setembro 10, 2015

Reconhecimento e dissolução de União Estável em Juizado Especial? Isso pode?

Reconhecimento e dissolução de União Estável em Juizado Especial? Isso pode?



Amigos, a prática da "advocacia de família" nos oferece, sempre,  situações inusitadas.

Eis que fomos surpreendidos por uma citação para participar de audiência referente a Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável em - Juizado Especial Cível!!

No ano de 2006, nossa monografia na Especialização em Direito Processual já versava sobre a possibilidade de implantação dos "Juizados Especiais de Família", matéria pioneira no país naquele então.

Quase dez anos depois, embora alardeada muitas vezes, a implantação dos Juizados Especiais de Família nunca se tornou uma realidade nacional.

Como se sabe, a Lei dos Juizados Especiais veda, expressamente, no seu artigo 3ª, a utilização do rito sumaríssimo dos juizados para Ações de Estado, como é o caso do Reconhecimento e Dissolução de União Estável. Ainda, a mesma proibição está expressa no próprio CPC quando trata das vedações para utilização do rito sumário, também refenciadas na Lei dos Juizados Especiais.

O Estado de Pernambuco notabilizou-se pela implantação, com  sucesso, de uma espécie de "modelo" do que viriam a ser os Juizados Especiais de Família. Texto bastante conhecido da lavra da Ministra do STJ, Fátima Nancy Andrigui, louva a iniciativa do TJ Pernambucano, e chega até a rascunhar um projeto de lei para viabilizar a utilização dos Juizados Especiais para dirimir questões de família. (Leia o texto aqui: www.agu.gov.br/page/download/index/id/886218).


 Cumpre lembrar que, no modelo de Pernambuco, trata-se de um "Juizado Informal de Família", que precede as audiências de conciliação nos casos de demandas litigiosas acerca de temas familiares. 

Parte dessa iniciativa, registre-se, foi acolhida na dinâmica procedimental do novo CPC, que determina a realização de audiência conciliatória prévia no processos de Direito de Família, antes mesmo da citação da parte contrária, segundo rito especial criado pela nova lei.

O PL 230/2010 tem por objetivo implantar os Juizados Especiais de Família em todo o país, formalmente, através da estrutura e da lógica dos demais juizados especiais. Fala-se que existe um "lobby" de advogados que impediria essa conquista. Mas não é só isso. O rito sumaríssimo da Lei dos Juizados Especiais não tolera medidas acautelatórias de urgência, por exemplo, tão necessárias nas questões de Direito de Família. E o debate vai longe...

De todo modo, é importante lembrar que os acordos extrajudiciais de "qualquer natureza" podem ser homologados nos Juizados Especiais Cíveis. Isso inclui, por óbvio, acordos extrajudiciais de família. Essa informação é importante e pouco conhecida pela maioria dos advogados. (Pode-se aprofundar no tema aqui: http://www.conjur.com.br/2013-jul-22/andre-melo-juizados-especiais-podem-homologar-acordos-area-familia)

Enfim, é preciso dizer que o processamento de uma Ação de Reconhecimento e Dissolução de União Estável no âmbito do Juizado Especial Cível, tomando por base a justificativa do valor do bem a ser partilhado pelo casal estar compreendido no teto dos 40 salários mínimos da Lei nº. 9.099/1995 é repisar a gravíssima questão da formação inconsistente dos aplicadores no Brasil. 

Não sei afirmar se o "pior" foi a petição do causídico, ou o despacho do magistrado determinando a audiência!

Significa, assim, mais uma vez, que algo não vai bem nas nossas Faculdades de Direito.




