outubro 03, 2016

Novo CPC permite ações de família no juizado especial


O novo Código de Processo Civil trouxe uma mudança substancial nos conceitos de ação de família e ações de estado, o que implica em mudanças na forma de citação e até na possibilidade de ser ajuizada no Juizado Especial.
Nas ações de família a citação do réu deve seguir desacompanhada de cópia da inicial, possibilitando-se, contudo, sua consulta a qualquer tempo, conforme artigo 695 do novo CPC, sempre privilegiando a mediação e conciliação.
A citação por oficial de justiça é exigida apenas para ações de estado, sendo que nas ações de família pode ser feita por correio, nos termos do artigo 247, I, do novo CPC, o qual remete ao artigo 695, §3º, da mesma lei, apenas para estabelecer a necessidade de a citação ser na pessoa do réu, ainda que por correio, mas não para definir que são o mesmo conceito.
Já o  disposto no parágrafo 1º, do artigo 694,  determina que o mandado de citação não conterá cópia da petição inicial (contrafé) e citará o réu para comparecer à audiência de conciliação, ao invés de citá-lo para defender-se no prazo legal.
O novo CPC diferenciou ações de estado e ações de família. No entanto, não estabeleceu o que seria "ações de estado",  apenas definiu  no artigo 693, o que seria “ações de família”, considerando como tal as seguintes ações:
divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.
Contudo no artigo 388, parágrafo único, do novo CPC, diferencia claramente entre ações de estado e ações de família.
Art. 388.  A parte não é obrigada a depor sobre fatos:
I - criminosos ou torpes que lhe forem imputados;
II - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo;
III - acerca dos quais não possa responder sem desonra própria, de seu cônjuge, de seu companheiro ou de parente em grau sucessível;
IV - que coloquem em perigo a vida do depoente ou das pessoas referidas no inciso III.
Parágrafo único.  Esta disposição não se aplica às ações de estado e de família.
Em tese, são ações de estado apenas aquelas que estão diretamente ligadas ao direito de personalidade e dignidade humana, como alteração de nome, de sexo, de nacionalidade e similares. Muito embora, as ações de divórcio usem a terminologia "estado civil", esta palavra não se insere no conceito de "ações de estado".
O artigo 3º, §2º, da Lei 9.099/95  veda apenas o as ações relativas ao estado e capacidade das pessoas.
Art. 3º....
§ 2º Ficam excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.
Além disso, o artigo 8º da Lei do Juizado Especial estabelece que: não poderão ser partes, no processo instituído por esta lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.
Em razão disso, uma ação de investigação de paternidade é ação de filiação, logo ação de família, e pode ser proposta no juizado especial, exceto se uma das partes for menor de 18 anos ou interditada, ou preso.  Também, não é possível a ação exclusiva de alimentos, pois o artigo 8º da Lei 9.099/95 veda pedidos de natureza alimentar.
Contudo, na eventual ação de divórcio de partes capazes, a fixação de alimentos no divórcio, é apenas um pedido acessório, sendo que na maioria das vezes, o alimentando é a criança, o qual não é parte na ação de divórcio. Neste caso, é possível o pedido de divórcio no juizado, ainda que litigioso, desde que haja intervenção do Ministério Público. Ressaltando que nada impede que a ação de alimentos seja em separado, ou até mesmo posterior pedido de Revisão, mas neste caso não pode ser no Juizado Especial, pois é pedido principal.
Apesar de haver pouca discussão sobre a competência do juizado especial, em razão de resistências corporativas, é perfeitamente possível também aviar pedidos de alvarás para levantamento de valores oriundos de depósitos na conta do falecido decorrentes de aposentadoria, FGTS e similares, por exemplo, pois quando a lei 9.099/95 veda "resíduos", são resíduos de ações judiciais que tramitaram na vara comum. Ou seja, se o falecido tem mais bens, e que demanda inventário, isto deveria ser feito na vara comum, mas se o depósito é o único bem do falecido, e não extrapola o valor limite do Juizado Especial (40 salários mínimos), então pode ser protocolado no Juizado Especial.
Também ações como usucapião de bem móvel (e não imóvel) podem ser ajuizadas no juizado especial, pois o usucapião de bem móvel não tem rito especial, apenas o usucapião de bem imóvel.
É  preciso com os mitos tradicionais do ensino jurídico que ensinam que “ações de estado” são aquelas em que o Estado têm o interesse em intervir na relação privada e familiar. Afinal, divórcios consensuais, sem filho incapaz, já podem ser feitos nos  cartórios extrajudiciais, e até mesmo ações de divórcio litigioso, sem menor ou incapaz, não têm mais intervenção do Ministério Público. Logo, ocorreu uma mudança estrutural no conceito legislativo de “ação de estado” e “ação de família”, embora pouco discutido no meio jurídico.
Logo, no juizado especial é vedado apenas ações de estado como as de nacionalidade, mudança de sexo, interdição, alteração de nome (não mero retorno ao nome de solteira), alteração de idade, pois o mero "estado civil"  não é uma ação de estado, pois não se insere nas qualidades da personalidade e da dignidade humana.
Portanto, pode-se concluir que é possível ajuizar as ações de família, previstas no artigo 693 do novo CPC, no Juizado Especial, desde que menores não sejam parte, em virtude da vedação do artigo 8º da Lei 9.099/95, inclusive a citação deve ser feita pelo Correio, como regra. Nada impede que divórcio, ainda que litigioso, e com filho menor incapaz ou interditado, seja aviado no Juizado Especial, pois não são tecnicamente  parte, mas neste caso, haverá necessidade de intervenção do Ministério Público.

Fonte: CONJUR

outubro 03, 2016

STJ autoriza quebra de sigilo bancário de empresa em ação de divórcio

Por considerar uma medida razoável, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acolheu pedido feito por uma mulher para que fosse autorizada a quebra do sigilo bancário de pessoa jurídica que tem como um dos sócios o seu ex-marido. O recurso teve origem em ação de divórcio com pedido de alimentos.
Como o casamento foi celebrado sob o regime da comunhão universal de bens, no qual todo o patrimônio é comum ao casal, a ex-esposa alegou que, embora não fosse sócia da empresa, haveria copropriedade das cotas sociais.
O tribunal estadual negou o pedido sob o fundamento de que, como a mulher não ostenta a condição de sócia da empresa, seria “desaconselhável a violação do sigilo bancário de pessoa jurídica”. Além disso, o acórdão destacou que a apuração dos lucros e rendimentos poderia ser obtida por outros meios.
No STJ, a decisão foi reformada. A relatora, ministra Nancy Andrighi, reconheceu a existência de limitações que impedem o ex-cônjuge de exercer o pleno direito de propriedade em relação a patrimônio constituído por cotas de sociedade limitada, mas destacou a pertinência do pedido.
“Não é desarrazoado o pedido de acesso aos extratos das contas correntes da sociedade empresarial, porquanto ele se caracteriza como comedida e limitada salvaguarda da recorrente quanto ao efetivo patrimônio representado pelas cotas sociais do ex-casal”, disse a ministra.
Nancy Andrighi afirmou que o fato de a ex-esposa obter o registro das transações econômicas da sociedade em nada prejudicaria o patrimônio dos sócios nem os projetos da organização, mas seria medida necessária ao resguardo do patrimônio partilhado.
“É inarredável o fato de que essa circunstância, não raras vezes, também dá azo à manipulação patrimonial por parte do ex-cônjuge, sócio da sociedade empresarial, que, se valendo dessa situação ímpar, pode fazer minguar o patrimônio pessoal — imediatamente partilhável com a ex-cônjuge –, em favor da empresa, onde ele, a priori, fica indisponibilizado para o casal, mas que, sabe-se, pode ser indiretamente usufruído pelo sócio”, explicou a ministra.
Nancy Andrighi também destacou o entendimento da turma, firmado em precedente, que entendeu possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica em caso no qual um ex-cônjuge empresário utilizou a pessoa jurídica por ele controlada para subtrair da mulher direitos decorrentes do casamento.
“Se é possível, em determinadas circunstâncias — e esta turma já confirmou essa possibilidade —, a desconsideração invertida da personalidade jurídica e toda a devassa nas contas, livros e contratos da sociedade que dela decorrem, qual a razão para que não se defira o pedido singular de quebra de sigilo bancário da pessoa jurídica, por óbvio, medida muito menos gravosa para a sociedade empresarial?”, questionou a ministra. A turma, por unanimidade, acompanhou a relatora e deferiu o pedido de quebra de sigilo bancário. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Fonte: CONJUR

