abril 15, 2012

O consumo como forma de afeto - Por: JAIRO BOUER


O consumo como forma de afeto

Autor: Jairo Bouer

Um ponto comum nas divergentes opiniões de pais sobre os jovens é a crítica ao consumismo exacerbado. Como entender esse comportamento à luz do que ocorreu com a sociedade brasileira nas últimas décadas? Para começar, há um encolhimento da família tradicional. Pais têm um ou dois filhos, muitas vezes criados por apenas um deles, já que quase 25% dos casamentos acabam antes dos dez anos. Mães e pais saem desde cedo de casa para trabalhar. E, encerrada a licença-maternidade, boa parte das mulheres (quase 70% delas trabalham fora de casa hoje) retoma sua lide diária de deslocamentos e dias extenuantes em escritórios, lojas e fábricas. Os pais continuam correndo atrás do pão nosso de cada dia.

Com quem ficam os filhos? Creches, escolas, babás (cada vez menos) se ocupam dos cuidados parentais iniciais. Ao chegar em casa, cansados do dia de trabalho, os pais, muitas vezes, recorrem à televisão, à internet e a jogos eletrônicos como forma de entreter as crias para poder descansar um pouco. Culpados pela sensação de que estão longe dos filhos, eles tentam, muitas vezes, compensar a distância com presentes. Não é à toa que, em pouco tempo, o quarto dos pequenos está abarrotado de brinquedos, bonecas, joguinhos e tudo o mais que estiver ao alcance do cartão de crédito.

Os pequenos percebem logo cedo que a birra, o choro, a reclamação e o protesto são boa moeda de troca na hora de conseguir o que querem. Pais com dificuldade de dizer “não” e filhos ávidos em ganhar resultam em jovens que consomem. Adivinha qual é um dos locais favoritos de entretenimento para eles? O shopping. Mas desde que possam levar alguma coisa de volta para casa. Em tempos de tecnologia, um dos principais focos de interesse são os smartphones, tablets, computadores e jogos. Mimos nada baratos.

Nossa sociedade também forneceu o molde para que essas transformações ocorressem. O valor do indivíduo passou a ser medido, numa escala maior do que outras, por aquilo que ele tem. O mérito da pessoa é avaliado hoje de uma maneira muito mais superficial, por aquilo que pode ser mostrado. E o consumo é a moeda forte nesse mercado.

Para além do bom ou do ruim, o fenômeno é um reflexo dos tempos que vivemos. Mas é importante lembrar que existem outras possibilidades e valores que podem e devem ser trabalhados com os filhos. Senão, corremos o risco de criar adultos insuportáveis. As escolhas profissionais, pessoais, amorosas podem vir influenciadas exclusivamente por esse viés consumista e individualista. A vida emocional pode ficar ainda mais solitária, pragmática e chata. Esse futuro é seu sonho de consumo?


Fonte: Revista Época

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