agosto 07, 2013
Entrevista: guarda compartilhada e obrigação alimentar
Entende-se
por guarda compartilhada a responsabilidade conjunta e o exercício de
direitos e deveres, por ambos os pais, com relação ao poder familiar dos
filhos comuns. Mesmo sendo considerada, por muitos operadores do
Direito, a melhor forma de guarda dos filhos após o divórcio dos pais,
ainda existem muitas dúvidas e conceitos errôneos acerca de como é
aplicada a obrigação alimentar nesses casos. Em entrevista ao IBDFAM, o
professor Waldyr Grisard Filho, presidente da Comissão de Ensino
Jurídico de Família do Instituto, esclarece essas questões e afirma: “a
guarda compartilhada não dispensa, não faz desaparecer nem cessar a
obrigação alimentar”. Confira a entrevista.
Em que se fundamenta a idéia de que na guarda compartilhada não haveria a obrigação alimentar?
A
guarda compartilhar não dispensa, não faz desaparecer nem cessar a
obrigação alimentar. Tal obrigação decorre do dever constitucional de
assistência, criação e educação dos filhos menores de idade. A desunião
dos pais põe termo aos deveres conjugais da coabitação, da fidelidade e
do regime de bens, somente, não porém aos deveres decorrentes do
exercício do poder familiar. Esses deveres, obrigações dos pais em
relação aos filhos comuns, não se modificam ou se alteram com a
separação dos genitores, nem mesmo com a nova união que venham a
experimentar. Para a manutenção dos filhos, independentemente de
permanecerem juntos ou não, ambos devem contribuir na proporção de seus
haveres e recursos, como lhes impõe o artigo 1.703 do Código Civil. O
critério fundamental é o atinente ao princípio do melhor interesse da
criança ou do adolescente e a concreção desse princípio é alcançada com a
participação conjunta e igualitária dos pais na formação dos filhos
comuns. Portanto, é equivocada a idéia de que a obrigação de sustento,
guarda e educação dos filhos menores de idade deixa de existir na
guarda compartilhada, pois a responsabilidade parental não se esvazia.
Por isso, não há dispensa ou exoneração da obrigação alimentar.
Quais os motivos para essa confusão conceitual?
Creio
que da errônea, ou míope, compreensão do instituto. Entende-se por
guarda compartilhada, na dicção legal, a responsabilidade conjunta e o
exercício de direitos e deveres, por ambos os pais, concernentes ao
poder familiar dos filhos comuns, Não se refere apenas à tutela física,
mas também aos demais atributos do múnus a eles atribuídos,
criar, assistir, sustentar os ilhós menores de idade. No cumprimento
desses deveres, o de pagar alimentos – prestação à subsistência digna -
não desaparece.
Como é aplicada a obrigação alimentar nos casos de guarda compartilhada?
A
rigor, na guarda compartilhada inexiste fixação de valor a título de
alimentos dividindo os pais os encargos de criação e educação dos filhos
comuns na proporção de seus haveres e recursos. Não se trata,
portanto, de uma rasa divisão meio-a-meio. O que ocorre, ou pode
ocorrer, é uma flexibilização das responsabilidades por esses encargos,
pois, independentemente do modelo de guarda aplicado ao caso concreto,
sempre existirá o dever de sustento em nome e por conta do exercício do
poder familiar. O pai arca com as despesas de escola, por exemplo,
compreendendo matrícula, uniforme, material escolar, transporte e
atividades extracurriculares. A mãe, por sua vez, suporta as despesas
alimentares e plano de saúde. As despesas extraordinárias, como
vestuário, lazer e outras, serão enfrentadas em conjunto por ambos os
pais, guardada a proporção antes referida. Com a efetiva participação
dos pais nos cuidados aos filhos menores até poderia ocorrer uma redução
no valor da verba alimentar antes fixada e imposta a um só dos
genitores. Pode haver uma fixação mínima para enfrentamento de despesas
eventuais (compra de um caderno, um presente ao amigo), imprevistas, e
para aquelas outras com material de saúde e higiene. Essa divisão de
responsabilidades, cada genitor assumindo e satisfazendo diretamente
certos encargos, minimiza as áreas de atrito e de repetidos conflitos
levados ao fórum.
Qual a punição ao genitor inadimplente em guarda conjunta?
Impõe
o § 1º do artigo 1.584 do Código Civil, como dever do juiz, de informar
pai e mãe, não só o significado da guarda compartilhada, sua
importância para os filhos, mas também a similitude de deveres e
direitos atribuídos aos genitores, bem assim as sanções pelo
descumprimento de suas cláusulas. Se o descumprimento se verificar na
satisfação da obrigação alimentar, o inadimplente poderá sofrer execução
até com a possibilidade de ver sua prisão decretada, além de outras
medidas como a inscrição de seu nome no cadastro de devedores de pensão
alimentícia, em empresas de proteção ao crédito como SERASA e SPC, a
exemplo do Provimento nº 52 do TJ-MS ou ser levada a protesto a sentença
que disciplinou a questão, medidas previstas no Projeto de novo Código
de Processo Civil. Está nos poderes do juiz a modalidade e a extensão
da punição ao genitor inadimplente.
Na
guarda compartilhada existe a presunção de que os genitores irão
compartilhar igualitariamente os gastos de prole. Mesmo assim, pode ser
que exista conflito com relação à divisão dos gastos?
Mera
presunção, pois, como dito anteriormente, a divisão não se impõe
igualitária numericamente, pela aplicação simples do princípio da
isonomia, mas na proporcionalidade dos haveres e recursos de cada qual
dos genitores. Nada impede que o que paga os estudos despenda R$
3.000,00/mês e o que paga as despesas de alimentação gaste apenas R$
l.500,00/mês; aqui não há igualdade nem proporcionalidade, mas, se tudo
bem acordado e esclarecidas pelo juiz as atribuições de cada um dos
pais, dificilmente existirá conflitos supervenientes. Havendo qualquer
alteração ou modificação imotivada da cláusula de guarda, o juiz é
chamado a dirimir a controvérsia, baseado na cláusula rebus sic stantibus.
Por que a guarda compartilhada precisa ser incentivada pelos operadores de direito?
Se
os padrões sociais e culturais provocaram mudanças nas relações
familiares, também as provocaram nas relações paterno/materno-filiais.
Assim, no momento em que ocorre a separação do casal apresenta-se a
guarda compartilhada como uma opção madura para uma convivência entre
pais e filhos. Nesse sentido, lembro o acórdão paradigmático do STJ
[REsp 1.251.000-MG (2011/0084897-5)], pela pena da Ministra Nancy
Andrighi, quando afirma que “A guarda compartilhada é o ideal a ser
buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que
demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para
que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal
psicológico de duplo referencial.” Ainda, “A custódia física conjunta é o
ideal a ser buscado na fixação da guarda com,partilhada, porque sua
implementação quebra a monoparentalidade na criação dos filhos, fato
corriqueiro na guarda unilateral, que é substituída pela implementação
de condições propícias a continuidade da existência de fontes bifrontais
de exercício do Poder Familiar.” E conclui a Ementa: “A guarda
compartilhada deve ser tida como regra, e a custódia física conjunta –
sempre que possível – como sua efetiva expressão.” Assim, a guarda
compartilhada deve ser incentivada pelos operadores de direito, para
alcançar o ideal da plena proteção dos direitos fundamentais da criança e
do adolescente, o de conviver em família e ser criado por seus pais.
Fonte: IBDFAM
AUTHOR:
Dimitre Soares
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