agosto 30, 2016

Para 2 seção do STJ o FGTS depositado antes do casamento pela comunhão parcial não se comunica, mas se feito na constância do casamento sim.

Para 2 seção do STJ o FGTS depositado antes do casamento pela comunhão parcial não se comunica, mas se feito na constância do casamento sim.


STJ dá mais um importante passo no sentido da consolidação da partilha dos recursos oriundos do saque de FGTS nas uniões congregadas pelo Regime da Comunhão Parcial de Bens.


DIREITO CIVIL. INEXISTÊNCIA DE MEAÇÃO DE VALORES DEPOSITADOS EM CONTA VINCULADA AO FGTS ANTES DA CONSTÂNCIA DA SOCIEDADE CONJUGAL SOB O REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL.
Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, não deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal. Diverso é o entendimento em relação aos valores depositados em conta vinculada ao FGTS na constância do casamento sob o regime da comunhão parcial, os quais, ainda que não sejam sacados imediatamente à separação do casal, integram o patrimônio comum do casal, devendo a CEF ser comunicada para que providencie a reserva do montante referente à meação, a fim de que, num momento futuro, quando da realização de qualquer das hipóteses legais de saque, seja possível a retirada do numerário pelo ex-cônjuge. Preliminarmente, frise-se que a cada doutrina pesquisada no campo do Direito do Trabalho, um conceito e uma natureza diferentes são atribuídos ao Fundo, não sendo raro alguns estudiosos que o analisam a partir de suas diversas facetas: a do empregador, quando, então sua natureza seria de obrigação; a do empregado, para quem o direito à contribuição seria um salário; e a da sociedade, cujo caráter seria de fundo social. Nesse contexto, entende-se o FGTS como o “conjunto de valores canalizados compulsoriamente para as instituições de Segurança Social, através de contribuições pagas pelas Empresas, pelo Estado, ou por ambos e que tem como destino final o patrimônio do empregado, que o recebe sem dar qualquer participação especial de sua parte, seja em trabalho, seja em dinheiro”. No que diz respeito à jurisprudência, o Tribunal Pleno do STF (ARE 709.212-DF, DJe 19/2/2015, com repercussão geral reconhecida), ao debater a natureza jurídica do FGTS, afirmou que, desde que o art. 7º, III, da CF expressamente arrolou o FGTS como um direito dos trabalhadores urbanos e rurais, “tornaram-se desarrazoadas as teses anteriormente sustentadas, segundo as quais o FGTS teria natureza híbrida, tributária, previdenciária, de salário diferido, de indenização, etc.”, tratando-se, “em verdade, de direito dos trabalhadores brasileiros (não só dos empregados, portanto), consubstanciado na criação de um ‘pecúlio permanente’, que pode ser sacado pelos seus titulares em diversas circunstâncias legalmente definidas (cf. art. 20 da Lei 8.036/1990)”. Nesse mesmo julgado, ratificando entendimento doutrinário, afirmou-se, quanto à natureza do FGTS, que “não se trata mais, como em sua gênese, de uma alternativa à estabilidade (para essa finalidade, foi criado o seguro-desemprego), mas de um direito autônomo”. A Terceira Turma do STJ, por sua vez, já sustentou que “o FGTS integra o patrimônio jurídico do empregado desde o 1º mês em que é recolhido pelo empregador, ficando apenas o momento do saque condicionado ao que determina a lei” (REsp 758.548-MG, DJ 13/11/2006) e, em outro julgado, estabeleceu que esse mesmo Fundo, que é “direito social dos trabalhadores urbanos e rurais”, constitui “fruto civil do trabalho” (REsp 848.660-RS, DJe 13/5/2011). No tocante à doutrina civilista, parte dela considera os valores recebidos a título de FGTS como ganhos do trabalho e pondera que, “no rastro do inciso VI do artigo 1.659 e do inciso V do artigo 1.668 do Código Civil, estão igualmente outras rubricas provenientes de verbas rescisórias trabalhistas, como o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), pois como se referem à pessoa do trabalhador devem ser tratadas como valores do provento do trabalho de cada cônjuge”. Aduz-se, ainda, o “entendimento de que as verbas decorrentes do FGTS se incluem na rubrica proventos”. Nesse contexto, deve-se concluir que o depósito do FGTS representa “reserva personalíssima, derivada da relação de emprego, compreendida na expressão legal ‘proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge’ (CC, art. 1559, VI)”. De fato, pela regulamentação realizada pelo aludido art. 1.659, VI, do CC/2002 – segundo o qual “Excluem-se da comunhão: […] “os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge” -, os proventos de cada um dos cônjuges não se comunicam no regime da comunhão parcial de bens. No entanto, apesar da determinação expressa do CC no sentido da incomunicabilidade, realçou-se, no julgamento do referido REsp 848.660-RS, que “o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, reconhece que não se deve excluir da comunhão os proventos do trabalho recebidos ou pleiteados na constância do casamento, sob pena de se desvirtuar a própria natureza do regime”, visto que a “comunhão parcial de bens, como é cediço, funda-se na noção de construção de patrimônio comum durante a vigência do casamento, com separação, grosso modo, apenas dos bens adquiridos ou originados anteriormente”. Ademais, entendimento doutrinário salienta que “Não há como excluir da universalidade dos bens comuns os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (CC, art. 1.659, VI) […] sob pena de aniquilar-se o regime patrimonial, tanto no casamento como na união estável, porquanto nesta também vigora o regime da comunhão parcial (CC, art. 1.725)”, destacando-se ser “Flagrantemente injusto que o cônjuge que trabalha por contraprestação pecuniária, mas não converte suas economias em patrimônio, seja privilegiado e suas reservas consideradas crédito pessoal e incomunicável”. Ante o exposto, tem-se que o dispositivo legal que prevê a incomunicabilidade dos proventos (isto é, o art. 1.659, VI, do CC/2002) aceita apenas uma interpretação, qual seja, o reconhecimento da incomunicabilidade daquela rubrica apenas quando percebidos os valores em momento anterior ou posterior ao casamento. Portanto, os proventos recebidos na constância do casamento (e o que deles advier) reforçam o patrimônio comum, devendo ser divididos em eventual partilha de bens. Nessa linha de ideias, o marco temporal a ser observado deve ser a vigência da relação conjugal. Ou seja, os proventos recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento compõem o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges, independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do outro. Dessa forma, deve-se considerar o momento em que o titular adquiriu o direito à recepção dos proventos: se adquiridos durante o casamento, comunicam-se as verbas recebidas; se adquiridos anteriormente ao matrimônio ou após o desfazimento do vínculo, os valores pertencerão ao patrimônio particular de quem tem o direito a seu recebimento. Aliás, foi esse o raciocínio desenvolvido no julgamento do REsp 421.801-RS (Quarta Turma, DJ 15/12/2003): “Não me parece de maior relevo o fato de o pagamento da indenização e das diferenças salariais ter acontecido depois da separação, uma vez que o período aquisitivo de tais direitos transcorreu durante a vigência do matrimônio, constituindo-se crédito que integrava o patrimônio do casal quando da separação. Portanto, deveria integrar a partilha”. Na mesma linha, a Terceira Turma do STJ afirmou que, “No regime de comunhão universal de bens, admite-se a comunicação das verbas trabalhistas nascidas e pleiteadas na constância do matrimônio e percebidos após a ruptura da vida conjugal” (REsp 355.581-PR, DJ 23/6/2003). No mais, as verbas oriundas do trabalho referentes ao FGTS têm como fato gerador a contratação desse trabalho, regido pela legislação trabalhista. O crédito advindo da realização do fato gerador se efetiva mês a mês, juntamente com o pagamento dos salários, devendo os depósitos serem feitos pelo empregador até o dia 7 de cada mês em contas abertas na CEF vinculadas ao contrato de trabalho, conforme dispõe o art. 15 da Lei n. 8.036/1990. Assim, deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos durante a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja realizado imediatamente à separação do casal. A fim de viabilizar a realização daquele direito reconhecido, nos casos em que ocorrer, a CEF deverá ser comunicada para que providencie a reserva do montante referente à meação, para que, num momento futuro, quando da realização de qualquer das hipóteses legais de saque, seja possível a retirada do numerário. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016, DJe 22/4/2016.
FONTE STJ