setembro 10, 2015

STJ: Solteiro homoafetivo garante direito de adotar criança menor de 12 anos

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) garantiu a um homem solteiro homoafetivo o direito de se habilitar para adoção de criança entre três e cinco anos de idade, conforme ele solicitou.
O colegiado negou recurso do Ministério Público (MP) do Paraná contra a habilitação permitida pela Justiça do estado. Para o MP, a adoção só deveria ser admitida a partir dos 12 anos, idade em que o menor seria capaz de decidir se consente em ser adotado por pessoa homoafetiva. Em parecer, o Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso.
O relator do caso, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que o artigo 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente não proíbe a adoção de crianças por solteiros ou casais homoafetivos nem impõe qualquer restrição etária ao adotando nessas hipóteses.
O ministro observou que a Justiça paranaense reconheceu expressamente, com base na documentação do processo, que o interessado em adotar preenche todos os requisitos para figurar no registro de candidatos à adoção.
Família
O relator assinalou que a sociedade, não apenas do Brasil, vem alterando sua compreensão do conceito de família e reconhecendo a união entre pessoas do mesmo sexo como unidade familiar digna de proteção do estado.
“Nesse contexto de pluralismo familiar, e pautado nos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, não se vislumbra a possibilidade de haver nenhuma distinção de direitos ou exigências legais entre as parcelas da população brasileira homoafetiva (ou demais minorias) e heteroafetiva”, afirmou o ministro no voto.
Villas Bôas Cueva concluiu que o bom desempenho e o bem-estar da criança estão ligados ao aspecto afetivo e ao vínculo existente na unidade familiar, e não à orientação sexual do adotante.

Segue a íntegra do voto do Ministro Relator:
........................

RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se
de recurso especial interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, com
fundamento no artigo 105, III, "a", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - TJPR, que negou provimento ao recurso de
apelação.
Na origem, cuida-se de pedido de habilitação para adoção, formulado por R. G.
da S., a fim de ser-lhe deferida inscrição para adoção de criança entre 3 (três) e 5 (cinco) anos
de idade, do sexo masculino, de cor branca até morena clara, saudável, podendo ser filho de
portadores de HIV, alcoólatras ou usuários de entorpecentes (fl. 158, e-STJ).
Em primeira instância, o magistrado teceu algumas considerações a respeito da
adoção por pessoas homoafetivas e quanto aos princípios da igualdade, da não discriminação e
do melhor interesse da criança e julgou, ao final, procedente o "pedido de inscrição para
adoção formulado por R G da S, com fundamento no, artigo 50, §§ 1º e 2º, do Estatuto da
Criança e do Adolescente " (fl. 88, e-STJ - alterado por segredo de justiça).
Ao manter essa decisão, por maioria, o TJPR assim ementou seu julgado:
"APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO DE HABILITAÇÃO PARA ADOÇÃO.
PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE ADOÇÃO, POR PESSOA HOMOAFETIVA.
INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE DEFENDE A NECESSIDADE
DE O ADOTANDO TER IDADE SUPERIOR A DOZE ANOS PARA MANIFESTAR
SUA CONCORDÂNCIA. FALTA DE PREVISÃO LEGAL PARA IMPOSIÇÃO DE
LIMITES. VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DA IGUALDADE. ESTUDOS
DEMONSTRANDO A AUSÊNCIA DE PREJUíZOS AO DESENVOLVIMENTO DA
CRIANÇA, QUE ESTÁ RELACIONADO Á QUALIDADE DO VÍNCULO AFETIVO
EXISTENTE DENTRO DA UNIDADE FAMILIAR E NÃO A ORIENTAÇÃO
SEXUAL DOS ADOTANTES.
CONSTATAÇÃO DE QUE A ADOÇÃO DE CRIANÇAS POR PESSOA
HOMOAFETIVA DEVIDAMENTE CAPACITADA, COMO O APELADO, ATENDE
AOS PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE.
GARANTIA DO DIREITO A CONVIVÊNCIA FAMILIAR. DECISÃO MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO, POR MAIORIA" (fls. 157-158, e-STJ).
Os embargos declaratórios foram rejeitados (fl. 186, e-STJ).
No recurso especial, o Ministério Público do Estado do Paraná alega violação dos
arts. 535, II, do Código de Processo Civil - CPC; e 3º, 6º, 15, 16, 18 e 45, § 2º, do Estatuto da
Documento: 50200849 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 8
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Criança e do Adolescente - ECA. Sustenta, inicialmente, omissão no aresto de origem quanto
aos referidos dispositivos do ECA. No mérito, aduz, com base no princípio da proteção integral
da criança, a necessidade de o adotando ter no mínimo 12 (doze) anos, nas hipóteses de
adoção por pessoa de condição homoafetiva, pois nessa idade o menor pode manifestar sua
concordância.
O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso em parecer
ementado nos seguintes termos:
"DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE CRIANÇA POR HOMOSSEXUAL.
ALEGAÇÃO DE QUE ESSE TIPO DE ADOÇÃO FIQUE CONDICIONADA À
MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO ADOTANDO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE.
PARECER PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO" (fl. 235, e-STJ).
Foi determinada a conversão do agravo em recurso especial para melhor exame
da matéria (fls. 239-240, e-STJ).
É o relatório.

VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Cinge-se o
tema recursal à possibilidade de pessoa homoafetiva somente poder adotar maiores de 12
(doze) anos de idade, que já possam se manifestar a respeito da pretensa adoção.
1. Da adoção de crianças por pessoas homoafetivas
O Ministério Público estadual defende a necessidade de o menor adotando ter 12
(doze) anos de idade, no mínimo, para que possa se manifestar quanto à adoção que
intenciona realizar pessoa homoafetiva.
Não há previsão legal para o que se requer.
Com efeito, a Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA)
prevê, em seu artigo 50, que a autoridade judiciária deverá manter um registro de crianças e
adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção,
observando-se o seguinte:
"Art. 50. (...)
§ 1º O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia consulta
aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Ministério Público.
§ 2º Não será deferida a inscrição se o interessado não satisfazer
os requisitos legais, ou verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 29.
(...)
Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a
pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilidade com a natureza da
medida ou não ofereça ambiente familiar adequado."
Note-se que essa legislação não veda a adoção de crianças por solteiros ou
casais homoafetivos, tampouco impõe qualquer restrição etária ao adotante nessas hipóteses.
De fato, o Estatuto registra a possibilidade de o magistrado poder deferir a
inscrição no referido cadastro de pessoas interessadas na adoção de menores, desde que
preencham alguns requisitos legais, consoante bem registrou o Colegiado Estadual (fls.
160-161, e-STJ):
"(...) não há em nosso ordenamento jurídico, principalmente, no
Estatuto da Criança e do Adolescente, a imposição de quaisquer limitações em
relação à adoção por pessoa ou casal homoafetivo,concluindo-se, assim, que o
pretendente, homoafetivo ou não, deve preencher os requisitos estabelecidos no
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art. 50, §§ 1º e 2º do
Estatuto. (...)
A imposição de qualquer outro limite, ou restrição, como o
estabelecimento de critérios de idade para o adotando, sugerido pelo Ministério
Público, não encontra previsão legal e trata o adotante homoafetivo de maneira
desigual, devido a sua orientação sexual. Sob o ponto de vista do apelado, esse
tratamento desigual, ao contrário, fere o princípio constitucional dá igualdade, na
medida em que impõe restrições não previstas em lei."
Nesse caso, o Tribunal paranaense reconheceu expressamente, com base na
documentação juntada aos autos, que o recorrido
"(...) dispõe de condições psíquicas, sociais, econômicas,
jurídicas, físicas, habitacionais e, principalmente, motivação legítima em sua
pretensão de adotar, restando consignado no estudo de fls. 51 que: 'estará
assegurado à criança que for adotada pelo requerente, o direito à saúde, a
alimentação, a educação, ao lazer, a profissionalização, a cultura, a
dignidade, ao respeito e a liberdade, pois entendemos serem estes os
deveres inerentes ao poder familiar' " (fl. 161, e-STJ) .
Não se vislumbra, portanto, nenhum impedimento legal para que o recorrido
figure no registro de pessoas interessadas na adoção de crianças e adolescentes, inclusive,
sem qualquer restrição etária.
A respeito do tema da homoafetividade, vale lembrar que a sociedade, e não
apenas no Brasil, vem alterando sua compreensão do conceito de família, como nos casos de
reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como uma unidade familiar, digna de
proteção do Estado.
Com efeito, no Recurso Especial nº 1.183.378/RS, de relatoria do Ministro Luis
Felipe Salomão (DJe 1º/2/2012), trouxe-se à discussão o novo conceito de família, que sob o
enfoque da Constituição de 1988, passou a ser "vista por um nova óptica, um 'novo olhar, um
olhar claramente humanizado ' ":
"(...) Inaugura-se em 1988 uma nova fase do direito de família
e, consequentemente, do casamento, baseada na adoção de um explícito
poliformismo familiar em que arranjos multifacetados são igualmente
aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado "família", recebendo todos
eles a 'especial proteção do Estado'.
