Acaba de ser sancionada a Lei 13.010/2014, que se originou de uma iniciativa do Presidente da República, e que visa coibir a violência por parte de quem, tem o dever legal de proteger, cuidar e educar, e se prevalece da desproporcionalidade da força física, do medo, do respeito e até do afeto que, de um modo geral, crianças e adolescentes nutrem pelas pessoas que os tens em sua companhia e guarda.O projeto inicialmente foi chamado de Lei da Palmada, nome que se justifica pelo quanto apanhou na Câmara Federal, em face da enorme resistência à sua aprovação.
julho 11, 2014
Artigo - Lei da Palmada? Lei Menino Bernardo?, por Maria Berenice Dias
Autor: Maria Berenice Dias
Acaba de ser sancionada a Lei 13.010/2014, que se originou de uma iniciativa do Presidente da República, e que visa coibir a violência por parte de quem, tem o dever legal de proteger, cuidar e educar, e se prevalece da desproporcionalidade da força física, do medo, do respeito e até do afeto que, de um modo geral, crianças e adolescentes nutrem pelas pessoas que os tens em sua companhia e guarda.O projeto inicialmente foi chamado de Lei da Palmada, nome que se justifica pelo quanto apanhou na Câmara Federal, em face da enorme resistência à sua aprovação.
Acaba de ser sancionada a Lei 13.010/2014, que se originou de uma iniciativa do Presidente da República, e que visa coibir a violência por parte de quem, tem o dever legal de proteger, cuidar e educar, e se prevalece da desproporcionalidade da força física, do medo, do respeito e até do afeto que, de um modo geral, crianças e adolescentes nutrem pelas pessoas que os tens em sua companhia e guarda.O projeto inicialmente foi chamado de Lei da Palmada, nome que se justifica pelo quanto apanhou na Câmara Federal, em face da enorme resistência à sua aprovação.
Depois do lamentável infortúnio ocorrido com Bernardo Boldrini é
que o PLC 58/2014 logrou aprovação, agora sob o nome de Lei Menino
Bernardo, com a finalidade de lembrar a triste história de quem, aos 11
anos, órfão de mãe, rejeitado pela madrasta e negligenciado pelo pai,
foi pessoalmente buscar ajuda no Forum da Comarca de Três Passos-RS, mas
em 4 de abril de 2014, acabou sendo morto pela madrasta.
A Lei que desdobrou alguns artigos do Estatuto da Criança e do
Adolescente e acrescentou um parágrafo à Lei de Diretrizes e Bases,
assegura a crianças e adolescentes o direito de serem criados e
educados sem o uso de castigo físico ou tratamento cruel ou degradante. É
definido como castigo físico o uso da força física que resulta em
sofrimento ou lesão física, mesmo que disponha de natureza disciplinar
ou corretiva. Tratamento cruel ou degradante é considerada a conduta que
humilha, a ameaça grave ou a postura que ridicularize.
Estão sujeitos à sanção legal qualquer pessoa encarregada de
cuidar, tratar, educar e proteger crianças e adolescentes: pais ou
responsáveis, integrantes da família ampliada e agentes públicos
executores de medidas socioeducativas. Aos infratores está prevista a
imposição de cinco medidas, que vão desde o encaminhamento dos
responsáveis a programa de proteção à família, a imposição de tratamento
psicológico ou psiquiátrico, até a mera advertência. Também pode ser
imposta a obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado.
Não houve a criminalização de pais ou responsáveis que agride sob
qualquer pretexto: correção, disciplina ou educação. Foi vetada a única
apenação pecuniária que constava do projeto, e que consistia na
aplicação de multa, no valor de três a 20 salários mínimos, aos
profissionais da saúde, da assistência social, da educação ou a qualquer
pessoa que exerça cargo, emprego ou função pública, que deixasse de
comunicar ao Conselho Tutelar a suspeita ou confirmação da ocorrência de
atos de violência contra menores ou adolescentes.
De forma surpreendente é atribuído ao Conselho Tutelar a imposição
das medidas previstas na Lei, apesar de todos saberem que a forma
eletiva de escolha dos conselheiros tutelares, sem a exigência de
qualquer qualificação, tem comprometido, em muito, as atividades que
deveriam desenvolver.
Ao depois, as medidas aplicadas pelos conselheiros tutelares
certamente serão questionadas judicialmente, por ausência de um
procedimento sujeito ao contraditório.
As demais regras trazidas pela Lei se limitam a determinar a
adoções de políticas públicas, como campanhas educativas, capacitação
profissional etc. Proposições que, sem imposição coercitiva, acabam
virando letra morta, pois certamente não irão despertar o interesse do
poder público, que nunca existiu quando se tratam de questões
familiares, sendo consideradas de âmbito privado.
De qualquer modo a Lei tem o mérito de acabar com a absurda
permissão que o Código Civil outorgava aos pais de castigar os filhos,
ao menos moderadamente. Isto porque só o castigo imoderado ensejava a
perda do poder familiar (CC, art. 1.638, inc. I). Ou seja, o castigo
moderado era admitido. Agora não mais. Quem impinge castigo físico ou
tratamento cruel ou degradante fica sujeito a cumprir medidas de caráter
psicossociais.
Além disso, a ação do genitor em confronto com a lei configura
falta aos deveres inerentes ao poder familiar, podendo o juiz adotar as
medidas previstas na lei (CC, art. 1.637).
Mas talvez o ponto mais nefrálgico da nova Lei seja não ter
contemplado a violência psicológica, a negligência, a agressão
emocional, que causam danos muito maiores do que a própria violência
física. Afinal, são agressões que afetam a alma e deixam cicatrizes
invisíveis aos olhos, mas que comprometem o desenvolvimento sadio e a
formação psíquica das vítimas.
Exatamente a violência sofrida por Bernardo Boldrini por parte de
seu pai e de sua madastra. Desta violência do qual ele era vítima, todos
sabiam: avó materna, professores, vizinhos, amigos e colegas. Mas nunca
ninguém se sentiu na obrigação de buscar alguma providência, fazer
qualquer tipo de denúncia.
O pedido de socorro foi feito pelo próprio Bernardo que relatou a
violência psicológica da qual era vítima ao juiz, à promotora, à
psicóloga e à assistente social. Ainda assim, a mera promessa do
genitor de que daria mais atenção ao filho foi suficiente para o
procedimento ser suspenso por 90 dias, sem que tivesse sido determinado
qualquer tipo de apoio a ele ou o acompanhamento dos seus
familiares.Assim, a Lei também não pode ser chamada de Lei Menino
Bernardo.
AUTHOR:
Dimitre Soares
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