agosto 30, 2016

Obrigação complementar dos avós na obrigação de pagar alimentos aos netos é tema da ferramenta "Pesquisa Pronta" do STJ

Obrigação complementar dos avós na obrigação de pagar alimentos aos netos é tema da ferramenta "Pesquisa Pronta" do STJ

O STJ disponibilizou no seu site a interessante ferramenta "Pesquisa Pronta" para apontar a linha interpretativa que vem sendo adotada nos casos de recursos que tratam, direta ou indiretamente, da questão da complementação da pensão alimentícia dos netos por parte dos avós.

São 48 acórdãos colacionados sobre o tema, oriundos de diferentes Tribunais Estaduais, realçando a posição já consolidada de que os alimentos pagos pelos avós são subsidiários, sendo a obrigação originária e principal dos genitores.

Os acórdãos podem ser consultados a partir do link abaixo:

http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=%28avos+ou+avo+ou+avoeng%24+ou+consaguin%24%29+mesmo+%28%28presta%24+ou+obriga%24+ou+provis%F3rios+ou+%28pris%E3o+adj3+civil%29+ou+a%E7%E3o+ou+pedido+ou+complementar+ou+menor%29+prox7+aliment%24%29+nao+%28pens%24+adj6+mort%24%29&b=ACOR&p=true&l=10&i=1


agosto 30, 2016

STJ - Avô não tem interesse jurídico para pedir DNA visando a desconstituir parentesco com neto, decide STJ.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que um avô não tem interesse jurídico para pleitear a realização de exame de DNA visando a desconstituir, com base em eventual resultado negativo de vínculo genético, a relação de parentesco que resulta dos efeitos de sentença proferida em ação de reconhecimento de paternidade anteriormente ajuizada contra seu filho, transitada em julgado.
No caso analisado, “A” promoveu ação de reconhecimento de paternidade contra “B”, declarado pai por presunção ante a negativa de realizar o exame genético. Falecido “B”, o filho promoveu então ação de alimentos contra o avô, “C”, que por sua vez propôs ação declaratória incidental para discutir a relação de parentesco. Argumentava “C” que a coisa julgada formada no processo antecedente não poderia atingi-lo por força do que previa o art. 472 do CPC/1973.
A demanda incidental foi extinta em primeira instância, ao fundamento de que o avô não teria interesse de agir e que o pedido violava a coisa julgada. O TJSC manteve a decisão extintiva.
O Ministério Público Federal (MPF) opinou pelo desprovimento do recurso.
Para os ministros da Quarta Turma, o avô não está sendo atingido pela coisa julgada formada na ação de reconhecimento, mas suporta os efeitos da sentença, que se projetam para além dos limites subjetivos da demanda.
De outro lado, a maioria dos magistrados entendeu que o avô não teria interesse jurídico para requerer a realização de exame de DNA, pois, ainda que comprovada a inexistência de vínculo genético entre o avô e o neto, essa circunstância não desconstituiria a relação de parentesco civil, de natureza jurídica, estabelecida na forma dos arts. 1.591, 1.593 e 1.696 do Código Civil, como consequência da paternidade assentada por decisão judicial passada em julgado, portanto imutável e indiscutível.
Efeitos da Sentença
Para o ministro relator do recurso, Antonio Carlos Ferreira, “os efeitos da sentença, que não se confundem com a coisa julgada e seus limites subjetivos, irradiam-se com eficácia erga omnes, atingindo mesmo aqueles que não figuraram como parte na relação jurídica processual”.
Ressaltou que “se o recorrido é filho do filho do recorrente, é neto deste. Não encontra amparo na lógica ou no ordenamento jurídico a conclusão de que ‘A’ é filho de ‘B’, ‘B’ é filho de ‘C’, mas ‘A’ não é neto de ‘C’. Essa conclusão seria, sobretudo, discriminatória e, por isso, contrária ao comando do art. 227, § 6º, da Constituição Federal e do art. 1.596 da lei substantiva civil.”
Ainda segundo o relator, os pedidos revelavam pretensão que só poderia ser deduzida por meio de ação rescisória, sendo para tanto inadequada a ação declaratória incidental.
O número desse processo não é divulgado por estar sob segredo de justiça.
Fonte STJ 

agosto 30, 2016

Sucessões - STJ - Caso interessante relaciona Direito Real de Habitação com Usufruto e Direito Hereditário

Sucessões - STJ -  Caso interessante relaciona Direito Real de Habitação com Usufruto e Direito Hereditário


