maio 30, 2011

"O clube do Imperador" e a decadência do professor tradicional.

A sociedade atual passar por um período de negação das estruturas educacionais. Isso é fato e pode ser facilmente constatado pelo impulso progressivo que se tem dado ao acesso midiático, à internet em conexões infinitas, aos e-books, aos sites de informação e discussão, etc. Enfim, a sociedade moderna vive um período de baixa da valorização da atividade docente, e em grande parte esse tem se mostrado um caminho sem volta. Basta um clique no mouse e centenas de sites surgem trazendo as respostas prontas para questionamentos sem fim.

A figura do professor dedicado exclusivamente aos alunos, com atenção integral para sua formação moral e acadêmica foi sendo esquecida e substituída pelo professor “pró-ativo”, aquele que interage e indica caminhos sem, entretanto, intervir diretamente na conduta pessoal de cada aluno. O sócio-construtivismo de Vygostky legou ao professor tradicionalista o papel de retrógrado, e o “professor-empresário” o substituiu como exemplo de profissional bem-sucedido e vitorioso, que, ao invés de perder grande parte de seu tempo com seus alunos, cede diminuta parcela de seu horário disponível à academia, posto que essa passa a ser um local de expansão do seu sucesso profissional (e também pessoal), e portanto, exemplo a ser seguido.

A pós-modernidade legou ao professor dedicado exclusivamente ao ensino e ao progresso de seus alunos a posição de tolo, muitas vezes frustrado por não ter conseguido se sair satisfatoriamente no mercado e, por essa razão, e principalmente por necessidade econômica, a se dedicar exaustivamente à sala de aula. Os baixos salários, igualmente, desestimulam e contradizem o incentivo à carreira docente.

É nesse contexto social e econômico, principalmente no Brasil, que se insere o filme “O Clube do Imperador” (EUA/2002 - Direção – Michael Hoffman – Europa Filmes). A história se passa em tradicionalíssimo colégio para garotos, que recebe os filhos da elite intelectual, política e econômica dos Estados Unidos. Tem como figura central, o Prof. William Hundert (kevin Kline) que leciona história clássica (greco-romana) em St. Benedicts. Ao longo de vários anos na condição de professor, querido pelos jovens alunos e admirado pelos colegas, o Prof. Hundert é o típico mestre com ótima formação, mas que continua ensinando pelo resto da vida, sem uma outra visão do mundo ou da realidade que não seja construída pelo espaço da sala de aula, que é paulatinamente preterido nos progressos da vida: a mulher por quem é apaixonado casa-se com um colega seu (que é chamado para uma cátedra em Oxford), e ele, depois de 17 anos na condição de vice-diretor da St. Benedicts, é relegado na condução para a direção geral com a morte do antigo diretor por um outro professor mais “apto a angariar recursos financeiros” para a instituição.

Como pano de fundo dessa decadência pessoal e social do professor tradicional vivido na figura do Prof. William Hundert, eis que surge na instituição um garoto rebelde, Sedgewick Bell (Emile Hirsch) filho de um influente senador americano, criado e educado no ambiente em que os mais espertos são mais bem sucedidos que os homens de caráter. Ao longo da batalha do professor para incutir o valor do aprendizado e o choque de culturas (crescer na vida por mérito próprio x crescer na vida por influência), o aluno Bell é encorajado a participar de um importante torneio local para a escolha do “Sr. Julio César”, aluno de maior destaque no ano letivo.

Na sua tentativa de recuperar o aluno desinteressado, o Prof. Hundert adultera a lista de classificação e inclui, indevidamente, Sedgewick Bell entre os finalistas. Reprovado e pego filando no final do concurso, Bell segue de modo medíocre sua formação em St. Benedicts e se torna, já adulto, em face de sua esperteza e da “malandragem tolerada”, um industrial de enorme sucesso e respeito.

Ao se reencontrarem, 25 anos depois, em uma festa de ex-alunos, com a reedição daquela final do prêmio “Sr. Julio César”, evidencia-se o confronto entre o ex-aluno que obteve pleno sucesso e o antigo professor frustrado e fracassado. O diretor do filme, nessa altura, procura trazer a reflexão da valorização da ética e da moral como valores esquecidos pela sociedade moderna, cuja base mais essencial está na figura do professor, com o qual os alunos, futuros homens de poder, dão os primeiros passos.

Na lente fria da sociedade, entretanto, o filme apenas consegue demonstrar a realidade, ao verificar que as amarras acadêmicas tolhem a visão de muitos docentes, e os impedem de ver além dos limite da sala de aula. Na perspectiva dos alunos, fica a triste sensação de que a moral e a ética são valores esquecidos, deixados de lado na busca pela sobrevivência no mundo injusto em que vivemos. Não que seja feita uma apologia à falta de caráter e ao intervencionismo monetário nas relações sociais. Ao contrário: espera-se que a lealdade vença pela seleção natural, mas na luta entre o professor “dedicação exclusiva” e o professor empresário (que vende seu nome, seu negócio e sua formação como um produto), à reboque da disciplina que ministra na sala de aula, o professor tradicional tem perdido sem chances de revanche e está se tornando, a cada dia, uma figura em extinção.

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