Estabeleceu a Carta Cidadã, no caput do art. 226: 'A família,
base da sociedade, tem especial proteção do Estado', sem ressalvas, sem
reservas, sem 'poréns', quanto à forma de constituição dessa família.
Ou seja, o comando principal do artigo é a 'proteção especial', em
si, independentemente da forma pela qual a família é constituída, porquanto por
trás dessa 'proteção especial' reside a dignidade da pessoa humana, alçada, no
texto constituinte, a fundamento da República (art. 1º, inciso III).
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Por isso que, em seus parágrafos, o art. 226 da Constituição
expõe, exemplificadamente , esses novos arranjos familiares, todos dignos
da especial proteção do Estado.
(...)
Atentando-se a isso, o pluralismo familiar engendrado pela
Constituição - explicitamente reconhecido em precedentes tanto desta Corte
quanto do STF -, impede se pretenda afirmar que as famílias formadas por pares
homoafetivos sejam menos dignas de proteção do Estado, se comparadas com
aquelas apoiadas na tradição e formadas por casais heteroafetivos.
Na medida em que a própria Constituição Federal abandona a
fórmula vinculativa da família ao casamento, e passa a reconhecer,
exemplificadamente, vários tipos interpessoais aptos à constituição de
família, emerge como corolário que, em alguma medida, torna-se secundário
o interesse da Carta Cidadã pelo modo a partir do qual essas famílias são
constituídas em seu íntimo, em sua inviolável vida privada, se são
constituídas por pessoas heteroafetivas ou homoafetivas ".
Assim, nesse contexto de pluralismo familiar, e pautado nos princípios da
igualdade e da dignidade da pessoa humana, não se vislumbra a possibilidade de haver
nenhuma distinção de direitos ou exigências legais entre as parcelas da população brasileira
homoafetiva (ou demais minorias) e heteroafetiva.
Mesmo se analisarmos sob o enfoque do menor, não há, a princípio, restrição de
qualquer tipo à adoção de crianças por pessoas homoafetivas.
Isso porque, segundo a legislação vigente, caberá ao prudente arbítrio do
magistrado, sempre sob a ótica do melhor interesse do menor, observar todas as circunstâncias
presentes no caso concreto e as perícias e laudos produzidos no decorrer do processo de
adoção.
Na verdade, o bom desempenho e bem-estar da criança estão ligados ao aspecto
afetivo e ao vínculo existente na unidade familiar, e não à opção sexual do adotante. Esta Corte,
inclusive, já se manifestou sobre o tema:
"(...)Estudos feitos no âmbito da Psicologia afirmam que
pesquisas '(...)têm demonstrado que os filhos de pais ou mães homossexuais
não apresentam comprometimento e problemas em seu desenvolvimento
psicossocial quando comparados com filhos de pais e mães heterossexuais.
O ambiente familiar sustentado pelas famílias homo e heterossexuais para o
bom desenvolvimento psicossocial das crianças parece ser o mesmo'.
(FARIAS, Mariana de Oliveira e MAIA, Ana Cláudia Bortolozzi in: Adoção por
homossexuais: a família homoparental sob o olhar da Psicologia jurídica.
Curitiba: Juruá, 2009, pp.75/76)." (REsp nº 1.281.093/SP, Relatora
Ministra Nancy Andrighi, DJe 4/2/2013).
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Em igual sentido, o Ministro Luiz Felipe Salomão (REsp nº 889.852/RS, DJe
10/8/2010) noticiou que
"(...) os diversos e respeitados estudos especializados sobre o
tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de
Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria),
'não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais
homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o
meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores'".
Assim, por qualquer ângulo que se aprecie a questão, não se entrevê prejuízo às
partes interessadas na possível adoção de menor por pessoa homoafetiva.
2. Do conhecimento do recurso especial
O recurso não tem como ser acolhido.
Inicialmente, quanto à apontada afronta ao art. 535, II, do CPC, nota-se que o
recorrente traz somente alegação genérica de negativa de prestação jurisdicional, não
especificando qual a omissão do julgado impugnado e a importância dessa questão no desate
da controvérsia.
Assim, estando deficiente a fundamentação recursal, não há como conhecer da