Viúva não tem direito de habitar imóvel que ex-marido doou aos filhos

Decisão dos ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou direito a uma viúva de habitar o imóvel onde vivia com seu falecido esposo. Antes de seu segundo casamento, o homem doou o bem aos filhos do primeiro casamento, mas devido à cláusula de usufruto, permaneceu morando no local até sua morte.
A decisão do tribunal encerra uma discussão de 63 anos sobre a posse do imóvel. A viúva recorreu ao STJ para permanecer na propriedade, alegando que o bem integrava o patrimônio do falecido, portanto estaria justificado seu direito e dos filhos do segundo casamento.
Na turma, a discussão foi sobre a possibilidade de reconhecer direito real de habitação ao cônjuge sobrevivente em imóvel que fora doado pelo falecido aos filhos, em antecipação de herança, com reserva de usufruto.
Peculiaridades
Para o ministro relator do recurso no STJ, Luis Felipe Salomão, o caso tem peculiaridades que impedem o exercício do direito de habitação do cônjuge sobrevivente. O magistrado destacou trechos do acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que havia que rejeitado o pleito da viúva.
A decisão do tribunal paulista destacou que ela ficou viúva de um usufrutuário do bem, e não do real proprietário, já que a doação havia sido concluída antes do segundo casamento. Para o ministro Salomão, é possível contestar o entendimento do TJSP, já que no caso analisado, a doação fora feita como antecipação de herança e, portanto, passível de revisão futura.
“Aquela simples doação de outrora, com cláusula de usufruto, não afastou, por si só, o direito real de habitação, uma vez que existem diversas situações em que o bem poderá ser devolvido ao acervo, retornando ao patrimônio do cônjuge falecido para fins de partilha e permitindo, em tese, eventual arguição de direito real de habitação ao cônjuge”, argumentou Salomão.
Incontestável
Mesmo com a ressalva, o ministro afirmou chegar à mesma conclusão (pela improcedência do pedido da viúva) com argumentos jurídicos distintos. Ele lembrou que a doação não foi ilegal.
O relator esclareceu que “a doação feita pelo ascendente ao herdeiro necessário que, sem exceder, saia de sua metade disponível, não pode ser tida como adiantamento da legítima.”
“Na hipótese peculiar em julgamento, não havendo nulidade da partilha ou resolução da doação, não há falar em retorno do imóvel ao patrimônio do falecido e, por conseguinte, sem respaldo qualquer alegação de eventual direito de habitação”.
Ele ressaltou que os filhos do segundo casamento e a viúva receberam outros bens na partilha, inclusive imóveis, tornando inválida a tese de que havia apenas uma moradia para a família ou que foram prejudicados na divisão de bens.
Disputa
O imóvel de 332 metros quadrados localizado em área nobre de São Paulo foi doado aos filhos do primeiro casamento em 1953, dias antes do segundo casamento. Devido à cláusula de usufruto, o homem permaneceu residindo no imóvel com sua segunda esposa, e posteriormente com os novos filhos.
Em 1971 ele faleceu. A homologação da partilha dos bens foi concluída em 1993. Desde 2000 o caso tramitava na Justiça. Com a decisão do STJ, os filhos do primeiro casamento (recebedores da doação) conseguiram a posse do imóvel.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): 
REsp 1315606
STJ

agosto 22, 2016

IBDFAM - Sucessão digital: rede social permite que usuários definam seus herdeiros virtuais

IBDFAM - Sucessão digital: rede social permite que usuários definam seus herdeiros virtuais


Recentemente, o Facebook anunciou que um bilhão de pessoas de todo o mundo acessa a rede social todos os dias. Oito em cada dez brasileiros conectados estão presentes no site de relacionamentos criado pelo norte-americano Mark Zuckerberg. Tamanha audiência faz gerar alguns questionamentos quanto às políticas de uso da plataforma. É comum, a seus usuários, receber notificações de aniversário de gente já falecida. Isso ocorre porque os perfis permanecem ativos após a morte, o que pode causar constrangimentos aos familiares e àqueles mais próximos ao finado.
O que pouca gente sabe é que já é possível designar um administrador digital para o pós-morte. É o chamado legacy contact, que nada mais é que a pessoa responsável por gerir o perfil do usuário falecido. Desta forma, a página se transforma numa espécie de memorial, em que o gestor pode fixar um post descritivo, alterar as fotos de perfil e de capa e aceitar novos pedidos de amizade. Ainda há a possibilidade de solicitar a desativação automática da conta após o óbito, atendida mediante comunicação e apresentação de documento comprobatório por parte de parentes, amigos ou responsáveis legais.
Nelson Rosenvald, Pós-Doutor em Direito Civil pela Universidade Roma-Tre e vice-presidente da Comissão da Pessoa com Deficiência do IBDFAM, explica no artigo A Sucessão na Morte Digital que mesmo que haja um inventariante para gerir o patrimônio real do morto, “a empresa (Facebook) determinou que o titular da página terá que nomear um administrador para o pós-morte, seguindo a soft law do Facebook. A escolha só poderá recair sobre os amigos que se encontram nessa rede social. O legacy contact poderá ser alterado até a morte, mas daí em diante a pessoa que foi escolhida não poderá transmitir a sua função para terceiros”.
No mesmo texto, Rosenvald elucida que, se lhe for garantida permissão prévia, “o responsável pelo legado também poderá baixar os arquivos com posts e fotos do morto, exceto o conteúdo de suas mensagens privadas. Ou seja, ele não poderá editar o que o falecido já havia publicado, excluir amigos, ou eliminar o conteúdo que seus amigos postaram na página. Se em vida a pessoa escreveu algo embaraçoso ou inseriu uma foto duvidosa, o 'legacy contact' não poderá fazer nada a respeito. Essas restrições poderão magoar aquele que julga ser função do cuidador manter o memorial imaculado. Todavia, se fosse dado ao responsável o poder de redimir os 'tropeços' do falecido, fatalmente ele concederia um maior peso emocional ao luto, em detrimento da preservação da autenticidade da pessoa morta”.
Rosenvald afirma que os familiares têm o direito de solicitar a troca do legacy contact caso fique comprovado que o nome, a imagem ou a honra do falecido não estão sendo objeto do cuidado devido. “Enquanto a tradicional remoção do inventariante se funda em regra no desmazelo na conservação de bens (art. 622, CPC/15), a substituição do legacy contact requer a demonstração da desqualificação existencial da pessoa morta. Ilustrativamente, a imagem do perfil ou a foto de capa da pessoa são inadequadas, a publicação fixada na Linha do Tempo é desrespeitosa ou novas solicitações de amizade são atendidas em contrariedade ao estilo da pessoa falecida. O problema é que a avaliação do caso seguirá os Padrões da Comunidade do Facebook, após ser informado de denúncia por familiares ou amigos”, esclarece.
O procurador de Justiça conta que ainda não há repercussões jurídicas da morte digital no direito brasileiro. Porém, ele lembra que “para além dos legados na internet, várias questões patrimoniais e afetivas afloram dos testamentos biológicos (Diretivas Antecipadas de Vontade), testamentos genéticos (disposições sobre o uso de embriões, ou mesmo partes destacadas como sêmen ou óvulo) e testamentos éticos (uma forma de compartilhar valores do falecido e as suas lições de vida)”. Portanto, considerando o número de usuários da rede social mais popular do mundo, bem como suas efetivas participações no ambiente virtual, é muito provável que a sucessão digital se torne comum em muito pouco tempo. Para definir o legacy contact ou solicitar a desativação da conta após a morte, basta clicar na seta localizada na parte superior da página e fazer o seguinte caminho: 'Configurações', 'Segurança' e, por fim, 'Contato herdeiro'.

