agosto 08, 2012
Direito de Família em transformação. TJ - PB. Madrasta tem guarda reconhecida
A possibilidade de exercer a maternidade não está ligada apenas aos
vínculos biológicos. Foi partindo da premissa do afeto e do melhor
interesse da criança que a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da
Paraíba manteve sentença e garantiu que uma madrasta ficasse com a
guarda do filho do seu ex-marido.
Depois da morte de sua mulher e mãe biológica do filho, ele a
procurou e iniciaram um relacionamento. Durante nove anos, os três
viveram juntos e, de acordo com os relatórios da sentença, a criança
adotou a nova mulher do pai como mãe. O casamento terminou após um caso
extraconjugal do marido. Hoje, a criança já é um adolescente de 14 anos.
O relatório ressalta ainda a vontade da criança em ficar com a mulher
que o criou manifestada pela relação que ele construiu com a madrasta.
De acordo com o advogado e diretor do IBDFAM nordeste, Paulo Lôbo, a
decisão é correta refletida pela longa convivência do casal e pela
vontade manifestada pela criança de ficar com a madrasta. “O Tribunal
tomou como fundamento o melhor interesse da criança, que orienta o Poder
Judiciário na definição da guarda. O art. 1.584 do Código Civil prevê
que o critério a ser observado é a relação de maior afinidade e
afetividade, que, no caso, era mais com a madrasta do que com o pai
biológico”, explica.
A psicóloga e presidente da Comissão de Relações
Interdisciplinares, Giselle Groeninga, aponta a escolha pela
parentalidade socioafetiva e a possibilidade de exercer a maternidade
sem a necessidade dos vínculos biológicos, como um grande avanço para a
sociedade atual. “Não se trata de uma questão de ganhar ou perder a
guarda da criança. Cada um deve ter o seu lugar reconhecido. Felizmente o
judiciário está saindo do modelo de causalidade linear que só
assegurava a relação de pai e mãe biológicos, priorizando quem tem mais
sintonia com a criança”, completa.
Novos modelos
Paulo Lôbo aponta também que essa decisão está de acordo com o novo
conceito de família recomposta que se refere à nova união com outra
pessoa (casamento ou união estável) de quem se divorciou ou se separou
de fato, integrada com os filhos da união anterior. “Essa entidade
familiar é singularizada pelo compartilhamento da convivência com os
filhos entre o pai ou mãe que não detém a guarda. O poder do pai
separado não é desconsiderado, mas deve concorrer com a função do novo
companheiro da mãe”, explica.
Esse conceito de família recomposta foi incorporado no Estatuto das
Famílias, proposta legislativa do IBDFAM que pretende revogar todo o
livro IV do Código Civil de 2002. O objetivo é que a legislação passe a
dar tratamento diferenciado a essa nova entidade familiar que nunca foi
reconhecida. “O padrasto e a madrasta são protagonistas esquecidos. Urge
que sejam definidos os direitos e deveres que brotam da convivência com
os filhos do outro companheiro, sem prejuízo do poder familiar do pai
separado”, completa Paulo Lôbo.
Mesmo que o nome “madrasta” traga implícito a palavra “má”, é
preciso transformar o imaginário social que a coloca sempre num lugar
negativo. “O imaginário coloca a madrasta como aquela que vai ocupar o
lugar da mãe, mas a realidade não reflete esse imaginário, sobretudo no
modelo da família atual”, questiona Giselle.
Sem soma
Os autos do processo explicitam a não necessidade de se destituir o
genitor do poder familiar e nem a razão de apagar a relação parental
existente. Mesmo assim, o juiz optou pela guarda unilateral
restringindo o direito de visitas do pai biológico. A visita fica
assegurada toda semana, pegando o filho no sábado pela manhã e
entregando-o aos domingos até as 18 horas. Nas férias escolares ficou
determinado que o menino fique quinze dias com a madrasta e os outros
quinze dias com o pai.
O advogado e presidente da Comissão de Ensino Jurídico de Família,
Waldyr Grisard, acredita que o juiz deve optar pela guarda compartilhada
mesmo em situações de conflito. “A justiça deve assegurar uma ampla
convivência entre pai e filho e mãe e filho privilegiando a questão do
afeto”, relata. Giselle explica também que a opção pela guarda
unilateral pode cair num modelo de exclusão e não num modelo de soma
garantido pela guarda compartilhada.
AUTHOR:
Dimitre Soares
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