outubro 03, 2012
Projeto que prevê abandono afetivo de idoso está pronto para votação na CCJ
Se os filhos podem recorrer à justiça para obter indenização por
abandono afetivo, os pais idosos também podem. O projeto de lei
4.294/2008, do deputado Carlos Bezerra, altera os artigos 1.632 do
Código Civil e 3º do Estatuto do Idoso e prevê a indenização por dano
moral decorrente de abandono afetivo de pais e prevê também a
indenização no caso do abandono de idosos por sua família.
O parecer favorável ao projeto de lei, elaborado pelo relator, o
deputado Antônio Bulhões, está pronto para ir à votação na Comissão de
Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Em seu relatório,
Bulhões defendeu o PL, argumentando que as obrigações existentes entre
pais e filhos não se limitam à prestação de auxílio material, mas também
ao suporte afetivo. "Embora seja verdade que não se possa obrigar
alguém a amar ou manter relacionamento afetivo, há casos em que o
abandono ultrapassa os limites do desinteresse e, efetivamente, causa
lesões ao direito da personalidade do filho ou do pai, sujeitando-os a
humilhações e discriminações", justificou o relator, acrescentando que
seria nesses casos que estaria configurado o abandono afetivo gerador do
direito à indenização moral.
A proposta tramita em caráter conclusivo nas comissões da Câmara.
Como já foi aprovada na Comissão de Seguridade e Família, basta a
aprovação do relatório do deputado pela Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) para que seja encaminhada ao Senado. O relator reconhece
que a matéria divide opiniões no meio jurídico, mas acredita que o
projeto obterá votação favorável. "Pela sua importância e atualidade, no
contexto de discussões e modificações nas relações familiares do país,
não tenho dúvidas que a CCJ vai apreciar e aprovar o projeto com
celeridade", analisa.
O abandono
A advogada e especialista em direitos da personalidade, Andryelle
Vanessa Camilo, explica que a ocorrência de abandono afetivo na vida de
idosos gera uma violação da integridade psíquica do sujeito refletindo
em angústia e em afastamento social. “Quando se fala em abandono
afetivo, não se trata apenas da monetarização do afeto. É uma ação
afirmativa para mudar a consciência das pessoas para a importância do
afeto na vida dos sujeitos”, completa.
De acordo com Andryelle, o grande problema para a efetivação do
Estatuto do Idoso e mais ainda, da alteração que prevê o abandono
afetivo, é a dificuldade que o idoso tem em denunciar os abusos. “Eles
se envergonham em denunciar e toleram essas violações. A gente só toma
conhecimento quando a situação é extremamente grave”, enfatiza.
Com relação à jurisprudência sobre o assunto, a advogada diz não
conhecer nenhum caso de condenação por abandono afetivo de idosos. “Fui
procurada várias vezes, mas geralmente as pessoas não querem levar a
denúncia adiante. Quando explico sobre o prazo e as conseqüências do
processo, elas desistem”, comenta. Andryelle detalha que os processos de
dano moral necessitam de testemunhas e narração precisa do fato para
justificar a ação. “Tem que tocar nas feridas”, reforça.
O idoso na sociedade atual
A advogada considera que o abandono do idoso difundiu-se após o
advento da Revolução Industrial, em que o valor humano tornou-se
secundário em relação ao valor produtivo fragilizando aquele que tem sua
produção reduzida em decorrência das limitações de idade. Mas nem
sempre foi assim. Ela explica que na Roma antiga, época dos “pater
familias”, o idoso assumia papel essencial na transmissão de
conhecimentos. Eram os mais velhos que detinham o poder de guardar e
passar adiante a memória dos ritos, danças e cantos para a celebração
dos cultos. Em artigo sobre o tema, ela escreve que era a participação
dos anciãos que assegurava a continuidade, a unidade das sociedades
primitivas no campo religioso, político, econômico e social.
Mesmo que a sociedade brasileira esteja envelhecendo e que os meios
de comunicação difundam a imagem do idoso ativo e cheio de saúde, o
contexto de valorização do idoso ainda está longe de se difundir na
sociedade como um todo. Essa situação ideal de vivência da terceira
idade ainda se restringe mais às classes economicamente favorecidas.
“Essas oportunidades ainda estão ligadas à classe social. Muitas
famílias dependem da aposentadoria do idoso que não consegue desfrutar
dos benefícios”, enfatiza.
É por isso que a advogada ressalta a importância da intervenção do
Estado não só na promulgação de leis mas também na execução de políticas
públicas para os idosos. “O Estatuto do Idoso, que entrou em vigência
em 2003, foi um passo importante. Agora é preciso a implementação de
políticas públicas, atividades educacionais, culturais, para que o idoso
não precise viver em ostracismo”, reflete.
Fonte: IBDFAM
AUTHOR:
Dimitre Soares
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