junho 17, 2016

JORNAL CARTA FORENSE. MATÉRIA DE CAPA DE JUNHO DE 2016. DEBATE COM FERNANDA TARTUCE. ALIMENTOS INDENIZATÓRIOS. PRISÃO CIVIL

JORNAL CARTA FORENSE. MATÉRIA DE CAPA DE JUNHO DE 2016. DEBATE COM FERNANDA TARTUCE. ALIMENTOS INDENIZATÓRIOS. PRISÃO CIVIL


DEBATE COM FERNANDA TARTUCE. PRISÃO EM ALIMENTOS INDENIZATÓRIOS. JORNAL CARTA FORENSE. JUNHO DE 2016. MATÉRIA DE CAPA.
PRISÃO CIVIL EM ALIMENTOS INDENIZATÓRIOS: POSIÇÃO CONTRÁRIA
Flávio Tartuce. Doutor em Direito Civil pela USP. Professor da FADISP e da Escola Paulista de Direito. Advogado.
Os alimentos indenizatórios, ressarcitórios, indenitários ou de responsabilidade civil estão tratados pelo art. 948, II, do Código Civil como hipótese de lucros cessantes. Tal preceito trata das indenizações devidas em casos de homicídio, como ocorre em casos de atropelamentos, acidentes de trânsito e acidentes de trabalho, entre as suas principais hipóteses fáticas. De acordo com a norma, com destaque: “No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima”.  
 Como se pode perceber, como o caput do dispositivo menciona “sem excluir outras indenizações”, os valores pagos não excluem os danos morais ou extrapatrimoniais, cuja reparação é muito comum em situações tais. O inciso I trata de danos emergentes, valores que são reembolsados aos familiares que pagaram tais valores ou despesas.
 No que concerne ao inciso II da norma civil, doutrina e jurisprudência majoritárias têm entendido que se deve levar em conta a vida provável daquele que faleceu com base na expectativa fixada pelo IBGE. De qualquer forma, ressalve-se que para que os familiares tenham direito à indenização, há necessidade de um vínculo de dependência econômica dos autores da demanda em relação ao falecido. A título de exemplo, assim concluindo, a ilustrar: “a estimativa de idade provável de vida para o recebimento da pensão é feita quando a indenização é pedida, por exemplo, pelos pais, em face da morte de algum filho, pois aí pode ser usada tabela do IBGE sobre qual seria a idade provável de vida da vítima” (STJ, AgRg no Ag 1.294.592/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 23/11/2010, DJe 03/12/2010).
 Tal conclusão é perfeita, pois procura analisar o ato ilícito e a consequente responsabilidade civil de acordo com o meio que os cerca. Sendo assim, pode-se denotar, em certo sentido, a finalidade social da responsabilidade civil. Consigne-se que, atualmente e conforme as últimas pesquisas realizadas pelo IBGE, a expectativa de vida no Brasil gira em torno dos 74 anos.
 No que concerne à forma de cálculo dessa indenização, a mesma jurisprudência superior tem entendido que, em regra, deve-se fixar a indenização em 2/3 do salário da vítima, que serão multiplicados pelo número de meses até que seja atingida a mencionada idade limite. Se o morto era registrado, tendo carteira de trabalho, devem ser incluídos as férias, os valores correspondentes ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o décimo terceiro salário (ver, a ilustrar: STJ, AgRg no Ag 1.419.899/RJ, SEGUNDA TURMA, DJe 24.09.2012, citado em REsp 1.279.173/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 04.04.2013, com o mesmo entendimento). Isso, repita-se, sem excluir a indenização por danos morais decorrentes da morte de pessoa da família.
 Pois bem, questão que sempre foi debatida entre os civilistas e processualistas diz respeito à possibilidade de se pleitear a prisão civil do devedor desses alimentos indenizatórios, com fulcro no art. 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal de 1988. Nossa jurisprudência superior vinha se posicionando de forma contrária à sua viabilidade, pois os únicos alimentos que fundamentam a possibilidade de prisão civil são os familiares, devidos nos casos de parentesco, casamento ou união estável (art. 1.694 do Código Civil), posição que é compartilhada por este autor.
 Nessa esteira, concluiu o Tribunal da Cidadania que, “segundo a pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é ilegal a prisão civil decretada por descumprimento de obrigação alimentar em caso de pensão devida em razão de ato ilícito” (STJ, HC 182.228/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe 11.03.2011). Em reforço, entre os primeiros precedentes, colaciona-se: “a possibilidade de determinar-se a prisão, para forçar ao cumprimento de obrigação alimentar, restringe-se a fundada no direito de família. Não abrange a pensão devida em razão de ato ilícito” (STJ, REsp 93.948/SP, Rel. Min. EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 02.04.1998, DJ 01.06.1998, p. 79).
 O Novo CPC supostamente reacendeu o debate sobre a prisão civil em casos de não pagamento desses alimentos indenizatórios. Isso pelo fato de seu art. 533 estar inserido no mesmo capítulo que trata do cumprimento da sentença que reconhece a exigibilidade da obrigação alimentar, prevendo o art. 528 do próprio Estatuto Processual a possibilidade de prisão civil em caso de alimentos familiares.
Em verdade, o teor do art. 533 do CPC/2015 repete o que constava do art. 475-Q do CPC/1973, com algumas alterações. De acordo com o caput da nova lei, quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, caberá ao executado, a requerimento do exequente, constituir capital cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão. Além de previsão na lei anterior, a formação desse capital já era reconhecida pela Súmula 313 do STJ.
Nos termos do seu 1º, esse capital, representado por imóveis ou por direitos reais sobre imóveis suscetíveis de alienação, títulos da dívida pública ou aplicações financeiras em banco oficial, será inalienável e impenhorável enquanto durar a obrigação do executado. Ademais, constitui patrimônio de afetação, vinculado para o pagamento dos citados alimentos, o que constitui novidade frente ao sistema anterior.
Em complemento, está previsto que o juiz poderá substituir a constituição desse capital pela inclusão do exequente em folha de pagamento de pessoa jurídica de notória capacidade econômica ou, a requerimento do executado, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz (art. 533, § 2º, do CPC/2015, correspondente ao mesmo parágrafo do art. 475-Q do CPC/1973). Igualmente sem qualquer alteração, se sobrevier modificação nas condições econômicas, poderá a parte requerer, conforme as circunstâncias, redução ou aumento da prestação, o que para muitos representa ser a sentença sujeita à cláusula rebus sic stantibus (art. 533, § 3º, do CPC/2015 e art. 475-Q, § 3º, do CPC/1973).
 Também, sem qualquer mudança frente ao sistema processual anterior, está previsto que a prestação alimentícia poderá ser fixada tomando por base o salário-mínimo (art. 533, § 4º, do CPC/2015, equivalente ao art. 475-Q, § 4º, do CPC/1973). Por derradeiro, finda a obrigação de prestar alimentos, o juiz mandará liberar o capital, cessar o desconto em folha ou cancelar as garantias prestadas (art. 533, § 5º, do CPC/2015 e art. 475-Q, § 5º, do CPC/1973).
