. Como se sabe, há forte controvérsia sobre o tema. Historicamente havia a necessidade de comprovação do chamado "esforço comum" para aquisição de bens. Isso significava dizer que cada um dos cônjuges deveria demonstrar como colaborou para a aquisição de bens que estaria fora da regra de separação. Na prática, tais bens seriam comuns ou aquestos, isto é, adquiridos em conjunto pelo casal, ao longo da união. Contemporaneamente, o próprio STJ tem firmando entendimento no sentido de que essa demonstração de esforço comum é difícil de ser realizada na prática. Em geral, os cônjuges não costumam guardar comprovantes, recibos e pagamentos uns aos outros, sobretudo quando as uniões são longas e duradouras, muitas vezes com filhos. É o caso do REsp 1.199.790/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Vasco Della Giustina, j. 14/12/2010.

Entretanto, volta e meia, a matéria é novamente discutida no Tribunal da Cidadania. Dessa vez, tema ainda mais complexo foi analisado: saber se havia presunção de esforço comum em "sociedade de fato". Explico: o casal era casado pelo regime de separação convencional. O marido tinha um restaurante. A esposa trabalhava com ele, diuturnamente, no negócio, mas não havia registro, em nome dela, de qualquer ato constitutivo ou de gestão do negócio. A empresa, na prática, estava apenas no nome do marido. No divórcio, a ex-esposa requereu participação nos lucros da empresa, e a questão foi até o STJ.

Em nossa opinião, o STJ cometeu um erro significativo. Como essa mulher poderia comprovar que realizou esforços para manutenção e fortalecimento dos negócios do seu esposo? A formalidade da constituição escrita de negócios jurídicos passa longe da realidade da maior parte dos brasileiros. A sociedade de fato esta escancarada no dia a dia da nossa sociedade. Na mesma linha do entendimento já fixado sobre a presunção de esforço comum para a aquisição de bens, o STJ poderia, também, ter tido um posicionamento mais inclusivo, no sentido de reconhecer o esforço da esposa para fins de partilha nos lucros da pessoa jurídica.


Segue abaixo matéria disponibilizada pelo site do STJ sobre o caso:

STJ: NA SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS, PROVA ESCRITA É INDISPENSÁVEL PARA CONFIGURAR SOCIEDADE DE FATO

No regime matrimonial de separação convencional de bens, a prova formal, por escrito, é requisito fundamental para a demonstração de existência de sociedade de fato, nos termos do artigo 987 do Código Civil. Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não havendo comprovação do vínculo societário por meio de documentos, como atos constitutivos da sociedade ou atos de gestão ou integralização do capital, permanece a distinção de bens prevista no pacto nupcial formalizado entre as partes.
A autora da ação afirmou que contribuiu ativamente para o sucesso dos negócios da família do ex-marido – constituídos principalmente por um restaurante –, motivo pelo qual deveria ser considerada sócia de fato ou dona dos empreendimentos. Segundo ela, os frequentadores a identificavam como a proprietária do restaurante, sem, no entanto, ter recebido remuneração ou lucro da sociedade.
Além disso, afirmou que o ex-marido, servidor público federal, não poderia administrar a sociedade e, assim, constava formalmente como sócio outras pessoas.

Comunhão de e​​sforços

O pedido da ex-mulher foi julgado improcedente em primeira instância, mas o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) entendeu que a ausência de contrato social não impede o reconhecimento da existência de sociedade de fato havida entre pessoas em comunhão de esforços para a concretização de um bem comum.
Apesar de reconhecer o regime de separação de bens do casal, o TJDFT decidiu que era necessário evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, de forma que, provado o esforço comum na aquisição do patrimônio, haveria a necessidade de dividi-lo.

Interesse ​​expresso

O relator do recurso do ex-marido, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que, sob o regime da separação convencional, não se presume a comunhão de bens. Eventual interesse em misturar os patrimônios – acrescentou – deve ser expresso, e não presumido.
Segundo o ministro, ainda que fosse admitida a possibilidade de pessoas casadas sob o regime de separação constituírem, porventura, uma sociedade de fato – já que não lhes é vedada a constituição de condomínio –, esta relação não decorreria simplesmente da vida em comum, pois o apoio mútuo é um fundamento relevante do relacionamento.
“Tem evidência própria que, na falta de mancomunhão, a vontade de adquirirem juntos um mesmo bem ou, como no caso dos autos, de se tornarem sócios de um mesmo negócio jurídico deveria ter sido explicitada de forma solene, o que não ocorreu” – afirmou o ministro.

Atos de ges​​tão

O relator também lembrou que os resultados comerciais podem ser positivos ou negativos, motivo pelo qual é presumido que quem exerce a atividade empresarial também deve assumir os riscos do negócio. Entretanto, segundo o ministro, não há indícios de que a ex-esposa tenha realizado aportes ou participado do capital.
“Nos autos não há notícia acerca de prática de atos de gestão pela recorrida nem de prestação de contas de valores administrados por ela. Além disso, não restou configurada a indispensável affectio societatis voltada ao exercício conjunto da atividade econômica ou à partilha de resultados, como exige o artigo 981 do Código Civil”, concluiu o ministro ao restabelecer a sentença de improcedência.


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