insurgência no tocante a esse dispositivo legal, com base na Súmula nº 284/STF, aplicada por
analogia.
Nesse sentido:
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL E
PROCESSUAL CIVIL. VÍCIO REDIBITÓRIO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÃO GENÉRICA. INCIDÊNCIA DA
SÚMULA Nº 284/STF. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA NATUREZA OCULTA
DO VÍCIO. INVIABILIDADE. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. O recurso especial que indica violação do artigo 535 do Código de Processo
Civil, mas traz somente alegação genérica de negativa de prestação
jurisdicional, é deficiente em sua fundamentação, o que atrai o óbice da
Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal.
(...)
3. Agravo regimental não provido."
(AgRg no AREsp 511.129/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS
CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/03/2015, DJe 12/03/2015)
Também é forçoso reconhecer que o conteúdo normativo dos demais artigos
tidos como violados (arts. 3º, 6º, 15, 16, 18 e 45, § 2º, do ECA) não foi prequestionado pelo
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Tribunal de origem, mesmo depois de opostos os embargos declaratórios, de modo que incide
na espécie a Súmula nº 211/STJ: “Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a
despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo".
Vale anotar que a jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de ser
"possível entender, simultaneamente, pela não-ocorrência de violação ao art. 535
do Código de Processo Civil e pela ausência de prequestionamento, bastando,
para tanto, que o acórdão embargado tenha encontrado fundamentos jurídicos
compatíveis e suficientes para a resolução da controvérsia submetida a exame,
apresentando provimento judicial claro, sem que tais fundamentos sejam
necessariamente os mesmos que as partes tenham levantado durante o processo
ou os mesmos que as partes pretendem ver abordados por esta Corte Superior"
(REsp 1.117.823/PR, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 8/2/2011).
A propósito ainda:
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC.
NÃO OCORRÊNCIA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ.
EXECUÇÃO FISCAL. DÍVIDA ATIVA NÃO TRIBUTÁRIA. INSCRIÇÃO EM
DÍVIDA ATIVA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PAGO INDEVIDAMENTE.
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ORIENTAÇÃO FIRMADA SOB O RITO DO
ART. 543-C DO CPC. RESP. 1.350.804/PR. REL. MIN. MAURO CAMPBELL
MARQUES. DJe 28.6.2013. SÚMULA 83/STJ.
1. Inicialmente, constata-se que não se configura a ofensa ao art. 535 do Código
de Processo Civil, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e
solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada. Não é o órgão julgador
obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em
defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda,
observando as questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução.
2. No que aponta como violados os artigos 876 do Código Civil; 126, 127, 535 do
Código de Processo Civil; 53, 54 da Lei 9.784/1999 e 3º da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro, a despeito da oposição de Embargos de
Declaração, não foram apreciados pela Corte de origem, carecendo o Recurso
Especial do requisito do prequestionamento, nos termos da Súmula 211 do STJ.
3. Saliento que, conforme vem reiteradamente decidindo o STJ, não há contradição
em reconhecer a falta de prequestionamento e afastar a alegação de violação do
artigo 535 do CPC na hipótese em que o tribunal a quo, a despeito da oposição de
Embargos de Declaração, não analisou, ainda que implicitamente, os artigos tidos
pelo recorrente como violados. Isso porque é perfeitamente possível que o julgado
recorrido se encontre devidamente fundamentado, sem, no entanto,
ter decidido a causa à luz dos dispositivos legais suscitados pelo recorrente,
pois a tal não está obrigado. Precedente do STJ.
(...)
5. Recurso Especial não provido."
(REsp 1.527.990/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 21/5/2015, DJe 30/6/2015 - grifou-se)
3. Da conclusão
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Diante do exposto, nego provimento ao recurso especial.
É o voto.
Documento:

setembro 08, 2015

Ação demolitória é de natureza real e exige citação do cônjuge, define Segunda Turma

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) e decidiu que nas ações demolitórias, por terem natureza real, exige-se a formação de litisconsórcio passivo necessário entre cônjuges. O colegiado entendeu que esse tipo de ação equivale à ação de nunciação de obra nova.
O artigo 95 do Código de Processo Civil (CPC) estabelece que a ação de nunciação se insere entre as fundadas em direito real imobiliário, nas quais – conforme o artigo 10, parágrafo 1°, inciso I – os cônjuges devem ser necessariamente citados. “A mesma conclusão deve alcançar a ação demolitória”, afirmou o relator da matéria, ministro Herman Benjamin.
As duas ações, respaldadas pelo artigo 1.280 do Código Civil e pelo artigo 934 do CPC, pleiteiam a demolição de construção ilegal ou com vício irrecuperável, como prédio vizinho em ruína ou cuja permanência traga prejuízo a propriedades próximas.
O relator lembrou que a diferença entre ambas as ações se dá em razão do estado em que se encontra a obra. Assim, a nunciação é cabível até o término da construção. A partir de concluída, ainda que faltem trabalhos secundários, cabe a ação demolitória.
Citação indispensável
No recurso julgado, o réu questionava demolição de imóvel demandada pelo município de Florianópolis. Segundo ele, não foi respeitado o litisconsórcio passivo necessário.
O TJSC havia dado decisão favorável ao município, pois entendeu que ações demolitórias teriam natureza pessoal. Desse modo, a citação do cônjuge seria dispensável, uma vez que tais ações não afetariam diretamente o direito de propriedade das partes.
Ao analisar o caso, o ministro Herman Benjamin citou precedente da Quarta Turma do STJ (REsp 147.769) em que se entendeu que a falta de citação de condômino litisconsorte necessário leva à nulidade do processo no qual se pleiteia a demolição de bem.

setembro 01, 2015

STJ - Recusa de herdeiros ao exame de DNA também gera presunção de paternidade

A recusa imotivada da parte investigada – mesmo que sejam os herdeiros do suposto pai – a se submeter ao exame de DNA gera presunção relativa de paternidade, como determina a Súmula 301 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Com base nesse entendimento, a Terceira Turma rejeitou recurso de herdeiros contra decisão que reconheceu um cidadão como filho legítimo do pai deles.
Segundo o relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, a súmula “é a aplicação direta da vedação do venire contra factum proprium, porque obstaculizar a realização do exame de DNA possui o evidente intento de frustrar o reconhecimento da paternidade”. No caso, o tribunal de segunda instância reconheceu a paternidade com base em testemunhos e provas documentais, chegando a afirmar que ela "era de conhecimento de todos".
Entre outros pontos, os herdeiros contestaram a aplicação da presunção contra eles ao argumento de que só seria válida em caso de recusa pessoal do suposto pai. No entanto, conforme explicou o ministro, na ação de paternidade posterior à morte, a legitimidade passiva recai sobre os herdeiros ou sucessores do falecido, “que, por isso mesmo, sujeitam-se ao ônus de se defender das alegações aduzidas pelo autor”.
Exumação
Ainda de acordo com o relator, se as provas do processo forem consideradas suficientes para se presumir a paternidade, não é necessária a exumação de cadáver para fazer exame de DNA. Ele disse que o STJ já firmou tese no sentido de que “a exumação de cadáver, em ação de investigação de paternidade, para realização de exame de DNA, é faculdade conferida ao magistrado pelo artigo 130 do Código de Processo Civil”.
Villas Bôas Cueva ressaltou que o tribunal estadual nem cogitou da necessidade de exumação, pois o contexto fático-probatório dos autos foi considerado suficiente para o julgamento da causa.
“A prova testemunhal e o comportamento processual dos herdeiros do réu conduziram à certeza da paternidade. Assim, o reconhecimento da paternidade reafirmada pelo tribunal de origem, fundamentada no conjunto fático-probatório apresentado e produzido durante a instrução, não pode ser desconstituída em sede de recurso especial, porque vedado o reexame de matéria de prova produzida no processo”, afirmou o relator.
Direito indisponível
No recurso, os herdeiros também contestaram a conclusão do tribunal estadual a respeito de um acordo feito no passado para encerrar outra ação de investigação de paternidade, ocasião em que o autor, suposto filho, recebeu expressiva quantia em dinheiro para desistir do processo.
Para a corte local, a existência daquele acordo corrobora as outras provas, pois a viúva e os herdeiros não teriam firmado o pacto se não tivessem pleno conhecimento de que o autor da ação era mesmo filho biológico do falecido.
Os herdeiros sustentaram que nenhuma outra conclusão poderia ser tirada do acordo a não ser o fato de que o autor “manteve seu estado de filiação” e deu quitação de eventuais direitos hereditários.
Sobre isso, Villas Bôas Cueva comentou que o acordo não afasta a possibilidade de reconhecimento da paternidade, visto que se trata de direito indisponível, imprescritível e irrenunciável, ou seja, ninguém é obrigado a abdicar de seu próprio estado, que pode ser reconhecido a qualquer tempo.
A decisão da turma foi unânime.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.