Essas são as regras e sanções previstas para os alimentos indenizatórios, decorrentes do ato ilícito, sem qualquer menção à prisão civil. Sendo assim, não cabe ao julgador fazer interpretações extensivas para cercear a liberdade da pessoa humana, ainda mais em uma realidade em que defende um Direito Civil Constitucionalizado e Humanizado. Reitere-se a posição anterior, consolidada no sentido de que prisão civil somente é possível nas situações de inadimplemento da obrigação relativa aos alimentos familiares. Esperamos que essa conclusão continue sendo o posicionamento da nossa jurisprudência superior.
PRISÃO CIVIL EM ALIMENTOS INDENIZATÓRIOS: POSIÇÃO FAVORÁVEL
Fernanda Tartuce. Doutora em Direito Processual Civil pela USP. Professora da FADISP e da EPD. Advogada.
A questão em análise pode ser apresentada de forma singela: a proteção máxima conferida aos alimentos (com possível execução sob pena de prisão) é pertinente apenas ante a inadimplência de alimentos baseados em vínculos familiares ou incide também sobre a falta de pagamento de pensões decorrentes de ato ilícito fixadas em demandas indenizatórias?
Embora perguntas simples possam inspirar respostas do mesmo tipo, é interessante lembrar que nem sempre todos os pontos relevantes do questionamento são considerados em abordagens singelas. Uma forma que pode contribuir para uma análise mais elaborada é contextualizar a dúvida à luz de certo caso; tal perspectiva é valiosa por concretizar a hipótese e permitir uma apreciação humanizada da situação. Considere que Jodeilde, aos 8 anos de idade, restou órfã após seus pais falecerem no acidente de veículos causado por Lupércio; este foi posteriormente condenado, em demanda indenizatória, a pagar alimentos de dois salários mínimos mensais à criança com base no art. 948, II do Código Civil (“no caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima”). Não tendo havido o voluntário pagamento do valor devido a Jodeílde a título de obrigação alimentar, cabe executar Lupércio sob pena de prisão?
A Constituição Federal prevê, no art. 5º LXVII, que não haverá prisão civil por dívida - salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia.
A regra se justifica porque o instituto dos alimentos tem por base valores importantes: dignidade, urgência e solidariedade humana são vetores interpretativos primordiais para o adequado delineamento de respostas a eventuais dúvidas surgidas na aplicação das normas sobre o tema.
 A dignidade é contemplada porque, sem condições de contar com um patrimônio mínimo que assegure o acesso a bens essenciais, não há como exercer de modo eficiente o direito à autodeterminação. A urgência é evidente, já que o pagamento da pensão alimentícia serve para suprir as necessidades cotidianas da pessoa dependente. A solidariedade humana, enquanto amparo e dever assistencial, é uma exigência do sistema jurídico porque, infelizmente, nem sempre há espontaneidade no devotamento de cuidado aos necessitados. Se o ordenamento jurídico reforça a solidariedade em relação a parentes (em relação a quem, por haver vínculo, existe maior chance de prestação de auxilio mutuo), obviamente deve haver ainda maior estímulo quando não há proximidade que anime o devedor a auxiliar o credor da obrigação alimentar.
 À luz de tais considerações, pergunta-se: Jodeílde precisa que a norma constitucional incida em seu favor? Para atender à sua dignidade com urgência, considerando que é remota a chance de Lupércio mostrar solidariedade em relação a uma órfã com quem não tem liame parental, a resposta é evidentemente positiva.
 Quando a Constituição Federal menciona a possibilidade de prisão em virtude do inadimplemento voluntário e inescusável da obrigação alimentar, não faz distinção quanto à fonte; revela-se essencial, portanto, considerar o conteúdo (obrigação alimentar inadimplida voluntária e sem escusas) e não a origem (relação familiar ou ato ilícito).
 No plano infraconstitucional, os dispositivos que preveem prisão por inadimplemento de pensões alimentícias não apresentam restrições à incidência do encarceramento; não há expressa diferenciação em relação aos casos ligados à seara familiar.
 O Código de Processo Civil não tem tradição de limitar a incidência da prisão à execução de alimentos referentes a contextos familiares. Confirmando tal tendência, o Novo Código de Processo Civil refere-se hipóteses ligadas a pensão alimentícia como sendo referentes à exigibilidade da obrigação de prestar alimentos; a expressão, que é ampla, não expressa qualquer distinção em relação à fonte da obrigação.
 O Novo Código traz ainda mais um ponto em favor da posição aqui defendida: o art. 533, ao mencionar a possibilidade de constituição de capital em demandas reparatórias que preveem alimentos indenizatórios, foi inserido no capítulo regente da execução de prestações alimentares em geral; percebe-se, portanto, que o legislador, longe diferenciar pensões alimentícias, atuou no sentido de aproximar seus regimes executivos.
 Vale também destacar que o Novo Código buscou incrementar ainda mais a efetividade da execução alimentícia ao prever o protesto do nome do executado e afirmar que a justificativa do executado precisa expor a comprovação de fato gerador da impossibilidade absoluta de pagar a pensão devida (Lei 13.105/2015, art. 528 §§ 1º e 2º).
 Não há no ordenamento, portanto, norma que justifique a diferenciação apta a excluir a possibilidade de prisão no inadimplemento de obrigações alimentares fixadas a título de reparação por ato ilícito; interpretação diversa prejudica indevidamente as vítimas de atos ilícitos ao retirar a eficácia potencializada pela coerção inerente à execução sob pena de prisão.
A execução de alimentos engendrada no sistema jurídico brasileiro, como autêntica tutela diferenciada, visa propiciar maior efetividade à proteção de um direito considerado especial pelo ordenamento.
 Apesar disso, há quem responda negativamente à pergunta, afirmando haver restrições à incidência da prisão. Há diversas decisões nesse sentido; muitas delas, porém, não enfrentam os argumentos expostos, limitando-se a afirmar, sem maiores digressões, que a possibilidade de requerer a execução sob pena de prisão deve ser considerada em perspectiva restritiva, sendo pertinente apenas em casos de inadimplemento verificados em contextos familiares. É possível crer, porém, em mudança no cenário jurisprudencial: cada vez mais há entendimentos prestigiando a concretização de compreensões que conduzam a um “processo civil de resultados”.
 O posicionamento pela impossibilidade de execução sob pena de prisão no caso de alimentos decorrentes de ato ilícito distancia o intérprete da missão protetora do processo; a tutela jurisdicional precisa funcionar bem, incidindo seus ditames de modo eficiente em prol de quem vive a árdua situação de precisar exigir alimentos em juízo.
 Espera-se que a triste situação de vítimas como Jodeílde - que precisará recompor sua vida em um cenário marcado por significativas restrições - não seja piorada pela falta de efetividade da execução alimentícia que precisará promover em face do devedor que, de modo voluntário e inescusável, restar inadimplente.

maio 10, 2016

Sobrinho não tem obrigação de alimentos com a tia, decide a Terceira Turma do STJ

Sobrinho não tem obrigação de alimentos com a tia, decide a Terceira Turma do STJ

Um sobrinho não tem obrigação alimentar em relação à tia, vez que esse familiar é considerado parente de terceiro grau. A obrigação é imposta apenas a pais, filhos e seus ascendentes e descendentes, segundo decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar um caso que aconteceu no Estado de São Paulo.
O caso envolve um sobrinho que gastou R$ 13.453,88 com tratamento médico, remédios, internação, sepultamento e animais de sua falecida tia. Para reaver os recursos, entrou com uma ação de cobrança contra os tios (irmãos da falecida).
O juízo de primeiro grau, após determinar que todos os demais irmãos da falecida ingressassem no processo, julgou procedente o pedido, condenando os réus ao pagamento da quantia.
Herança
Na decisão, o magistrado considerou que a dívida não seria de alimentos e determinou a inclusão da ressalva do artigo 1.997 do Código Civil, que diz que a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido.
Inconformado, o autor apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que manteve a decisão que limitou a responsabilidade ao valor da herança. A decisão colegiada do tribunal observou que o sobrinho é parente de terceiro grau na linha colateral, e, por isso, nos termos do artigo 1.697 do Código Civil, “não possuía, em relação a ela, obrigação alimentar”.
A decisão do TJSP sublinhou ainda que, quando o autor pagou as despesas, “fê-lo em decorrência de obrigação moral e com intenção de fazer o bem, mas não assumiu a obrigação alimentar”.
Inconformado, o sobrinho recorreu ao STJ, cabendo a relatoria do caso ao ministro Villas Bôas Cueva. O parente alegou que as despesas com remédios, médicos, animais de estimação e sepultamento são de natureza alimentar, que a obrigação caberia aos irmãos da falecida e que, não havendo herança a partilhar, eles devem arcar com a dívida.
Ao confirmar a decisão do TJSP, o ministro salientou que, como determina o artigo 1.696 do Código Civil, "o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros".
O relator anotou que, na linha colateral, somente os irmãos estão obrigados a alimentar, conforme determina o artigo 1.697 do Código Civil: "Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais."
“Na hipótese, o autor é parente de terceiro grau na linha colateral, sobrinho da falecida, não lhe impondo, o Código Civil, a obrigação alimentar em relação a essa”, afirmou o ministro, ressaltando que despesas com médicos, remédios e animais não são dívida alimentar.
STJ

maio 10, 2016

Para STF, concessão de pensão por morte não exige reconhecimento judicial de união estável

Para STF, concessão de pensão por morte não exige reconhecimento judicial de união estável

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, nesta terça-feira (3), que é possível o reconhecimento de união estável de pessoa casada que esteja comprovadamente separada judicialmente ou de fato, para fins de concessão de pensão por morte, sem necessidade de decisão judicial neste sentido. A decisão se deu no Mandado de Segurança (MS) 33008, no qual a Turma restabeleceu a pensão, em concorrência com a viúva, à companheira de um servidor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) que, embora formalmente casado, vivia em união estável há mais de nove anos.
O relator do MS, ministro Luís Roberto Barroso, já havia concedido, em agosto de 2014, liminar suspendendo acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) que considerou ilegal a concessão do benefício devido à ausência de decisão judicial reconhecendo a união estável e a separação de fato. Na sessão desta terça-feira (3), o ministro apresentou voto quanto ao mérito da ação e reiterou os fundamentos apresentados naquela decisão. “O artigo 1.723 do Código Civil prevê que a união estável configura-se pela ‘convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família’”, assinalou. “Trata-se, portanto, de situação de fato que prescinde de reconhecimento judicial para produzir efeitos, tanto que eventual ação terá conteúdo meramente declaratório. Basta, assim, que seja comprovada, no caso concreto, a convivência qualificada”.
Barroso observou que, de acordo com o parágrafo 1º do mesmo dispositivo, não há impedimento ao reconhecimento da união estável se “a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente”. “A separação de fato, por definição, também é situação que não depende de reconhecimento judicial para a sua configuração, tanto que a lei utiliza tal expressão em oposição à separação judicial”, explicou. “Assim, nem mesmo a vigência formal do casamento justifica a exigência feita pelo TCU, pois a própria legislação de regência autoriza o reconhecimento da união estável quando o companheiro está separado de fato do cônjuge”.
O caso
Depois da morte do servidor, em 2002, houve um processo administrativo conduzido pela Unirio, no qual a companheira fez a prova tanto da separação de fato quanto da união estável. A decisão administrativa que determinou o pagamento da pensão a ela e à viúva não foi impugnada. Em 2014, porém, o TCU julgou ilegal a concessão de pensão em favor da companheira porque a união estável não foi reconhecida judicialmente.
Ao conceder a ordem, o ministro Roberto Barroso destacou que, se a prova produzida no processo administrativo é idônea, o que não é questionado, não há como não reconhecer a união estável, e o entendimento do TCU “equivale a tratar a companheira como concubina, apenas pela ausência da separação judicial”. Segundo ele, embora uma decisão judicial pudesse conferir maior segurança jurídica, “não se deve obrigar alguém a ir ao Judiciário desnecessariamente”, sem amparo legal. “O companheiro já enfrenta uma série de obstáculos inerentes à informalidade de sua situação, pois deve produzir prova da união estável a cada vez e perante todas as pessoas e instâncias em face das quais pretenda usufruir dos direitos legalmente previstos”, afirmou.
O relator esclareceu ainda que a situação é diferente daquela tratada no Recurso Extraordinário (RE) 397762, no qual a Primeira Turma, em 2008, negou a uma concubina o direito ao rateio à pensão. No caso, tratava-se de uma relação paralela ao casamento.
A decisão foi unânime.
STF

maio 10, 2016

Perguntas e respostas sobre o Estatuto da Pessoa com Deficiência, por Regina Beatriz Tavares da Silva

Perguntas e respostas sobre o Estatuto da Pessoa com Deficiência

Regina Beatriz Tavares da Silva


1. O que é o Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD?
R. O Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD, também chamado Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, foi instituído pela Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015, com vacatio legis de 180 dias e entrada em vigor em 3 de janeiro de 2016, e traz inúmeras modificações no que se refere à proteção das pessoas com deficiências mentais, intelectuais e sensoriais.
2. O que é pessoa com deficiência para o Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD?
R. O EPD considera pessoa com deficiência “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (art. 2º) e completa que a avaliação da deficiência será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará: I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; III - a limitação no desempenho de atividades; e IV - a restrição de participação (art. 2º, § 1º).
3. O portador de síndrome de down é pessoa que se enquadra no Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD?
R. A Síndrome de Down (SD) é a síndrome genética de maior incidência e tem como principal consequência a deficiência mental. Desse modo, o portador de síndrome de down se enquadra no Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD.
Conforme estudos científicos, não existem graus de síndrome de down, no entanto há diferenças de desenvolvimento que decorrem das características individuais referentes à herança genética, à estimulação, à educação, ao meio ambiente, aos problemas clínicos, entre outros.
4. A pessoa com deficiência, inclusive o portador de síndrome de down, pode expressar a sua vontade e praticar atos da vida civil?
R. Na interpretação sistemática do Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD, o deficiente tem assegurado o direito de participar dos atos da vida civil, expressando a sua vontade, dentro do princípio da razoabilidade, de modo a assegurar-lhe a proteção necessária. Nos termos do Decreto Legislativo n. 186/2008, que promulgou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, deve ser realizada a chamada “adaptação razoável”, o que significa realizar “as modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais”. O art. 121 do EPD reconhece a necessidade de razoabilidade interpretativa em benefício do deficiente, ao dispor que “Prevalecerá a norma mais benéfica à pessoa com deficiência” sobre os direitos, os prazos e as obrigações ali previstos, que não excluem os já estabelecidos em outras legislações, inclusive em pactos, tratados, convenções e declarações internacionais aprovados e promulgados pelo Congresso Nacional.
Portanto, a autonomia na prática de atos da vida civil pelo deficiente dependerá do grau dessa deficiência, a ser avaliada por equipe multiprofissional e interdisciplinar (art. 2º, § 1º), com a tutela jurisdicional, na definição da medida protetiva cabível, de curatela (art. 84, § 1º) ou de “tomada de decisão apoiada” (art. 84, § 2º).
Reitere-se que embora cientificamente não existam graus de síndrome de down, há diferenças de desenvolvimento que decorrem das características individuais referentes à herança genética, à estimulação, à educação, ao meio ambiente, aos problemas clínicos, entre outros.
5. O que diz o Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD sobre a capacidade da pessoa com deficiência, inclusive o portador de síndrome de down, e os atos da vida civil que pode praticar?
R. Segundo o Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD, a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para casar-se e constituir união estável, exercer direitos sexuais e reprodutivos, exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar, conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória, exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária e exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (art. 6º).
No entanto, a prática desses atos dependerá do grau da deficiência, avaliando-se se o deficiente pode praticar o ato com autonomia ou se necessitará de assistência, conforme a seguir será exposto.
6. O Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD manteve a interdição?
R. O processo de interdição está mantido no EPD, embora tenha substituído, conforme art. 114, em alguns artigos do Código Civil a expressão “interdição” por “processo que define os termos da curatela” (Cód. Civil, art. 1.768 e 1.769).
7. O Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD manteve a curatela?
R. O EPD manteve a curatela, mas atribuiu-lhe natureza de “medida protetiva extraordinária”, que deverá durar “o menor tempo possível” (art. 84, § 3º). Essa restrição na aplicação da curatela deve-se às premissas do EPD, que asseguram ao deficiente a igualdade de direitos e deveres em relação aos não deficientes.
Portanto, ao que tudo indica, o portador de síndrome de down, desde que tenha recebido a educação necessária, não ficará submetido à curatela.
8. O que é curatela compartilhada?
R. O EPD também inova ao possibilitar a curatela compartilhada, podendo ser nomeados dois ou mais curadores para uma única pessoa. Inobstante existam contradições nesse Estatuto, essa curatela compartilhada deve ser entendida como a atribuição a um dos curadores de poderes de natureza patrimonial e negocial e a outro curador de poderes de natureza pessoal. Por outras palavras, diante dos atributos de cada um, os cuidados em relação ao patrimônio do deficiente poderão ser atribuídos a um curador e os cuidados em relação à pessoa do deficiente poderão ser praticados por outro curador.
9. O que é tomada de decisão apoiada?
R. A tomada de decisão apoiada é um novo instituto introduzido pelo EPD, segundo o qual “A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade.” (EPD, art. 116).
Esse processo, portanto, é cabível quando não houver a interdição do deficiente e a nomeação de curador, do que se conclui ser aplicável em casos de menor deficiência, para a prática de determinado/s ato/s da vida civil, como o caso do portador de síndrome de down que recebeu a educação necessária.
O portador de síndrome de down, embora esteja em condições de manifestar sua vontade, pode necessitar do apoio de pessoas de sua confiança, que lhe prestarão os elementos e as informações que sejam indispensáveis ao exercício de sua capacidade.
10. Como se realiza o procedimento de tomada de decisão apoiada?
Trata-se de procedimento judicial, assistido por equipe multidisciplinar, que exige a oitiva do Ministério Público, a ser requerido pela pessoa do deficiente, com indicação dos apoiadores.
Na formulação do pedido de tomada de decisão apoiada, o deficiente e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os respectivos limites e compromissos, além do prazo de vigência desse apoio.
O juiz deve ouvir pessoalmente o deficiente e as pessoas que lhe prestaram apoio.
Os limites do apoio devem ser rigorosamente seguidos para que a decisão tenha validade e efeitos perante terceiros, que podem solicitar a assinatura dos apoiadores no contrato.
Segundo o EPD, “Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante, havendo divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a questão.”. Este dispositivo merece “adaptação razoável”, já que, obviamente, há de se evitar prejuízo, independentemente de ser maior ou menor ao deficiente, assim como a divergência de opiniões entre os apoiadores, ou entre a pessoa apoiada e os apoiadores, deve impedir a prática do ato negocial, devendo em qualquer hipótese, ser ouvido o Ministério Público e o juiz decidir sobre a questão.
O apoiador que não cumprir suas obrigações poderá ser denunciado por qualquer pessoa, para que seja substituído por outro. Também, o apoiador pode solicitar ao juiz a sua exclusão de participação, que ficará condicionada a decisão judicial.
11. A pessoa com deficiência, inclusive o portador de síndrome de down, pode casar?
R. Conforme antes exposto, o EPD trouxe uma nova concepção sobre os direitos do deficiente mental, que passou a ter capacidade para celebrar casamento, de acordo com seu artigo 6º, inciso I, e art. 1.550, parágrafo 2º, expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável (caso menor de dezoito anos, por meio de seus pais), ou dos apoiadores no processo de decisão apoiada (caso maior de dezoito anos e não tenha sido interditado), ou do curador (caso maior de dezoito anos e tenha sido interditado).
O portador de síndrome de down, a depender da herança genética, da estimulação, da educação, do meio ambiente, dos problemas clínicos, entre outros, pode casar, segundo o EPD. A sua manifestação de vontade dependerá do seu desenvolvimento.
12. Quando o casamento contraído por pessoa com deficiência é inexistente, quando é anulável e quando é válido?
R. Já que a decisão de casar é ato de vontade, se a vontade não puder ser manifestada em razão da gravidade da deficiência que importa em ausência de consentimento, o casamento será inexistente. Por outro lado, se a vontade for manifestada pelo deficiente, ou seja, se houver consentimento, mas este for turbado, havendo necessidade de assistência, ou seja, da presença do responsável (se for menor, dos pais ou do tutor), ou dos apoiadores (processo de tomada de decisão apoiada), ou do curador, o casamento será anulável (Cód. Civil, art. 1.550, § 2º, diante da modificação realizada pelo EPD). E se o deficiente puder expressar diretamente a sua vontade, porque tem capacidade para tanto, o casamento será válido (EPD, art. 6º, I).

Veja mais em MONTEIRO, Washington de Barros e TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Curso de direito civil: direito de família. 43ª ed. no prelo. São Paulo: Saraiva, 2016, v. 2.
-